Teologia da Evangelização (173)

4.5.7. Viver de modo digno

Paulo relembra aos crentes tessalonicenses como foi o seu comportamento durante o tempo em que passou entre eles pregando o Evangelho, agindo sempre com piedade, justiça e de modo irrepreensível. Agora, em nome do Evangelho pregado, ele os exorta a viverem de modo digno de Deus:

7 Embora pudéssemos, como enviados de Cristo, exigir de vós a nossa manutenção, todavia, nos tornamos carinhosos entre vós, qual ama que acaricia os próprios filhos; 8 assim, querendo-vos muito, estávamos prontos a oferecer-vos não somente o evangelho de Deus, mas, igualmente, a própria vida; por isso que vos tornastes muito amados de nós. 9 Porque, vos recordais, irmãos, do nosso labor e fadiga; e de como, noite e dia labutando para não vivermos à custa de nenhum de vós, vos proclamamos o evangelho de Deus. 10 Vós e Deus sois testemunhas do modo por que piedosa, justa e irrepreensivelmente procedemos em relação a vós outros, que credes. 11 E sabeis, ainda, de que maneira, como pai a seus filhos, a cada um de vós, 12 exortamos, consolamos e admoestamos, para viverdes por modo digno (A)ci/wj)[1]de Deus, que vos chama para o seu reino e glória” (1Ts 2.7-12).

          O sentido primário da palavra grega (a)ci/wj) é de “contrabalança”, aquilo que é de “igual valor”, “equivalente”.[2] A  ideia da palavra é a de estabelecer uma relação de compatibilidade e equilíbrio.

          “Axios é um termo relativo, que compara duas entidades (pessoas ou objetos) por meio de medir a menor em contraste com a maior. Se a menor chega até ao padrão da maior, é digna; senão, é indigna”, explica Tiedtke.[3]

          Nesse sentido, quando o filho pródigo regressa para casa arrependido e diz: “….já não sou digno (a)/cioj) de ser chamado teu filho” (Lc 15.21. Do mesmo modo o verso 19) admite que o seu comportamento não foi compatível com a integridade do seu pai.

          De forma análoga, quando Jesus Cristo afirma que “…. digno (a)/cioj) é o trabalhador do seu salário” (Lc 10.7) (Do mesmo modo, 1Tm 5.18), ele ensina que o salário é proporcional ao serviço feito e que todo trabalho deve ter uma remuneração justa. Quando Paulo instrui que “Fiel é a palavra e digna (a)/cioj) de toda aceitação….” (1Tm 1.15/1Tm 4.9). Declara que a Escritura deve ser crida, porque ela é fidedigna.

          Considerando quem é Deus, Aquele que nos chama para o seu reino e glória, Paulo exorta os tessalonicenses a viverem por modo digno de Deus” (1Ts 2.12). Portanto, quando Paulo roga aos efésios a viverem de modo digno da vocação (Ef 4.1), diz que o seu comportamento deve ser condizente com o chamado de Deus. Essa palavra está associada à dignidade não de qualquer coisa, mas a de Deus, do Evangelho e da nossa vocação. As nossas relações devem ser do mesmo modo, dignas (“como convém”a)ci/wj) (Rm 16.2).

          O Evangelho tem um caráter histórico-salvador e, ao mesmo tempo, tem uma conotação ética, que engloba a vontade de Deus para nós, conforme registrada nas Escrituras, a qual deve ser obedecida (Cf. Ef 4.1; Fp 1.27; Cl 1.10).[4]

          A questão então é: como viver de modo digno dessa vocação?

          A resposta é simples: Sendo autênticos filhos de Deus. Paulo não deseja nada mais do que nos comportemos de acordo com a nossa nova realidade de vida; fomos adotados por Deus (Ef 1.5) e devemos viver como tais. Em outros textos, vemos alguns aspectos do viver compatível com a nossa vocação: Conforme o propósito da vocação de Deus, que envolve a santidade (Rm 1.7; 1Co 1.2;[5] 1Pe 1.15[6]), obedecendo a Deus (Hb 11.8[7]), seguindo o exemplo de Cristo (1Pe 2.21[8]) procurando confirmar a nossa vocação e eleição (2Pe 1.10).

          O Evangelho, uma vez crido, torna-se o nosso paradigma de pensar e agir moral. Desse modo, “obedecer ao Evangelho”, significa receber a Cristo bem como todas as implicações decorrentes deste ato.[9] O nosso padrão de dignidade é o próprio Deus que se manifesta no Evangelho anunciado.

          O Evangelho, portanto, não é algo apenas para ser recebido no início da vida cristã e pronto. Não. Ele deve caracterizar e nortear a nossa vida. O seu poder se torna manifesto em nosso viver.[10]

Maringá, 16 de fevereiro de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] *Rm 16.2; Ef 4.1; Fp 1.27; Cl 1.10; 1Ts 2.12; 3Jo 6.

[2] W. Foerster, a)/cioj: In: G. Friedrich; G. Kittel, eds. Theological Dictionary of the New Testament, v. 1, p. 379.

[3] E. Tiedtke, Retidão: In: Colin Brown, ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, v. 4, p. 212. Ver também: D. Martyn Lloyd-Jones, A Unidade Cristã,São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1994, p. 23.

[4] “Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo digno (a/ci/wj) da vocação a que fostes chamados” (Ef 4.1).“Vivei, acima de tudo, por modo digno (a)ci/wj) do evangelho de Cristo, para que, ou indo ver-vos ou estando ausente, ouça, no tocante a vós outros, que estais firmes em um só espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé evangélica” (Fp 1.27). ”A fim de viverdes de modo digno (a)ci/wj) do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus” (Cl 1.10).

[5] Em ambos os textos, a palavra grega é klhto/j.

[6] kale/w.

[7] kale/w.

[8] kale/w.

[9]Veja-se: P. Blaser, Evangelho: In: Heinrich Fries, dir. Dicionário de Teologia: Conceitos Fundamentais da Teologia Atual, 2. ed. São Paulo: Loyola, 1983, v. 2, p. 157.

[10]Veja-se: D.A. Carson, O que é o evangelho? – revisitado: In:  Sam Storms; Justin Taylor, orgs., John Piper: Ensaios em sua homenagem, São Paulo: Hagnos, 2013,   [p. 177-206], p. 199.

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