Teologia da Evangelização (122)

  4.3.1. As insondáveis riquezas de Cristo[1] 

 “A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graça de pregar aos gentios o evangelho das insondáveis riquezas de Cristo” (Ef 3.8).

          O propósito não revelado de Deus e, da mesma forma, a sua vontade revelada no Evangelho, são por demais majestosos para poder ser plenamente compreendido e “rastreado” por nós em toda a sua complexidade. O contraste deste conhecimento em relação ao nosso é intensamente perceptível.

          Paulo extasiado com isso, em forma de doxologia, resume: “Ó profundidade da riqueza (plou=toj), tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis (a)necixni/astoj), os seus caminhos!” (Rm 11.33).

          O Evangelho revela esta sabedoria que, por não ser compreendida pelo homem natural em sua maneira limitada, finita e deturpada de pensar, soa como loucura (1Co 1.18-25). Mas para nós, que pela graça conhecemos, ainda que parcialmente, o Evangelho é o anúncio da sabedoria de Deus em sua riqueza insondável. A insondabilidade do Evangelho não está em sua obscuridade, antes, em sua magnitude inconcebível a toda e qualquer criatura.

4.3.1.1. A Riqueza da Encarnação

Na carta aos Efésios Paulo se considera um agraciado em poder anunciar o Evangelho aos gentios, levando a Boa Nova de salvação a qual tem em seu conteúdo essencial a incompreensível, inexaurível e inenarrável riqueza de Cristo.[2] Diz então, de forma reverente e entusiasta: “A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graça de pregar aos gentios o evangelho das insondáveis (a)necixni/astoj)[3] riquezas (plou=toj) de Cristo” (Ef 3.8).

          Não podemos pensar nesta insondável riqueza sem termos nossos olhos voltados para a encarnação do Verbo; a perfeição única e inexplicável de Jesus Cristo, o Filho eterno de Deus que se encarnou para morrer pelo seu povo, nos restaurando à comunhão com Deus.

          Paulo fala de Cristo como o rico e glorioso mistério que agora foi revelado aos gentios pelo Evangelho: “O mistério que estivera oculto dos séculos e das gerações; agora, todavia, se manifestou aos seus santos; aos quais Deus quis dar a conhecer qual seja a riqueza (plou=toj) da glória deste mistério entre os gentios, isto é, Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl 1.26-27).

          Em outro lugar diz de forma sublime: “Evidentemente, grande é o mistério da piedade (eu)se/beia):[4] Aquele que foi manifestado na carne foi justificado em espírito, contemplado por anjos, pregado entre os gentios, crido no mundo, recebido na glória” (1Tm 3.16).

          A nossa relação correta com Deus e com o nosso próximo (este é o sentido bíblico da palavra piedade) começa pela compreensão correta da grandeza do mistério da encarnação.

          Calvino (1509-1564) comentando esta passagem escreveu:

A descrição mais adequada da pessoa de Cristo está contida nas palavras ‘Deus se manifestou em carne’. Em primeiro lugar, temos aqui uma afirmação distinta de ambas as naturezas, pois o apóstolo declara que Cristo é ao mesmo tempo verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Em segundo lugar, ele põe em evidência a distinção entre as duas naturezas, pois primeiramente o denomina de Deus, e em seguida declara sua manifestação em carne. E, em terceiro lugar, ele assevera a unidade de sua Pessoa, ao declarar que ela era uma e mesma Pessoa que era Deus e que se manifestou em carne. Nesta única frase, a fé genuína e ortodoxa é poderosamente armada contra Ário, Marcião, Nestório e Êutico. Há forte ênfase no contraste das duas palavras: Deus e carne. A diferença entre Deus e o homem é imensa, e, todavia, em Cristo vemos a glória infinita de Deus unida à nossa carne poluída, de tal sorte que ambas se tornaram uma só.[5]

Maringá, 23 de novembro de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Veja-se: D. Martyn Lloyd-Jones, As Insondáveis Riquezas de Cristo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, especialmente, p. 53-55.

[2] Stott faz boas analogias com a palavra grega (Veja-se: John R.W. Stott, A Mensagem de Efésios, São Paulo: Aliança Bíblica Universitária, 1986,p. 84).

[3]*Rm 11.33; Ef 3.8. A palavra aparece em três textos da LXX (Jó 5.9; 9.10; 24.34): “Ele faz coisas grandes e inescrutáveis (a)necixni/astoj) e maravilhas que não se podem contar” (Jó 5.9). “Quem faz grandes coisas, que se não podem esquadrinhar (a)necixni/astoj), e maravilhas tais, que se não podem contar” (Jó 9.10).

[4]*At 3.12; 1Tm 2.2; 3.16; 4.7,8; 6.3,5,6,11; 2Tm 3.5; Tt 1.1; 2Pe 1.3,6,7; 3.11.

[5]João Calvino, As Pastorais,São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 3.16), p. 100.

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