A Santidade de Deus e a necessidade de arrependimento: uma pregação urgentemente necessária (5)

Graça do arrependimento

 

No arrependimento não há mérito nem arrogância, antes, vergonha e, em um segundo momento, atitude de gratidão a Deus por nos ter aceito, que se manifesta em frutos de obediência. O pecador arrependido não se protege em supostos atenuantes,[1] antes, certo de seu pecado, culpa, e da gravidade de ter ofendido a Deus,[2] busca a consciência do misericordioso perdão[3] de seu Senhor.

 

O arrependimento distingue-se, assim, do remorso, que é apenas uma tristeza por um ato pecaminoso, em geral, percebido por causa das consequências, ainda que parciais, do seu pecado (Jr 3.7). Esta tristeza (remorso) pelo pecado faz parte do arrependimento, contudo, ela sozinha é insuficiente.[4]

 

O arrependimento é por si só fruto da graça de Deus; é uma tristeza produzida por Deus em nossos corações. Somente a verdadeira convicção do pecado, resultante da contemplação do Deus santo, pode nos conduzir à consciência de nossa pobreza espiritual e ao choro de arrependimento pelos nossos pecados.

 

Insisto: O arrependimento sincero é uma “concessão”, um presente[5] de Deus. Afirma o apóstolo Paulo: “Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento (meta/noia) para a salvação” (2Co 7.10/2Tm 2.25). “A bondade de Deus é que te conduz ao arrependimento (meta/noia) (Rm 2.4/At 11.18; Hb 12.17).

 

“A fé e o arrependimento não devem ser reputados coisas meritórias mediante as quais merecemos o perdão. Pelo contrário, são os meios pelos quais nos apropriamos da graça de Deus”, escreve Morris (1914-2006).[6] Em síntese: “O arrependimento não está no poder do homem”.[7] Por isso, ele é próprio do novo homem.[8] Deste modo, podemos falar como nos Cânones de Dort, “que o homem crê e se arrepende mediante a graça que recebeu”.[9]

 

O conceito de arrependimento, envolvendo uma mudança radical na vida do homem é um conceito cristão sem paralelo na literatura grega.[10]

 

O arrependimento bíblico consiste em voltar-se total e integralmente para Deus.  Envolve uma atitude de abandono do pecado e uma prática da Palavra de Deus.[11] Esta prática consiste nos “frutos do arrependimento”.

 

Paulo, testemunhando diante do rei Agripa a respeito do seu ministério, diz:

 

Pelo que ó rei Agripa, não fui desobediente à visão celestial, 20mas anunciei primeiramente aos de Damasco e em Jerusalém, por toda a região da Judéia, e aos gentios, que se arrependessem e se convertessem a Deus praticando obras dignas de arrependimento (meta/noia). (At 26.19,20. Vejam-se também: At 20.21/Lc 3.8).

 

Maringá, 24 de janeiro de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Acesse aqui esta série de estudos completa

 


 

[1]“A autodefesa vai-se quando vemos que não merecemos nada senão castigo. Compreendemos que somos miseráveis, que somos vis. O homem muda, pois, o seu conceito sobre si próprio” (D.M Lloyd-Jones, Romanos: Exposição Sobre Capítulos 2:1 a 3:20: o justo juízo de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1999, p. 85). Veja-se: Allan Harman, Comentário do Antigo Testamento ‒ Salmos, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, (Sl 32-3-5), p. 157.

[2]“Jamais aplicaremos seriamente o perdão divino, enquanto não tivermos obtido uma visão tal de nossos pecados, que nos inspire terror” (João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 2, (Sl 51.3), p. 424).

[3]“De fato o perdão de pecados é realizado definitiva e perfeitamente em Deus, mas nos é dado e apropriado por nós em nossas vidas através da fé e do arrependimento” (Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 462).

[4] Quanto à confusão feita nas traduções entre arrependimento e remorso, veja a excelente obra de meu antigo mestre, Oadi Salum, Teologia Sistemática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 362-363.

[5]“O arrependimento é um presente do Cristo que subiu ao céu, no seu glorioso ofício de Mediador” (Sinclair B. Ferguson, Arrependimento, Recuperação e Confissão: In: James M. Boice; Benjamin Sasse, orgs. Reforma Hoje, São Paulo: Cultura Cristã, 1999, p. 143).

[6] Leon Morris, Perdão: In: J.D. Douglas, ed. org. O Novo Dicionário da Bíblia, São Paulo: Junta Editorial Cristã, 1966, v. 3, p. 1268a.

[7]João Calvino, Exposição de Hebreus, São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 6.6), p. 155.

[8] Cf. Herman Bavinck, Teologia Sistemática, p. 479.

[9]Os Cânones de Dort, São Paulo: Cultura Cristã, (s.d.), III-IV.12.

[10] Cf. J. Goetzmann, Conversão: In: Colin Brown, ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 1, p. 499.

[11]“O arrependimento bíblico, então, não é meramente sentir um remorso que nos deixa onde estamos; é uma inversão radical que nos leva de volta pela estrada de nossas peregrinações pecaminosas, criando em nós uma mentalidade completamente nova. É cair em si espiritualmente (cf. Lc 15.17). A vida não é mais caracterizada pela exigência ‘dá-me’ (Lc 15.12) e sim pelo pedido ‘faze-me’ (Lc 15.19)” (Sinclair B. Ferguson, Arrependimento, Recuperação e Confissão: In: James M. Boice; Benjamin Sasse, orgs. Reforma Hoje, São Paulo: Cultura Cristã, 1999, p. 131).

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