Teologia da Evangelização (174)

4.6. Os Frutos do Evangelho

O Espírito por meio do Evangelho produz frutos de vida naqueles que o entendem salvadoramente e o recebem pela fé. O Evangelho, pelo seu efeito regenerador – por obra do Espírito –,  traz uma mudança de perspectiva do tempo e da eternidade. A teologia é eminentemente prática. A compreensão correta da eternidade influencia diretamente o nosso comportamento na vida presente.

          A condição de forasteiros e peregrinos, longe de nos conduzir à indiferença quanto ao tempo presente, nos apresenta com maior clareza a dimensão de urgência de nosso labor em nosso breve tempo nessa vida.

          Paulo escreve com alegria à igreja de Colossos evidenciando como a fé em Cristo, gerada pela Palavra da verdade,[1] trouxe uma nova dimensão de vida aos colossenses, de forma análoga ao que ocorrera em outros lugares:

Damos sempre graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, quando oramos por vós, desde que ouvimos da vossa fé em Cristo Jesus e do amor que tendes para com todos os santos; por causa da esperança que vos está preservada nos céus, da qual antes ouvistes pela palavra da verdade (a)lh/qeia) do evangelho, que chegou até vós; como também, em todo o mundo, está produzindo fruto e crescendo, tal acontece entre vós, desde o dia em que ouvistes e entendestes (e)piginw/skw) a graça de Deus na verdade (a)lh/qeia); segundo fostes instruídos por Epafras, nosso amado conservo e, quanto a vós outros, fiel ministro de Cristo, o qual também nos relatou do vosso amor no Espírito. (Cl 1.3-8) (Vejam-se também: 1Ts 1.8-10; 2.13-14).

          Indiquemos, então, alguns desses frutos:

                    A. Novo Nascimento: “Porque, ainda que tivésseis milhares de preceptores em Cristo, não teríeis, contudo, muitos pais; pois eu, pelo evangelho, vos gerei em Cristo Jesus” (1Co 4.15) (Ver: 1Pe 1.23-25). O Evangelho é o poder operante de Deus por meio do qual Deus nos concede vida. A regeneração não é um ato que se completa em si mesmo, antes, é a operação de Deus que nos conduz ao desenvolvimento espiritual.[2]

          Nascemos crianças para que amadureçamos na fé. Agora, unidos a Cristo, somos alimentados por Ele. A mesma Palavra que pelo Espírito nos gera, também nos alimenta. “Deus é o único Pai no âmbito da fé, porquanto regenera a todos os crentes pela instrumentalidade de sua Palavra e pelo poder de seu Espírito, e é exclusivamente Ele que confere a fé”, interpreta Calvino.[3]

          Se o novo nascimento é obra exclusiva do Espírito, devemos considerar com seriedade que Deus confere a nós a responsabilidade de sermos santos.[4] A chancela divina de nosso novo nascimento é a santificação.

                    B. Paz com Deus:[5] Paz, nas Escrituras, descreve um estado de reconciliação com Deus, sendo mantida por meio de nossa comunhão com Cristo (Jo 16.33; Fp 4.7; 1Pe 5.14). De fato, pelo recebimento pela fé da perfeita obra expiatória de Cristo, Deus está em paz conosco.[6]

          A origem de nossa paz está em Deus; por isso, é totalmente inútil procurar a paz fora dele. Paulo escreve aos romanos: “E o Deus da paz (ei)rh/nh) seja com todos vós” (Rm 15.33); “E o Deus da paz (ei)rh/nh), em breve, esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás….” (Rm 16.20). (Ver: também: 1Co 14.33; Ef 4.3). Barclay (1907-1978) resume bem: “Em última análise, a paz não é algo que o homem alcança – é algo que ele aceita”.[7]

          A graça de Deus concretiza-se em Cristo, por meio de seu sacrifício vicário. Paulo diz que Ele é a nossa paz:

Em Cristo Jesus, vós [gentios], que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo. Porque ele é a nossa paz (ei)rh/nh), o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade, aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz (ei)rh/nh), e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus, por intermédio da cruz, destruindo por ela a inimizade. E, vindo, evangelizou paz (ei)rh/nh) a vós outros que estáveis longe[gentios]e paz  (ei)rh/nh) também aos que estavam perto[judeus]; porque, por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Espírito” (Ef 2.13-18). (Ver: Cl 1.20-22).[8]

          Paulo nos ensina que em Cristo passamos a ter paz com Deus e também com o nosso próximo. Dentro do propósito imediato de Paulo, ele demonstra que os gentios – distantes das promessas de Israel -, e os judeus, agora têm acesso livre a Deus em Cristo, pelo mesmo e único Espírito.

          Notemos que em tudo isso a iniciativa é de Deus:     “Tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo (…). Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo….” (2Co 5.18,19).  

          A paz proveniente de Deus, revelada na obra de Cristo, chega a nós pelo Evangelho. Pedro anunciando o Evangelho na casa de Cornélio, diz:“Esta é a palavra que Deus enviou aos filhos de Israel, anunciando-lhes o evangelho da paz (ei)rh/nh), por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos” (At 10.36).

          O Evangelho é uma mensagem de paz: “Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz (ei)rh/nh) (Ef 6.15).

          Os homens, por estarem em guerra contra Deus, são conclamados a se arrependerem e crerem no Evangelho encontrando a verdadeira paz oferecida por Deus.

          Deus pela justiça de Cristo nos declara justos e, por meio deste ato, temos paz com Deus: “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz (ei)rh/nh) com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (Rm 5.1). “Os homens, pois, só serão bem-aventurados depois que forem gratuitamente reconciliados com Deus e reputados por ele como justos”, conclui Calvino.[9]

Maringá, 17 de fevereiro de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] “E como pregarão, se não forem enviados? Como está escrito: Quão formosos são os pés dos que anunciam coisas boas! Mas nem todos obedeceram ao evangelho; pois Isaías diz: Senhor, quem acreditou na nossa pregação? E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10.15-17).

[2] Veja-se: A.W. Tozer, O Poder de Deus, 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1986, p. 115.

[3] João Calvino, As Pastorais,São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 1.2), p. 27.

[4]Veja-se: John Murray, Redenção: Consumada e Aplicada,  São Paulo: Cultura Cristã, 1993, p. 126.

[5] Para um estudo mais completo sobre o sentido bíblico da paz, veja-se: Hermisten M.P. Costa, A felicidade segundo Deus, Goiânia, GO.: Editora Cruz, 2016.

[6] Veja-se: Francis A. Schaeffer, A Obra Consumada de Cristo: A verdade de Romanos 1-8,  São Paulo, Cultura Cristã, 2003, p. 123.

[7]William Barclay, As Obras da Carne e o Fruto do Espírito,São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 85.

[8]20 E que, havendo feito a paz (* ei)rhnopoie/w) pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus. 21 E a vós outros também que, outrora, éreis estranhos e inimigos no entendimento pelas vossas obras malignas, 22 agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis” (Cl 1.20-22). (* Este verbo só ocorre aqui).

[9]João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 32.1), p. 39.

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