A Pessoa e Obra do Espírito Santo (231)

   7. “Sede santos!”: vocação à santidade e a responsabilidade do crente  (Continuação)

                             A nossa real justificação tem implicações éticas. A santificação é a grande evidência de nossa nova relação com Deus. A nossa justificação (subjetiva) nos dá o status de filhos. Como tais, salvos para sempre (Ef 1.5,13-14).[1] O desafio para nós hoje é viver em harmonia com a nossa nova natureza e condição, andando, conforme vimos, nas obras preparadas por Deus para nós (justificação demonstrativa)(Ef 2.8-10).[2]  Enquanto a justificação se ocupa com a culpa do pecado, a santificação se ocupa com a sua corrupção.[3] Fomos libertos da condenação. Agora, estamos sendo progressivamente libertos da contaminação.

          Essa purificação gradativa e intensiva dá-se pela nossa obediência à Palavra de Deus, que é a verdade, como escreve Pedro: “Tendo purificado as vossas almas, pela vossa obediência à verdade….” (1Pe 1.22). A santificação consiste na aplicação honesta e piedosa da verdade, não da experiência. A experiência cristã é resultante do aprendizado e prática da Palavra.

Conhecer, experimentar e obedecer

          Lloyd-Jones  pontua: “A santificação é primariamente a aplicação da verdade a nós mesmos, não primeiramente e acima de tudo ter ou receber uma experiência”.[4]

          A santificação, portanto, não é uma experiência autônoma, antes é o exercício de compreensão e aplicação da Palavra à nossa vida. Insisto: A experiência é o resultado concomitante deste processo. As nossas experiências não servem de fundamento sólido para a nossa fé. As nossas percepções e experiências não significam, necessariamente, compatibilidade com a realidade.

 Por sua vez, a realidade é incomparavelmente mais relevante do que a experiência. A autoridade não é derivada da experiência, mas, da Palavra.

          A experiência deve ser examinada à luz das Escrituras. A Palavra de Deus é o firme fundamento de nossa fé. A Palavra deve ser a intérprete, norteadora e corretora do que experimentamos.

Uma teologia fiel às Escrituras é de extrema relevância nesse processo.[5] Quando priorizamos a experiência, caímos na armadilha de tornar a Palavra algo secundário e, por isso mesmo, temos uma fé frágil, inconstante, sendo movidos ao sabor de nossas paixões, inclinações e interesses circunstanciais.

          Alguém pode então indagar: e a experiência não tem valor algum? Claro que sim. A vida cristã e fundamentalmente experienciável. A nossa relação com Deus é percebida pela certeza subjetiva de nossa filiação, do seu cuidado para conosco e da convicção de que, ainda que os frutos de nossa fé não sejam visíveis agora, nós sabemos quem é o nosso Deus.

Podemos perseverar em obediência porque conhecemos o nosso Deus que é justo, santo, sábio e misericordioso. Notem que o fundamento desta certeza é a Palavra. No entanto, à medida que caminhamos, vamos experimentando a confirmação do que Deus nos ensina na Escritura: Deus honra a sua Palavra. Isto faz parte também da experiência cristã.

          Por isso, quando alguém resume a vida cristã à obediência, comete o equívoco de não perceber que a obediência envolve conhecimento (Jo 17.3).[6] Deus não nos chama à uma fé cega, vazia e puramente emotiva, antes, ao conhecimento de Deus em Cristo que nos permite conhecer aspectos do caráter de Deus, nos relacionando com Ele, aprendendo a conhecê-lo, a levar a sério os seus mandamentos e a descansar em suas promessas. Como afirmamos anteriormente, a obediência é a fé manifestada. Obedecer é fé em exercício. 

          A Palavra do Espírito é eficaz no propósito de santificação estabelecido por Deus. Paulo escreve aos cristãos tessalonicenses:

Outra razão ainda temos nós para incessantemente dar graças a Deus: é que, tendo vós recebido a palavra que de nós ouvistes, que é de Deus, acolhestes não como palavra de homens, e, sim como, em verdade é, a palavra de Deus, a qual, com efeito, está operando eficazmente em vós, os que credes. (1Ts 2.13).

          A forma ordinária da qual Deus se vale para edificar a sua igreja é por meio da Palavra. Ele nos regenera (1Pe 1.23); chama (Rm 10.17),edifica e santifica (Jo 17.17). Tudo por meio de sua Palavra.

          Paulo, quando se despede dos presbíteros de Éfeso, confia a igreja aos seus cuidados. Ele tem certeza da presença sustentadora e santificadora de Deus, operando pela sua Palavra. Apresenta, então, o caminho seguro para a perseverança da igreja: confiar em Deus, obedecendo a sua Palavra: “Agora, pois, encomendo-vos ao Senhor e à palavra da sua graça, que tem poder para vos edificar e dar herança entre todos os que são santificados” (At 20.32).

 Este é o caminho que devemos seguir. O apóstolo orou neste sentido. O mesmo devemos fazê-lo, buscando na Palavra a direção de nosso caminhar.

Maringá, 06 de julho de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]5 nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, (…) 13 em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa; 14 o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória” (Ef 1.5,13-14).

[2]8Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; 9 não de obras, para que ninguém se glorie. 10 Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2.8-10).

[3]Cf. François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, p. 825.

[4]D.M. Lloyd-Jones, Santificados Mediante a Verdade, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, (Certeza Espiritual, v. 3), 2006, p. 84.

[5] “A teologia cristã oferece uma estrutura pela qual as ambiguidades da experiência podem ser interpretadas. A teologia visa interpretar a experiência. É como uma rede que podemos lançar sobre a experiência, a fim de capturar seu sentido. A experiência é vista como algo para ser interpretado, em vez de algo que em si é capaz de interpretar. A teologia cristã visa assim a dirigir-se a, interpretar e transformar a experiência humana”  (Alister E. McGrath, Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalismo,  São Paulo: Shedd Publicações, 2007, p. 66-67).

[6]“E a vida eterna é esta: que te conheçam (ginw/skw) a ti, o único Deus  verdadeiro (a)lhqino/j), e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (Jo 17.3).

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