Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (30) 

10.1. “Rogo-vos…. que andeis”

 

10.1.1. “Com toda humildade”: (Ef 4.2)

1) O Sentido da palavra humildade

Calvino citando Agostinho (354-430), diz: “Se me interrogues acerca dos preceitos da religião cristã, primeiro, segundo e terceiro, aprazer-me-ia responder sempre: a humildade”.[1]

 

No texto de Efésios a palavra empregada para humildade é Tapeinofrosu/nh (*At 20.19; Ef 4.2; Fp 2.3; Cl 2.18,23; 3.12; 1Pe 5.5). Ela é a composição de duas palavras: tapeino/j,[2] que tem o sentido: a) Literal de “aplanar”, “nivelar” ([Lc 3.5[3] (Is 40.4)]; b) Figurado de “humilde” (Mt 11.29) e frh/n, “pensamento”, “compreensão”, “juízo” (*1Co 14.20).[4]

 

Aqui vemos mais um ingrediente totalmente estranho ao mundo antigo. A palavra (tapeino/j) tinha originalmente, no mundo pagão, o sentido depreciativo de “estar em baixo”, indicando de modo figurado “socialmente baixo”, “pobre”, “de pouca influência social”, o escravo que assumiu uma atitude de submissão bajulante, lisonjeador etc. Obviamente, humildade não era vista como uma virtude.[5] Do mesmo modo, o composto tapeinofrosu/nh significa “modéstia de mente”, indicando a atitude mental despretensiosa, caracterizando-se pela modéstia. Portanto, apresenta sempre uma conotação depreciativa.

 

Desse modo, para o pensamento grego, a humildade estava longe de ser considerada uma virtude.

Barclay (1907-1978) explica:

 

Nos dias anteriores a Cristo a humildade sempre foi considerada como algo baixo, rasteiro, servil e não nobre. E, sem dúvida, o cristianismo a colocou justamente em primeiro plano entre todas as virtudes cristãs; é de fato, a virtude da qual dependem e provêm todas as demais virtudes.[6]

 

A humildade é um termo alcunhado pelo Cristianismo, concedendo-lhe um novo significado.

 

Isso é fácil de entender, se considerarmos que enquanto os gregos tinham como centro de gravidade o homem, na teologia bíblica o centro de todo o significado da existência está em Deus. Portanto, na concepção grega a modéstia era considerada coisa vergonhosa, devendo ser evitada. Já no pensamento bíblico, as palavras relacionadas à humildade descrevem “aqueles eventos que levam o homem a ter um relacionamento certo com Deus e com seu próximo”.[7]

 

A ideia aqui expressa, é de reconhecimento da própria fraqueza e do poder sustentador de Deus. A humildade cristã que é mãe das demais virtudes é produzida pela contemplação da majestade de Deus e, posteriormente, por uma visão adequadamente real do que somos.

 

Maringá, 21 de abril de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Leia esta série completa aqui.

 


[1]João Calvino, As Institutas, II.2.11.

[2] * Mt 11.29; Lc 1.52; Rm 12.16; 2Co 7.6; 10.1; Tg 1.9; 4.6; 1Pe 5.5.

[3] Aqui o que ocorre é o verbo tapeino/w. (* Mt 18.4; 23.12; Lc 3.5; 14.11; 18.14; 2Co 11.7; 12.21; Fp 2.8; 4.12; Tg 4.10; 1Pe 5.6).

[4] Ocorre duas vezes em 1Co 14.20.

[5]Ver mais detalhes em: H.-H. Esser, Humildade: In: Colin Brown, ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 2, p. 386; W. Grundmann, Tapeino/j: In: G. Kittel; G. Friedrich, eds. Theological Dictionary of the New Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 8, p. 1-5 (especialmente).

[6]William Barclay, El Nuevo Testamento Comentado, Buenos Aires: La Aurora, 1974, v. 10, (Ef 4.1-3), p. 142.

[7] H.-H. Esser, Humildade: In: Colin Brown, ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, v. 2, p. 387.

One thought on “Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (30) 

  • 27 de abril de 2019 em 18:14
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    Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, para que no seu tempo vos exaute. IPedro 5:6,10

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