A Pessoa e Obra do Espírito Santo (449)

6.4.12.1.4. A Sabedoria do Espírito na cotidianidade do povo de Deus (Continuação)

   Em geral, quando nos faltam critérios objetivos, apelamos para o gosto como critério definitivo e solitário. Assim, somos conduzidos simplesmente por princípios que nos agradam sem verificar a sua veracidade. O fim disso pode ser trágico. Assim sendo, por mais autoeloquentes que possam se configurar aspectos da chamada realidade, precisamos examiná-los antes de os tomarmos como pressupostos para a aceitação de outras declarações também reivindicatórias.

Quando nos omitimos deste exame, deste juízo crítico, sem percebermos, estamos contribuindo para que os ensinamentos hoje aceitos inconsistentemente, amanhã se tornem pressupostos que determinarão as nossas escolhas e avaliações.[1]

            As hipóteses de hoje poderão se tornar nas teorias de amanhã e as futuras leis do pensamento e da moral. Neste caso, já estarão acima de qualquer suspeita e discussão: tornaram-se verdade. A ciência é, com frequência, um refinamento das observações cotidianas.[2]

            Como escreveu Pearcey: “A questão importante é o que aceitamos como premissas básicas, pois são elas que moldam tudo o que vem depois”.[3] Há o perigo de, sem nos darmos conta, formar a nossa cosmovisão baseados em um mosaico de peças promíscuas, contraditórias e excludentes.[4]

O homem não é a medida de todas as coisas como queria Protágoras (c. 480-410 a.C.)[5] e os Renascentistas ao revisitarem a sua frase.[6] No entanto, isto não significa a admissão de falta de um referencial, antes, na afirmação de que Jesus Cristo é a medida, o cânon da verdade e, portanto, de toda avaliação que fizermos da realidade que nos circunda.

            Os bereanos tinham um padrão de verdade. Eles criam na sua existência e acessibilidade. Examinaram o que Paulo dizia à luz das Escrituras, ou seja: o Antigo Testamento. Se não tivermos um referencial teórico claro, como poderemos analisar de modo coerente a realidade? Sem referências, tudo é possível dentro de um quadro interpretativo forjado conforme as circunstâncias e meus interesses. Todo absoluto envolve antíteses.

            Talvez, mesmo para nós cristãos, esteja faltando hoje, ainda que não de hoje, um pensamento cristão, uma mente cativa a Cristo que nos propicie o desenvolvimento de uma cosmovisão cristã.[7]

São Paulo, 30 de março de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Veja-se: C.S. Lewis, A Abolição do Homem, São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 5.

[2]Creio ser interessante ler o artigo: Taylor B. Jones, Por que uma visão bíblica da Ciência?: In: John MacArthur, ed. ger., Pense Biblicamente!: recuperando a visão cristã do mundo, São Paulo: Hagnos, 2005, especialmente, p. 337-363.

[3]Nancy Pearcey, Verdade Absoluta: libertando o cristianismo de seu cativeiro cultural, Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2006, p. 44.

[4]Veja-se: Nancy Pearcey, Verdade Absoluta: libertando o cristianismo de seu cativeiro cultural, Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2006, p. 48.

[5]Apud Platão, Teeteto, 152a: In: Teeteto-Crátilo, 2. ed. Belém: Universidade Federal do Pará, 1988, 152a; 160c. Citado também em Platão, Crátilo, 385e. Aristóteles, diz: “O princípio (…) expresso por Protágoras, que afirmava ser o homem a medida de todas as coisas (…) outra coisa não é senão que aquilo que parece a cada um também o é certamente. Mas, se isto é verdade, conclui-se que a mesma cousa é e não é ao mesmo tempo e que é boa e má ao mesmo tempo, e, assim, desta maneira, reúne em si todos os opostos, porque amiúde uma cousa parece bela a uns e feia a outros, e deve valer como medida o que parece a cada um” (Metafísica, XI, 6. 1 062). ***(Para consultar uma edição bilingue, grego-português, veja-se: Aristóteles, Metafísica, São Paulo: Loyola, 2002. Disponível em: https://moodle.ufsc.br/pluginfile.php/1332285/mod_resource/content/1/Aristoteles-Metafisica-Edicoes%20Loyola%20%282002%29.pdf) (Consultado em 28.12.19). Platão diferentemente de Protágoras, entendia que a medida de todas as coisas estava em Deus. “Aos nossos olhos a divindade será ‘a medida de todas as coisas’ no mais alto grau” (Platão, As Leis, Bauru, SP.: EDIPRO, 1999, IV, 716c. p. 189).

[6] “Vivemos em uma cultura que procura nos convencer de que o homem é a medida de todas as coisas ‒ cada um é o próprio capitão de seu destino e o senhor de sua alma” (W. G. Tullian Tchividjian, Fora de Moda, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 44).

[7] “Nossas igrejas estão cheias de pessoas que são espiritualmente nascidas de novo, mas que ainda pensam como não cristãs” (William L. Craig, Apologética Cristã para Questões difíceis da vida, São Paulo: Vida Nova, 2010, p. 14).

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