A Pessoa e Obra do Espírito Santo (392)

6.4.10. O Espírito, a Igreja e sua identidade

A missão da Igreja é determinada por sua origem, fundamento, cabeça e direção. Deste modo, estamos afirmando que a Trindade está totalmente comprometida com a Igreja em sua existência, preservação e testemunho.

Não podemos falar em missão, sem termos consciência destes elementos. A Igreja, com frequência se perde em sua missão, justamente por não compreender adequadamente a sua identidade; a dimensão da sua existência.

Faremos um resumo de alguns pontos já tratados e retomaremos outros.

6.4.10.1. Identidade Teológica

1) A Igreja é edificada por Deus sobre a Rocha (Mt 16.18/Ef 2.19-22; Lc 20.17; 1Co 10.4).

Como tratamos mais detalhadamente, a Igreja é edificada pelo próprio Cristo. Deus não confiou esta tarefa a mais ninguém. É Ele mesmo quem reúne os seus.[1] O fundamento da Igreja não é o homem com as suas fraquezas e pecado, nem a sua vacilante confissão de fé; mas sim, o próprio Cristo, a rocha eterna e inabalável. A confissão da identidade do Filho, é fundamental para o ingresso na Igreja e, tal confissão só se torna possível pela graça reveladora de Deus (Mt 16.16,17). E, esta revelação é feita de acordo com o propósito de Deus.

          Jesus declara: “Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar”(Mt 11.27).

          A Igreja é o Corpo de Cristo e é Deus mesmo quem forma este corpo. É Deus quem elege o seu povo e o chama eficazmente por intermédio da Palavra, para fazer parte da Sua Igreja. Deus arregimenta o seu povo, preservando-o até concluir a sua obra iniciada na eternidade (Fp 1.6).

          Jesus: “Todo aquele que o Pai me dá; esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora (…). Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia (…). Ninguém poderá vir a mim, se pelo Pai não lhe for concedido”(Jo 6.37,44,65).

          Paulo: “…Aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.29-30).

2) A Igreja é do Deus Triúno: A Ele cabe dirigi-la (At 9.31; 20.28; Rm 16.16; 1Co 1.2; 10.32; 11.16,22; 2Co 1.1; Ef 5.23-24; Cl 1.18; 1Ts 2.14; 2Ts 1.4; 1Pe 2.9-10).

3) A Igreja é o Corpo de Cristo: Ele a ama, preserva, alimenta e santifica. O sacrifício de Cristo foi em favor de sua Igreja. Na direção de sua Igreja, Cristo usa da sua autoridade em amor, alimentando o seu rebanho por meio de Seus servos (At 20.28/1Pe 5.1-4), cuidando do seu povo e a santificando para apresentá-la a si mesmo, como Igreja gloriosa e pura, resultado do Seu laborioso amor (Ef 5.25-27,29; Cl 1.24).

4) Deus concede graça à Igreja (1Co 12.28; 2Co 8.1). A Igreja é o monumento da graça de Deus: tudo que somos e temos é pela graça. A graça de Deus não é estéril; devemos usá-la para o serviço de Deus e em benefício do nosso próximo (Rm 12.6-8; 1Co 15.10; 2Co 6.1; 2Co 8.1-9; 16-19; 9.8,14, Hb 12.28; 1Pe 4.10).[2]

6.4.10.2. Identidade Teocêntrica

A Igreja tem uma natureza teantrópica: Ela é criada por Deus em Cristo (1Ts 2.14) – não é simplesmente uma associação de voluntários –, é o Corpo de Cristo. Mas também, é humana em sua constituição.

          Partindo desta perspectiva, podemos entender que a sua identidade divina determina a sua existência teocêntrica. A Igreja – edificada por Deus e composta por homens –, deve viver para a Glória de Deus (1Co 10.31).

 

6.4.10.2.1. A Igreja é uma Comunidade

A Igreja não é constituída de pessoas individuais que vivem individualmente para si mesmas. Ser cristão, apesar de não anular a nossa personalidade, significa ter uma dimensão da nossa identidade como Corpo de Cristo. O que caracteriza a nossa “comunidade” é primordialmente, a nossa comunhão com Cristo[3] (1Jo 1.3).

          Calvino, no Catecismo de Genebra, comentando o Credo Apostólico, enfatiza o aspecto comunitário da Igreja, dizendo ser ela, “um corpo e companhia dos fiéis, aos quais Deus ordenou e elegeu para a vida eterna”.[4] Isto significa que as bênçãos de Deus para a sua Igreja, são derramadas sobre todo o seu povo, visto que todos estes têm comunhão entre si.[5]                       

          “O cristão – diz Lewis –, é chamado não ao individualismo, mas à participação no corpo de Cristo. A distinção entre a coletividade secular e o corpo de Cristo é, portanto, o primeiro passo para compreender como o cristianismo, sem ser individualista, pode neutralizar o coletivismo”.[6]

  Como comunidade, a igreja:

      (1) Reúne-se:

         a) Louvar a Deus: Lc 24.50-53.

                b) Orar: At 1.14; 2.42.

                c) Participar da Ceia:  At 2.42; 20.7; 1Co 11.20.

                d) Atender às necessidades da comunidade: At 6.1-2.

                e) Resolver questões doutrinárias: At 15.6.

                 f) Ouvir a Palavra de Deus: At 20.7,11; 11.26.

                (2) Manifesta Simpatia: At 2.45; 4.34-35; 2Co 8.1-6/Rm 15.25-26; Fp 1.5; 4.13-16; 1Tm 5.16; Tg 5.14.

Maringá, 30 de janeiro de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] “O significado de uma assembleia profana está em razão direta com o número dos que dela participam. A assembleia do povo de Deus, ao contrário, independe deste fato. Ela existe quando Deus reúne os seus. Seu número depende daquele que chama e reúne, e somente então dos que se deixam chamar e reunir. (Mt 18.20)” (Karl L. Schmidt, Igreja: In: Gerhard Kittel, ed. A Igreja no Novo Testamento, São Paulo: ASTE, 1965, p. 20).

[2]Vejam-se: João Calvino, A Verdadeira Vida Cristã,p. 36; João Calvino,Exposição de 1 Coríntios, (1Co 4.7), p. 134-135; Karl L. Schmidt, Igreja: In: Gerhard Kittel, ed. A Igreja no Novo Testamento, São Paulo: ASTE, 1965, p. 22.

[3] Veja-se: K.L. Schmidt, Igreja: In: Gerhard Kittel, ed. A Igreja no Novo Testamento, São Paulo: ASTE, 1965, p. 29.

[4]Juan Calvino, Catecismo de la Iglesia de Ginebra, Pergunta, 93. In: Catecismos de la Iglesia Reformada, Buenos Aires: La Aurora, (Obras Clasicas de la Reforma, XIX), 1962, p. 49. Este Catecismo escrito em francês, foi elaborado por Calvino durante o inverno de 1536-1537, não sendo constituído em forma de perguntas e respostas, redigido de modo que considerou acessível à toda Igreja. O seu objetivo era puramente didático.

            Esta obra foi intitulada: Breve Instrução Cristã (*), sendo traduzida para o latim em 1538. (D.F. Wright, Catecismos: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, v. 1 p. 250). Posteriormente, Calvino a reviu – tornando a sua teologia mais acessível aos seus destinatários: as crianças (T.M. Lindsay, La Reforma y Su Desarrolo Social,Barcelona: CLIE., (1986), p. 100) –, e a ampliou consideravelmente, mudando inclusive a sua forma, passando então, a ser constituída de perguntas e respostas, contendo 373 questões. Esta nova edição foi publicada entre o fim de 1541 e o início de 1542. Em 1545, Calvino o traduziu para o latim, a fim de atingir os intelectuais de outros países que não falavam o francês. A partir de 1561, este Catecismo ganhou maior importância, visto que desde então todo ministro da Igreja deveria jurar fidelidade aos ensinamentos nele expressos e comprometer-se a ensiná-los. (Cf. B. Foster Stockwell, na apresentação da obra, Catecismo de la Iglesia de Ginebra:In: Catecismos de la Iglesia Reformada,p. 7-8).

(*) Este Catecismo (Em português: Instrução na Fé, Goiânia: Logos Editora, 2004) consistiu num resumo da primeira edição das Institutas (1536) consistiu num resumo da primeira edição das Institutas (1536). (Cf. John H. Leith, em prefácio à tradução da obra de Calvino e Paul T. Fuhrmann em “prefácio histórico” à mesma obra, Instruction in Faith (1537),Louisville, Kentucky: Westminster; John Knox Press, (1992), p. 10 e 16; T.M. Lindsay, La Reforma y Su Desarrolo Social, p. 101; John T. McNeill, The History and Character of Calvinism,New York: Oxford University Press, 1954, p. 140. Veja-se também, p. 204). Esta foi a primeira “exposição sistemática do pensamento calvinista na língua francesa”  (A.H. Freundt Jr., Catecismo de Genebra: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã,v. 1 p. 246).  consistiu num resumo da primeira edição das Institutas (1536)

[5] Catecismo de la Iglesia de Ginebra, Pergunta, 98.

[6]C.S. Lewis, Peso de Glória, 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1993, p. 40.

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