A Pessoa e Obra do Espírito Santo (442)

6.4.12.1.2. A nulidade e loucura da sabedoria humana nas questões espirituais (Continuação)

Aos arrogantes coríntios, que com uma suposta sabedoria inexistente queriam limitar Cristo aos seus modestos e frágeis cânones intelectuais, o apóstolo indaga:

20Onde está o sábio (sofo/j)? Onde, o escriba? Onde, o inquiridor deste século? Porventura, não tornou Deus louca (mwrai/nw) a sabedoria (sofi/a) do mundo? 21Visto como, na sabedoria (sofi/a) de Deus, o mundo não o conheceu por sua própria sabedoria (sofi/a), aprouve (eu)doke/w)[1] a Deus salvar os que creem pela loucura (mwri/a) da pregação (1Co 1.20-21).

    A ideia da palavra traduzida por “loucura’, é de algo “imbecil”, “tolo”, “insensato”. Na literatura clássica está relacionada à falta de conhecimento e discernimento. Dentro do aspecto da insensatez, esta figura é aplicada ao sal que, se se tornar “insípido” (mwrai/nw) (Mt 5.13; Lc 14.34-35) para nada mais serve.

            No emprego feito por Paulo, a loucura da mensagem da cruz de Cristo está justamente pela sua falta de sentido intelectual para aqueles que querem avaliar o seu conteúdo dentro de seus pressupostos viciados. Em síntese, o Evangelho soa como algo “simplório”.

            Paulo diz que Deus tornou “louca” (mwrai/nw) a sabedoria deste mundo (1Co 1.20). Por sua vez, os ímpios se considerando sábios, “tornaram-se loucos(mwrai/nw) (Rm 1.22/Jr 10.14 (“estúpido” [mwrai/nw]), em sua idolatria, recebendo o justo castigo de Deus (Rm 1.23-27).

            Deste modo, a sabedoria de Deus será sempre loucura (mwri/a) para os sábios deste mundo que querem simplesmente adequar o Evangelho aos seus pressupostos (1Co 1.18,23; 2.14). Dentro desta perspectiva, Deus escolheu então as cousas loucas (mwro/j) do mundo” (1Co 1.27). Em outras palavras, Deus deliberou em Sua sabedoria que a sabedoria humana não seria o caminho para conhecê-lo.[2]

            A sabedoria deste mundo é loucura (mwri/a) diante de Deus (1Co 3.19). Deus sabe que os pensamentos destes “sábios” são “vãos” (= “nulos”, “fúteis” [ma/taioj] *At 14.15; 1Co 3.20; 15.17; Tt 3.9; Tg 1.26; 1Pe 1.18)(1Co 3.20).

            Por outro lado, os que creem na loucura (mwri/a) da pregação serão salvos (1Co 1.21). A loucura (mwro/j) de Deus é mais sábia do que a sabedoria deste mundo (1Co 1.25). Mas, qual a diferença entre a sabedoria de Deus e a sabedoria do mundo?

            A diferença fundamental, é que a sabedoria deste mundo tenta anular a cruz de Cristo, buscando um caminho mais de acordo com os seus pressupostos, realçando a sua capacidade e autonomia, buscando em si mesmos a solução de seus problemas e, descobrem tristemente, que seus reservatórios estão vazios.[3]

            A sabedoria de Deus, por sua vez, mostra na cruz, o pecado humano e a sua total incapacidade de salvar-se, estando totalmente perdido, realçando a graça redentora de Deus (Rm 3.34-26; 5.6-11).

            Piper resume:

Em outras palavras, a cruz ofende a sabedoria humana porque ela humilha o homem e exalta a imerecida graça de Deus.[4] (…) O âmago da sabedoria de Deus é a paixão de Deus por demonstrar sua graça em Cristo para o gozo eterno daqueles que creem. Visto que todos nós somos pecadores indignos, a cruz é central para essa sabedoria. Sem a cruz, não poderíamos ter essa sabedoria. (…) A essência da sabedoria de Deus é exaltar a glória de sua graça manifestada em Cristo crucificado.[5]

            Portanto, se quisermos nos tornar sábios para Deus, tornemo-nos loucos (mwro/j) para as cousas deste mundo (1Co 3.18).[6]

            De certa forma, somos os loucos de Cristo (1Co 4.10). Por sua vez, ilustrando que a “loucura” ou “insensatez” não são boas em si mesmas, Paulo faz recomendações práticas para que rejeitemos as questões “sábias” deste mundo que consistem em discussões e questões “insensatas” que produzem contendas, não tendo utilidade (2Tm 2.23; Tt 3.9 [“fúteis” (ma/taioj]). Portanto, o Evangelho não tem a “loucura” e “insensatez” como virtudes (Mt 23.16-17; 25.1-13). A verdadeira sabedoria consiste em ouvir a Palavra de Deus e praticá-la. Loucura é desprezá-la (Mt 7.24-27).

            A sabedoria deste mundo tenta excluir Deus, por isso a loucura desta suposta sabedoria que astutamente torna a realidade apenas material, ou, quando muito, vê a vida como sendo dominada por alguma força cósmica impessoal. Dentro desta perspectiva secular-mística, a mensagem do Evangelho permanece como loucura. Ela é inacessível à compreensão puramente humana e limitada.

            Portanto, o argumento de Paulo quanto à proclamação do Evangelho:

….a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus; porquanto está escrito: Ele apanha os sábios (sofo/j) na própria astúcia deles (1Co 3.19).

….expomos sabedoria (sofi/a) entre os experimentados; não, porém, a sabedoria (sofi/a) deste século, nem a dos poderosos desta época, que se reduzem a nada (katarge/w) (algo que desvanece, se dilui) (1Co 2.6).

Maringá, 25 de março de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Tanto o verbo (eu)doke/w) quanto o substantivo (eu)doki/a) enfatizam aquilo ou aquele que é prazeroso, considerando a essência da coisa ou o que se tem em vista. Assim, vemos que Deus Se compraz em Jesus Cristo, o Filho amado (Mt 3.17; 12.18; 17.5; 2Pe 1.17), em quem reside, conforme a vontade de Deus, toda a plenitude da divindade (Cl 1.19/2.9). Deus tem prazer em revelar a Sua vontade aos “pequeninos” (Mt 11.25-26; Lc 10.21), concedendo o Seu Reino (Lc 12.32). Ele nos predestinou para adoção conforme o seu “beneplácito” (eu)doki/a) (Ef 1.5,9), assim como vocaciona os Seus servos conforme Sua vontade (Gl 1.15-16). Deus tem prazer em salvar o Seu povo por meio da pregação da Palavra (1Co 1.21). Deus opera em nós conforme a Sua liberdade soberana e prazerosa (Fp 2.13). No entanto, estas palavras não são utilizadas somente para Deus, elas também descrevem atitudes e aspirações humanas, como o desejo de Paulo pela salvação dos judeus (Rm 10.1); a sua oração em favor dos tessalonicenses (2Ts 1.11); a voluntariedade prazerosa da Igreja em socorrer os irmãos necessitados (Rm 15.26-27); o desejo de deixar o corpo para estar com Cristo (2Co 5.8); a abnegação de Paulo em prol dos tessalonicenses, compartilhando a sua própria vida (1Ts 2.8 “estávamos prontos” (eu)doke/w)/1Ts 3.1-5: Verso 1: pareceu-nos bem (eu)doke/w) ficar sozinhos em Atenas”); sofrer pelo testemunho de Cristo, a quem amava (2Co 12.10). O Evangelho deve ser pregado: “de boa vontade(eu)doki/a) (Fp 1.15).

[2] Veja-se: John Piper, Pense – A Vida da Mente e o Amor de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2011, p. 205.

[3]“Em sua insanidade arrogante, os homens afirmam que são mais sábios do que Deus, ao asseverarem seu próprio pensamento e abordagem quanto à vida. E aqueles que os ouvem procuram, em grande número, as cisternas rotas da filosofia humanista deles, em busca de respostas para a vida. Mas tudo que descobrem são reservatórios vazios que escarnecem de sua sede” (Steven J. Lawson, O tipo de pregação que Deus abençoa, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2013, p. 52).

[4] “A cruz se levanta como testemunho da infinita dignidade de Deus e o infinito ultraje do pecado” (John Piper, A Supremacia de Deus na Pregação, São Paulo: Shedd Publicações, 2003, p. 31).

[5]John Piper, Pense – A Vida da Mente e o Amor de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2011, p. 209,210.

[6] Ninguém se engane a si mesmo: se alguém dentre vós se tem por sábio (sofo/j) neste século, faça-se estulto (mwro/j) para se tornar sábio (sofo/j) (1Co 3.18).

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