A Pessoa e Obra do Espírito Santo (377)

3) Fidelidade, perseguição, crescimento e consolo (Continuação)

O mesmo Espírito que forma a Igreja, também a comanda na Evangelização. Deus escolhe, envia e dirige os seus servos na proclamação do Evangelho (At 8.39-40; 13.1-4). Isto o Espírito faz ordinariamente por intermédio da Igreja como instituição, ainda que não exclusivamente.[1]

Seja como for, o meio usado pelo Espírito para dirigir a sua obra missionária é a Palavra de Deus, por isso que “sem o poder do Espírito Santo a evangelização é impossível”, aplica Stott.[2]

Pietismo e Missão

          Quando Frederico IV, rei da Dinamarca (1671-1730) precisou de missionários para enviar aos seus súditos na colônia dinamarquesa de Tranquebar, não encontrando em seu reino quem se dispusesse a fazê-lo, recorreu ao pietista alemão August H. Francke (1663-1727), que lecionava na Universidade de Halle, que indicou a Bartholomew Ziegenbalg (1683-1719) e Henry Plütschau (1677-1747), que partiram da Europa no fim de 1705 e chegaram em Tranquebar (cidade portuária que constava de aproximadamente 15 mil habitantes) no dia 9 de julho de 1706, sendo os dois primeiros missionários não católicos a chegarem na Índia, provenientes da Europa.[3]

          Apesar de não serem bem recebidos pelos colonos dinamarqueses, Ziegenbalg e Plütschau não se intimidaram. Continuaram seus estudos do idioma nativo durante a viagem, tendo Ziegenbalg se destacado pela facilidade em aprender outras línguas.

          Em dez meses de trabalho missionário, receberam os primeiros nativos convertidos. Sendo acusados de incitar os convertidos à rebelião, as autoridades hindus mantiveram Ziegenbalg preso por quatro meses (1707-1708)

          Em 1711, por questões de saúde, Plütschau regressou definitivamente para a Europa. Ziegenbalg continuou o seu trabalho: compilou uma gramática tâmil (1716), escreveu uma obra sobre o hinduísmo, traduziu para o tâmil o Novo Testamento (1714-1715) e o Antigo Testamento até o livro de Rute. Fundou uma escola industrial para meninos e meninas e um seminário constituído de convertidos locais para a preparação de catequistas e também a primeira imprensa evangélica da Ásia (esta com a ajuda financeira da Sociedade Anglicana para a Promoção do Conhecimento Cristão, que enviou uma máquina impressora e um tipógrafo).[4]

          O primeiro pastor não-Europeu ordenado em todo o mundo, foi um discípulo de Ziengenbalg, o indiano, filho de um próspero comerciante, Rev. Aaron Samuel Aarumuga Pillai (c. 1699-1745) em 1718.[5]

          Com a mudança de governo local (1716) Ziegenbalg teve maior tranquilidade para trabalhar. A sua tradução do Novo Testamente  e a igreja que construiu  (1718) ainda permanecem em uso.

          Quando Ziegenbalg morreu em 1719, existia em Tranquebar uma comunidade luterana de cerca de 350 pessoas, em sua grande maioria de convertidos locais.[6] De fato, o Espírito dirigiu os seus servos para aquele país.

Simonton e sua missão

          Ashbel Green Simonton (1833-1867), missionário presbiteriano no Brasil, sentiu-se chamado para o campo missionário, quando ainda iniciava os seus estudos teológicos no Seminário de Princeton. O instrumento que o Espírito usou para este despertar missionário, foi Charles Hodge (1797-1878) – um dos maiores teólogos do século XIX – por intermédio de um sermão proferido no Seminário.[7] Este despertamento foi amadurecendo em seu coração gradativamente.[8] No dia 25 de novembro de 1858, Simonton finalmente formalizou a sua proposta à Junta de Missões Estrangeiras mencionando o Brasil como o campo de seu interesse. Ele conclui o registro no seu Diário, dizendo: “A Ti, Ó Deus, confio meus caminhos na certeza de que o Senhor dirigirá meus passos retamente”.[9]

          A Junta respondeu afirmativamente o seu pedido na primeira quinzena de dezembro.[10] Simonton desembarcou no Brasil em 12/8/1859. Em oito anos de trabalho,[11] ajudado posteriormente por A.L. Blackford (chegou em 25/7/1860), e o Rev. José Manoel da Conceição (padre convertido do catolicismo e ordenado pastor em 17/12/1865), entre outros, Simonton deixou um jornal com tiragem quinzenal, A Imprensa Evangélica, (primeiro número publicado em 05/11/1864), um Seminário no Rio de Janeiro com quatro alunos (organizado em 14/5/1867) e um Presbitério (Presbitério do Rio de Janeiro, organizado em 16/12/1865), constituído por três igrejas: Rio de Janeiro (organizada em 12/01/1862);  São Paulo (organizada em 5/3/1865); e  Brotas, (organizada em 13/11/1865).

          O Espírito dirigiu retamente os passos de Simonton, de Blackford, de Schneider, de Conceição, de Chamberlain e de tantos outros. Nós somos herdeiros desta gloriosa manifestação do Espírito.

          Aplicando o que estamos dizendo, devemos entender que a igreja local deve receber o seu pastor como alguém que o Espírito enviou para pastoreá-la (At 20.28), tendo sempre como elemento norteador, a Escritura Sagrada.

          Não podemos também nos esquecer de que o Espírito dirige a todos nós na proclamação do Evangelho, enviando-nos aos nossos familiares, parentes, amigos e vizinhos. O Sacerdócio Universal dos Crentes, obtido por Cristo, por intermédio de quem temos livre acesso a Deus (Jo 14.6; 1Tm 2.5; Hb 10.19-25), torna-nos também responsáveis pelo testemunho da mensagem redentora de Cristo (1Pe 2.9).

          Kuiper comenta: “A igreja é uma realeza de sacerdotes, um sacerdócio de reis. E cada sacerdote e rei tem o dever de proclamar as excelências do seu Salvador. (…) Cada cristão é um agente da evangelização, ordenado por Deus”.[12]

Maringá, 15 de janeiro de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] Vejam-se: R.B. Kuiper, El Cuerpo Glorioso de Cristo,p. 220ss.; R.B. Kuiper, Evangelização Teocêntrica,p. 100, 151-152.

[2] John R.W. Stott, Crer é também Pensar,São Paulo: ABU., 1984 (2. impressão), p. 49.

[3]Cf. Stephen Neill,História das Missões, São Paulo: Vida Nova, 1989, p. 233-234. Em meados do século XVII, João Ferreira de Almeida (1628-1691) havia trabalhado em Málaca (c. 1642-1651) e no Ceilão (1656-1663). (Ver: J.L. Swellengrebel, João Ferreira de Almeida, Um Tradutor Português da Bíblia em Java,2. ed. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1984).

[4]Quanto ao surgimento, objetivo e influência desta sociedade, Veja-se: Richard P. Heitzenrater, Wesley e o povo chamado Metodista,São Bernardo do Campo, SP.; Rio de Janeiro: Editeo; Pastoral Bennett, 1996, p. 21ss.

[5] Veja-se: Rowena Robinson, ed. Sociology of Religion in India, New Delhi: Sage Publications, 2004, p. 228, nota 3.

[6] Vejam-se: S. Neill, História das Missões, p. 233ss.; K.S. Latourette, A History of the Expansion of Christianity, New York: Harpers & Brothers, 1939, v. 3, p. 278-279; Paul Pierson, O Pietismo: In:Revista Teológica, Campinas, SP.: Dez/1962, nº 30, p. 96.

[7]A.G. Simonton, Diário (1852-1867),São Paulo: CEP; O Semeador, 1982, 14/10/1855.

[8] Vejam-se, Diário, 20/01/1856; 04/02/1856; 10/10/1857.

[9] Diário, 27/11/1858.

[10] Cf. Diário, 13/12/1858.

[11] Durante este período de 8 anos, Simonton passou fora do Brasil cerca de quinze meses.

[12] R.B. Kuiper, Evangelização Teocêntrica, p. 97-98.

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