Uma oração intercessória pela Igreja (85)

        7.4.1.2. O privilégio e a responsabilidade dos que pregam (Continuação)

            A doutrina da vocação é o fundamento da teologia da vida cristã. Deus em seu amor eterno urgencia com a igreja a que compartilhe com todos, de forma “centrífuga” esta mensagem.[1] 

            A Pessoa de Cristo tem em si mesma e consequentemente em sua obra a força centrípeta que nos atrai e, num processo natural desta atração transformadora, exerce a sua força centrífuga[2] que nos conduz de forma imperativa a anunciar a sua pessoa e os seus feitos gloriosos e redentores entre todos os povos. 

            Portanto, seguindo Bannerman (1807-1868), “não há dúvida de que as Escrituras apresentam a glória de Deus como o grande objetivo do estabelecimento de uma igreja no mundo, na salvação dos pecadores, por meio da proclamação do Evangelho”.[3]

            Calvino resume bem esse ponto: “A pregação externa dos homens é o instrumento pelo qual Deus nos atrai à fé. Segue-se que Deus é, estritamente falando, o Autor da fé e os homens são os ministros por meio de quem cremos, como nos preceitua Paulo [1Co 3.5]”.[4]

            Como pecadores que foram alcançados por esta graça, somos instrumentos externos por meio dos quais Deus age, tornando pelo Espírito, a Palavra anunciada em algo penetrante e transformador do coração humano.[5] A pregação é o principal meio de comunicação dessa graça ao coração e à vida do crente.[6]

            A semente que plantamos só terá vida e crescimento por meio da graça operante de Deus.[7] Não temos poder para gerar ou transformar vida.  É isso que Paulo demonstra aos imaturos coríntios que conferiam um valor idólatra e, ao mesmo tempo, discriminatório, aos seus pastores:

5 Quem é Apolo? E quem é Paulo? Servos por meio de quem crestes, e isto conforme o Senhor concedeu a cada um. 6 Eu plantei, Apolo regou; mas o crescimento veio de Deus. 7 De modo que nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento. (1Co 3.5-7).

            É fato que Deus utiliza-se de seus servos, mas, o segredo da vida da Igreja está em Deus.[8] A nossa vocação é para o serviço de Deus entre os homens, contudo, o senhor da vocação é o senhor da vida, o senhor de sua igreja, comenta Hendriksen:

Deus pode utilizar instrumentos humanos para levar aos homens sua mensagem de verdade e amor; porém somente Ele é o que desperta os corações dos homens para uma nova vida. Como somente Ele criou o coração, somente Ele pode recriá-lo.[9]

            No livro de Atos, constatamos que, enquanto o povo de Deus pregava a Palavra e vivia o Evangelho, o Senhor fortalecia a sua Igreja e chamava eficazmente os Seus:

Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo. Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos. (At 2.46-47).

E crescia mais e mais a multidão de crentes, tanto homens como mulheres, agregados ao Senhor. (At 5.14).

Crescia (au)ca/nw) a palavra de Deus, e, em Jerusalém, se multiplicava o número dos discípulos; também muitíssimos sacerdotes obedeciam à fé. (At 6.7).

A igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em número. (At 9.31).

            Tiago fora martirizado e Pedro miraculosamente liberto. A Igreja continuava perseguida… “Entretanto, a palavra do Senhor crescia (au)ca/nw) e se multiplicava” (At 12.24). “Assim, a palavra do Senhor crescia (au)ca/nw) e prevalecia poderosamente” (At 19.20).

            O livro de Atos, indicando o crescimento da Igreja de Deus, termina falando da prisão e pregação de Paulo em Roma:

Por dois anos, permaneceu Paulo na sua própria casa, que alugara, onde recebia todos que o procuravam, pregando o reino de Deus, e, com toda a intrepidez, sem impedimento algum, ensinava as coisas referentes ao Senhor Jesus Cristo. (At 28.30-31).

Maringá, 03 de julho de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] Vejam-se: J. Blauw, A Natureza Missionária da Igreja, São Paulo: ASTE., 1966, p. 34ss.; John R.W. Stott, A Missão Cristã no Mundo Moderno, Viçosa, MG.: Ultimato, 2010, p. 24ss.

[2] Li posteriormente esta linguagem sendo empregada para falar do aspecto missiológico dos salmos. Veja-se: Carl J. Bosma, Os Salmos: Porta de Entrada para as Nações. Aspectos da base teológica e prática missionária no Livro dos Salmos, São Paulo: Fôlego, 2009, p. 49ss.

[3]James Bannerman, A Igreja de Cristo – Um tratado sobre a natureza, poderes, ordenanças, disciplina e governo da Igreja Cristã, Recife, PE.: Editora os Puritanos, 2014, p. 77.

[4]João Calvino, Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2015, v. 2, (Jo 17.20), p. 199.

[5]Como diz Bavinck, “independente do real poder e mérito dessa vocação externa, ela não é suficiente para mudar o coração do homem e efetivamente movê-lo à aceitação do Evangelho” (Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 458).

[6] Veja-se: John F. MacArthur Jr., ed., Pregação: Como pregar biblicamente, Eusébio, CE.: Peregrino, 2018, p. 395.

[7]Veja-se: Joel R. Beeke, Vivendo para a Glória de Deus: Uma introdução à Fé Reformada, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2012 (reimpressão), p. 130.

[8]“Portanto, mesmo que o cuidado do agricultor não seja ineficiente, e a semente que ele semeia não seja improdutiva, contudo, é tão somente pela bênção de Deus que se torna produtiva” (J. Calvino, Exposição de 1 Coríntios, (1Co 3.6), p. 103).

[9] William Barclay, 1 y 2 Corintios, Buenos Aires: La Aurora, 1973, p. 43.

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