Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (81)

5.9. O Espírito como Senhor da vida e Mestre da Oração (Continuação)

Orar em nome de Jesus

Outro ponto relevante, é que a oração no Espírito é sempre por intermédio de Cristo. Isso significa que quando oramos, o fazemos por iniciativa do Espírito, por intermédio de Cristo, no nome de Cristo. Portanto, orar genuinamente significa harmonizar a nossa vontade com a do Filho, alinhando a nossa vontade com a dele.[1]

Orar ao Pai não significa simplesmente usar o seu nome, mas, sim, dirigir-nos de fato a Ele conforme os seus preceitos, em submissão à sua vontade. Uma oração francamente oposta aos ensinamentos de Jesus não pode ser considerada de fato uma oração dirigida ao Pai, por mais que usemos e repitamos o nome de Jesus.

Quando oramos genuinamente em nome de Cristo, podemos descansar nas promessas de Deus certos de que Ele que nos ouve pelo Filho, satisfará as nossas necessidades. Essa certeza, além de alegre e humilde confiança, nos conduz  à perseverança em ação de graças (Cl 4.2).[2]

Calvino comenta:

Cristo testifica que, se nossas orações lhe forem endereçadas, não ficarão sem efeito. E deveras sem essa confiança a solicitude da oração seria totalmente arrefecida. Mas quando Cristo satisfaz aos que a ele vão, e se dispõe a satisfazer seus desejos, já não há mais lugar para indolência nem delonga. E não há ninguém que não sinta que isso é dito a todos nós, se não fôssemos impedidos por nossa incredulidade.[3]

Deste modo, é necessário que tenhamos cuidado para que não cometamos falsidade ideológica em nossas orações. Orar em nome de Jesus é dizer ao Pai que o seu Filho eterno, o nosso irmão mais velho, subscreveu o que estamos dizendo. Orar no nome de Jesus significa a confiança única e exclusiva na suficiência de seus méritos.[4]

Portanto, não devemos nem podemos pedir qualquer coisa a Deus contrária à vontade de Jesus Cristo, visto que as nossas orações são feitas em seu nome. 

A nossa oração não pode ser uma diminuição da santidade de Cristo. Como bem compreendeu Pink (1886-1952), ao escrever:

Solicitar algo a Deus, em nome de Cristo, quer dizer solicitar-lhe algo em harmonia com a natureza de Cristo! Pedir algo em nome de Cristo, a Deus Pai, é como se o próprio Cristo estivesse formulando a petição. Só podemos pedir a Deus aquilo que Cristo pediria. Pedir em nome de Cristo, pois, significa deixar de lado nossa vontade própria, aceitando a vontade do Senhor![5]

O Espírito nos dirige para que não usemos o nome do Filho em vão. Somente o Espírito pode nos mostrar qual é a vontade de Deus e nos capacitar a aceitá-la com fé. Quando oramos no Espírito estamos confessando a nossa pequenez e, ao mesmo tempo, testemunhando a nossa fé na soberania de Deus.

“O Espírito constrói uma determinada atmosfera em torno de toda a oração autêntica, e dentro desse círculo próprio é que a oração vive e triunfa; fora dele, a oração é apenas uma formalidade morta”, enfatiza Spurgeon (1834-1892).[6]

Agostinho (354-430), comentando o Salmo 102.2 – quando o salmista diz “… inclina-me os teus ouvidos; no dia em que eu clamar; dá-te pressa em acudir-me”–faz uma paráfrase “Escuta-me prontamente, pois peço aquilo que queres dar. Não peço como um homem terreno bens terrenos, mas já redimido do primeiro cativeiro, desejo o reino dos céus”.[7]

As orações, portanto, devem ser feitas ao Pai, sem constrangimento, em nome de Cristo, pelo auxílio do Espírito, segundo a vontade de Deus.

Maringá, 24 de junho de 2020.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]“A oração não é um recurso conveniente para impormos a nossa vontade a Deus, ou para dobrar a Sua vontade à nossa, mas, sim, o meio prescrito de subordinar a nossa vontade à de Deus. É pela oração que buscamos a vontade de Deus, abraçamo-la e nos alinhamos com ela. Toda oração verdadeira é uma variação do tema, ‘Faça-se a tua vontade'” (John R.W. Stott, I,II e III João, Introdução e Comentário, São Paulo: Vida Nova; Mundo Cristão, 1982, p. 159). Na mesma perspectiva, escreveu MacArthur: “A oração ajuda a alinhar os nossos desejos com a vontade de Deus. Ela agrada a Deus porque é um ato de obediência à Sua Palavra, mas não fornece informações adicionais a Ele” (John MacArthur, Deus: Face a face com sua majestade, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2013, p. 61).

[2] “Nós mal podemos conceber a oração, em seu sentido mais elevado, subindo ao trono da graça, sem ações de graça. (…) Oração sem louvor e ações de graça não é oração” (Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 619).

[3]João Calvino, O Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1,  (Jo 4. 10), p. 160.

[4]Charles Hodge, Systematic Theology, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1976 (Reprinted),v. 3, p. 705.

[5]A.W. Pink, Deus é Soberano,Atibaia, SP.: FIEL, 1977, p. 134. Veja-se também: R. Youngblood, Significados do Nomes nos Tempos Bíblicos. In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã,São Paulo: Vida Nova, 1988-1990, v. 3, p. 25.

[6] C.H. Spurgeon, Firmes na Verdade,Lisboa: Edições Peregrino, LDA., 1987, p. 85.

[7] Agostinho, Comentários aos Salmos,São Paulo: Paulus, 1998, v. 3, p. 12.

One thought on “Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (81)

  • 29 de junho de 2020 em 07:18
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    Impressionante este texto. Temos a tendência a pedir em oração coisas de nosso coração muita das vezes sem nos dar conta de que de fato aquilo não faz parte do que realmente seja a vontade de Deus em nossa vida. Vimos gente usando a fé em pró de coisas vans e mundanas e orando ainda assim em nome de Cristo. Muito esclarecedor. Parabéns!!!

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