A Pessoa e Obra do Espírito Santo (469)

6.5.5. Venha o Teu Reino (Continuação)

B. Que o Reino de Deus seja o reinado de Deus em nossos corações

Oramos para que o Deus que habita em nós seja intensamente o Senhor de nossa vida; para que a sua vontade seja feita completamente em nós. Colocarmo-nos como súditos do Reino equivale a reconhecer o senhorio de Cristo sobre nós. “Orar pelo Reino de Deus é orar pela submissão total de nossos desejos à vontade de Deus”, conclui Barclay (1907-1978).[1]

            “Venha o teu Reino” implica no desejo intenso e ardente de total consagração e submissão a Deus e à sua autoritativa Palavra, tendo unicamente a vontade de Deus valor decisório para a nossa vida.

            A Igreja que ora deste modo deseja, cada vez mais, ser a antecipação histórica do Reino; um sinal eloquente do “já” no “ainda não”. Portanto, nesta petição está embutida a busca sincera e consciente por vivenciar, dia após dia, a mesma experiência de vida descrita por Paulo: “Logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que agora tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl 2.20).

            Obviamente, a Igreja não é o Reino. Porém, a visão mais próxima que um incrédulo pode ter do Reino, é por meio da Igreja em sua cotidianidade de testemunho e proclamação.

C. Que o Reino de Deus se estabeleça completa e definitivamente

Esta oração tem um sentido escatológico. Ela envolve a petição da Igreja para que Deus cumpra a sua promessa: a Igreja, quando suplica deste modo, está “esperando e apressando a vinda do dia de Deus”(2Pe 3.12).

A consumação do Reino se dará quando Cristo voltar. Nós que temos as primícias do Espírito, pelo Espírito, podemos dizer: “Vem, Senhor Jesus”(Ap 22.17,20).

Barclay (1907-1978) aqui pode ser usado com proveito:

Também pedimos que cada vez mais queira Ele revestir de glória a sua luz e a sua verdade, para que, assim, as trevas e as mentiras do Diabo e seus agentes se desvaneçam e sejam desarraigadas, confundidas e aniquiladas. Orando, pois, no sentido de que o reino de Deus venha, paralelamente estamos rogando que ele seja finalmente consumado e concretize o seu cumprimento, o que se dará no dia do juízo final, quando todas as coisas serão reveladas. Nesse dia, somente Ele será exaltado, e será ‘tudo em todos’ (1Co 15.28), após haver recebido os Seus na glória e haver reprimido, subjugado e arruinado todo o reino do Diabo.[2]

            Na realidade, não podemos fazer esta oração sem o desejo sincero de Santificação: O Reino de Cristo intensamente em nós; Evangelização: O Reino de Cristo sobre todos os eleitos; Volta de Cristo: O estabelecimento definitivo do Reino de Deus sobre todas as coisas.

            Antes de encerrarmos este ponto, gostaria de dizer algumas palavras sobre o Reino e a concretude de nossa esperança. Em alguns momentos de nossa vida podemos ser tentados a desanimar, ser impacientes, tendo a impressão de que o mal vence o bem, que a honestidade e a dignidade estão descaracterizadas, sendo premiados a esperteza, a falsidade, o logro. Todavia, a Palavra de Deus nos mostra que a vitória de Deus e de seus ensinamentos é certa, por isso, somos mais do que vencedores em Cristo Jesus, ainda que esta vitória nem sempre seja perceptível aos nossos olhos.

            Hoekema (1913-1988) comenta:

Quando o fermento (ou levedura) é colocado na farinha, nada parece acontecer por um momento, mas ao final toda a massa está fermentada. De maneira semelhante, o Reino de Deus está escondido agora, fazendo sua influência ser silenciosa, mas penetrante, até que um dia surgirá a céu aberto para ser visto por todos. Portanto, o Reino, em seu estado presente,  é objeto de fé, não de vista. Mas quando a fase final do Reino for instaurada pela segunda vinda de Jesus Cristo, “todo joelho se dobrará e toda língua confessará que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2.11).[3]

            Mais à frente Hoekema continua:

     Nós estamos no Reino e, mesmo assim, aguardamos sua manifestação completa; nós compartilhamos de suas bênçãos, mas ainda aguardamos sua vitória total; nós agradecemos a Deus por ter-nos trazido para o Reino do Filho que Ele ama, e ainda assim continuamos a orar: “Venha o teu reino”.[4]

            O Reino é uma realidade presente vivenciada por todos aqueles que creem em Cristo. Todavia, ele não é estabelecido por nós. O Reino pertence a Deus (Mt 6.13); e nele se origina e se desenvolve. “Sua vinda unicamente se compreende sobre a base de sua ação milagrosa e todo-poderosa”, afirma Ridderbos.[5]

            Todavia, nem por isso deixamos de orar: “Venha o Teu Reino”. “A vinda do Reino é totalmente independente de nosso poder (…). Porém a vinda do Reino é objeto de nossa oração”, instrui-nos Barth (1886-1968).[6]

            A Obra de Deus iniciada na eternidade será consumada na eternidade:

29 Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. 30 E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou. (Rm 8.29-30).

            O Reino de Deus envolve a redenção cósmica, a consumação definitiva do propósito de Deus na história. A vinda do Reino será o shalom da igreja.[7]

            A nossa salvação se consumará totalmente no “Dia de Cristo”(Fp 1.6,10), quando os mortos ressuscitarão e os vivos serão transformados e, agora, com nossos corpos transformados, adequados à eternidade, estaremos para sempre com o Senhor (Rm 8.11; 1Co 15.20-23; 35-43; 50-58; Fp 3.21).

            Esta alegre certeza me faz lembrar um hino escrito em 1873:

          Altos Louvores

            Vem, ó Jesus, majestoso reinar;

            Teu povo te espera, não queiras tardar!

            Vem em poder, apressando esse dia,

            Pois tua vontade será feita aqui.

            Oh! Volta na glória, trazendo alegria!

            A Igreja suspira, ansiosa, por ti!

            Vem, ó Jesus, majestoso reinar;

            Teu povo te espera, não queiras tardar![8]

Considerando que o Reino já se evidencia na igreja, nós que temos as primícias do Espírito – usufruímos, portanto, ainda que parcialmente, as delícias do Reino –, pelo Espírito, oramos de forma comprometida com o Reino e totalmente dependente do Rei soberano: “Venha o Teu Reino”. “Vem, Senhor Jesus”(Ap 22.17,20). Amém.

Maringá, 29 de abril de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] William Barclay, El Nuevo Testamento Comentado,Buenos Aires: La Aurora, 1973, (Mateo I), v. 1, p. 225.

[2] João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 3, (III.9), p. 124.

[3] A.A. Hoekema, A Bíblia e o Futuro, p. 71.

[4] A.A. Hoekema, A Bíblia e o Futuro, p. 72.

[5]H. Ridderbos, El Pensamiento del Apóstol Pablo, Buenos Aires: La Aurora, 1987, v. 1, p. 43.

[6] K. Barth, La Oración, Buenos Aires: La Aurora, 1968, p. 52. “O reino é de todo obra de Deus, ainda quando opera em e através dos homens” (G.E. Ladd, Reino de Deus: In: E.F. Harrison, ed. Diccionario de Teologia, Michigan: TELL., 1985, p. 450b).

[7] Cf. Cornelius Plantinga Jr., O Crente no Mundo de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 107.

[8] Quarta estrofe do Hino Altos Louvores, nº 46 no Hinário Novo Cântico. Letra de Sarah Poulton Kalley (1825-1907) (1873) e música de compositor inglês Charles Avison (1709-1770), considerado “o mais importante compositor inglês de concertos do século XVIII” (Stanley Sadie, ed., Dicionário Grove de Música: edição concisa, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994, p. 50).

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