A Pessoa e Obra do Espírito Santo (56)

          4) Rei Eterno

        O nosso Pastor é Rei. O seu reinado não tem mandato ou prazo de validade nem limites geográficos. O nosso pastor é o Senhor que reina eternamente. O seu reinado não se desgasta nem se deteriora. Continua perfeito como Deus o é. A eternidade do reino reflete a glória e o poder eternos do Rei.

    Nessa certeza, os salmistas exultam:

O SENHOR permanece no seu trono eternamente, trono que erigiu para julgar. (Sl 9.7).

O SENHOR é rei eterno. (Sl 10.16).

Reina o SENHOR. (…) Desde a antiguidade, está firme o teu trono; tu és desde a eternidade. (Sl 93.1-2).

Tu, porém, SENHOR, permaneces para sempre, e a memória do teu nome, de geração em geração. (Sl 102.12).

O SENHOR reina para sempre; o teu Deus, ó Sião, reina de geração em geração. Aleluia! (Sl 146.10).

    Os homens, por mais poderosos que sejam, na realidade, estão poderosos em decorrência de alguma posição que ocupam, das riquezas e/ou prestígio que possuem, do sucesso de suas realizações ou até mesmo devido à proximidade com pessoas influentes que, por sua vez, se encaixam em alguma das colocações acima.[1] Entretanto, quando a Bíblia fala do poder soberano de Deus, ela se refere não a um estado determinado por fatores externos, tais como dinheiro, fama, prestígio, etc., mas sim, à sua própria natureza. Deus, como temos dito, é autopoderoso, autoautenticador de tudo que é e faz. Deus não simplesmente está poderoso: Ele é o próprio Poder. Todo o poder emana dele. Por isso, Ele se manifesta poderosamente: “Uma vez falou Deus (~yhil{a/) (elohim), duas vezes ouvi isto: Que o poder pertence a Deus (~yhil{a/)(elohim) (Sl 62.11).

    A Confissão de Fé de Westminster (1647)resume:

Deus tem em si mesmo, e de si mesmo, toda a vida, glória, bondade e bem-aventurança. Ele é todo suficiente em si e para si, pois não precisa das criaturas que trouxe à existência, não deriva delas glória alguma, mas somente manifesta a sua glória nelas, por elas, para elas e sobre elas. Ele é a única origem de todo o ser; dele, por ele e para ele são todas as coisas e sobre elas tem ele soberano domínio para fazer com elas, para elas e sobre elas tudo quanto quiser. (II.2).

    VanGemeren, comentando o Salmo 93.1, exulta:

A exclamação “o Senhor reina”, é uma proclamação do glorioso governo de Yahweh (….). A posição enfática de “o Senhor” no Texto Massorético não deixa ambiguidade na afirmação de que é Yahweh, e nenhuma outra divindade, que reina em glória (Ap 19.6).[2]

    E mais, a declaração do reinado de Deus, não implica “entronização” ou um título apenas simbólico, antes, a sua condição de Rei e o exercício do seu reinado.[3] De fato, Deus reina porque é o Rei absoluto de toda a criação. Ninguém deu a Ele para que lhe seja restituído. (Jó 41.11; Rm 11.33-36).

    Deus é tão eterno quanto o seu poder. Não podemos falar da história de Deus como de um processo evolutivo, aprendendo, crescendo, tornando-se, por exemplo, o que é, antes, falamos da história das manifestações do Senhor na história do homem em seus avanços e retrocessos, cumprindo no tempo o que determinou em sabedoria, amor, justiça e santidade na eternidade.

    O seu reinado, assim como sua existência, não tem início nem fim. Ele sempre foi e será o que é, independentemente de qualquer elemento externo a Ele. Deus é (existe) eternamente por si próprio.[4] “Somente em Deus a existência e a essência são uma coisa só”, resume Bavinck.[5] O Senhor (Yehovah) não se torna algo. Ele é o que é eternamente pelo seu próprio poder. Por isso mesmo, Ele será o que será porque eternamente é o Deus absoluto.

    Charnock (1628-1680) escreveu de forma magistral:

A eternidade é um atributo negativo, e é uma negação de qualquer medida de tempo para Deus, assim como a imensidão é uma negação de quaisquer limites de lugar. Assim como a imensidão é a difusão de sua essência, a eternidade é a duração de sua essência; e quando dizemos que Deus é eterno, excluímos dele todas as possibilidades de começo e fim, todo fluxo e mudança. Como a essência de Deus não pode ser limitada por nenhum lugar, também não pode ser limitada por nenhum tempo: como é sua imensidão estar em toda parte, assim é sua eternidade estar sempre.  (…) Como sua essência abrange todos os seres e os ultrapassa, e sua imensidão supera todos os lugares; assim, sua eternidade compreende todos os tempos, todas as durações e os supera infinitamente.[6]

Conforme vimos, a existência de Deus é autoexistente por sua própria determinação. A vontade de Deus é o fundamento último de todas as coisas. Isto nos basta.[7]

Somente Ele é absoluto e de fato, é o fim de todas as coisas.[8] Por isso que a Bíblia não tenta explicar a existência de Deus; ela parte apenas do fato consumado de que Deus existe, manifestando o seu poder em seus atos criativos (Gn 1.1).

    Deus tem o seu poder em si mesmo e todo poder sobre o seu poder. Nada lhe escapa, é grande demais ou incompreensível a Ele. O Senhor governa sobre todas as coisas com a sua mão poderosa; ninguém o poderá destruir.

    Maringá, 26 de novembro de 2020.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]T. Hobbes, O Leviatã, São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, v. 14), 1974, I.x., p. 57ss, fala sobre algumas formas de poder humano.

[2] Willem A. VanGemeren, Psalms: In: Frank E. Gaebelein, gen. ed. The Expositor’s Bible Commentary, Grand Rapids, MI.: Zondervan, 1991, v. 5, (Sl 93.1), p. 607-608. Veja-se também,  o apêndice do Salmo 5, “Yahweh é rei”, p. 91ss.

[3] Veja-se: K.A. Kitchen, Ancient Orient and Old Testament, Chicago: InterVarsity, 1966, p. 103-104.

[4] Veja-se uma boa discussão sobre isso em R.C. Sproul, Razão para crer, São Paulo: Mundo Cristão, 1986, p. 80-83.

[5]Herman Bavinck, Dogmática Reformada: Deus e a Criação, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 2, p. 246.

[6] Stephen Charnock, The Existence and Attributes of God, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, (Two volumes in one), 1996 (Reprinted),  v. 1, p. 281.

[7] Veja-se: João Calvino, As Institutas, III.23.2.

[8]“Nada, exceto Deus mesmo, é um fim em si mesmo” (John Piper, Pense – A Vida da Mente e o Amor de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2011, p. 41).

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