A Pessoa e Obra do Espírito Santo (138)

7.3. A remissão pela graça de Cristo

O sangue é o símbolo, o sinal, a garantia, a segurança e o selo do concerto da graça para você. Ele pode ser considerado um telescópio através do qual cada um consegue ver as distâncias espirituais. Com seu olho natural ninguém pode ver sua eleição, mas através do sangue de Cristo pode enxergá-la com nítida clareza. Ponha sua confiança no sangue, pobre pecador, e chegará a descobrir que o sangue do pacto eterno constitui uma prova de que você é um herdeiro do céu. – C.H. Spurgeon. [1]

               Como temos enfatizado, em Deus a graça não se opõe à justiça, antes se concretiza em atos de justiça. Como a santidade permeia todo o ser de Deus, não existe contradição intrínseca e, também em suas expressões. A base de nosso perdão é a obra expiatória de Cristo, coroada com a sua ressurreição (Lc 24.45-47; Rm 4.25; 1Co 15.17; 2Co 5.15). [2] Aqui vemos graça e justiça.

   O perdão de nossos pecados ampara-se no sacrifício remidor de Cristo. O perdão para a “menor” de nossas ofensas custou a Cristo a sua oferta voluntária em nosso favor, envolvendo todos os Seus sofrimentos e morte na cruz. Sem a obra de Cristo não haveria perdão para nós.      

   As Escrituras insistem neste ponto:

No qual (Jesus) temos a redenção pelo seu sangue, a remissão dos pecados segundo a riqueza da sua graça. (Ef 1.7).
Antes sede uns para com os outros benignos, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Cristo vos perdoou. (Ef 4.32).
Sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus. (Rm 3.24).

   O perdão concedido por Deus é em nome de Cristo (At 10.43/Cl 1.14/1 Jo 2.12). (Vejam-se também: Mt 26.28; Jo 1.29; At 5.31; 18.38).

   Mesmo no Antigo Testamento, os patriarcas, os profetas e o povo em geral foram perdoados, não porque ofereceram sacrifícios, mas sim, pela fé no Cristo que viria. A obra de Cristo envolve todos os crentes: todos os fiéis do passado, presente e futuro. [3]  “A única maneira de alguém ser perdoado, antes de Cristo, depois de Cristo e em qualquer ocasião, é através de Cristo, e este crucificado”, enfatiza Lloyd-Jones.[4]

   A eficácia da obra de cristo envolve todo o seu povo, ninguém ficará de fora nem jamais houve ou haverá redenção fora do sacrifício único e vicário de Cristo: a obra de Cristo é completa e suficiente.

   Calvino explica a necessidade de expiação e a obra completa e eficaz de Cristo:

Em cada época, desde o princípio, houve pecados que necessitavam de expiação. Portanto, a menos que o sacrifício de Cristo fosse eficaz, nenhum dos [antigos] pais haveria obtido a salvação. Visto que se achavam sujeitos à ira divina, qualquer remédio para livrá-los teria resultado em nada, se Cristo, ao sofrer uma vez por todas, não sofresse o suficiente para reconciliar os homens com a graça de Deus, desde o princípio do mundo e até ao fim. A não ser que desejemos muitas mortes, contentemo-nos com um só sacrifício. (…) Não está no poder do homem inventar sacrifícios como lhe apraz. Eis aqui uma verdade expressa pelo Espírito Santo, a saber: que os pecados não são expiados por um sacrifício, a menos que haja derramamento de sangue. Por conseguinte, a ideia de que Cristo é sacrificado muitas vezes não passa de uma invenção diabólica. [5]

   O que poderia parecer um fracasso, foi, na realidade, a consecução do propósito santo, perfeito e amoroso de Deus. Paulo, surpreendentemente nos diz que o triunfo de Cristo em nos perdoar, concedendo-nos vida, foi manifesto na cruz do Calvário:

E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões, e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; e, despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz. (Cl 2.13-15).

   Nunca é demais insistir no ponto de que o perdão que nos vem pela graça, custou um alto preço para o nosso Salvador: o Seu precioso sangue. A graça é o benefício das obras de Cristo. “….Sem derramamento de sangue não há remissão” (Hb 9.22). “….O sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado” (1Jo 1.7). Por isso, já não há condenação para todos aqueles que estão em Cristo (Rm 8.1). O perdão está associado de forma dependente à autoentrega graciosa de Deus em Cristo (Rm 8.32/2Co 5.21).

   O perdão não torna Deus indiferente ao pecado, nem revela uma frouxidão ou atenuação no padrão de Deus (Ex 34.6-7); mas, sim, o Seu amor ativo em Cristo que teve como trajetória eternamente definida a cruz, o sacrifício. Por isso, Paulo diz: “Deus prova o seu próprio amor para conosco, pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm 5.8). “O perdão é obra exclusiva de Deus, é dom de Deus”. [6]

   Jesus Cristo, nosso Mediador, cumpriu de forma cabal e vicária as demandas da Lei em favor do Seu povo. [7]  Se a Obra de Cristo não fosse plenamente satisfeita, não haveria “bênção” alguma a ser aplicada (Jo 17.4; 19.30; Hb 9.23-28; 1Pe 3.18).

   7.4. Libertação presente e futura

             Ainda que o Novo Testamento apresente também um sentido futuro para a nossa redenção, indicando a sua consumação (Lc 21.28; Rm 8.23; Ef 1.14; 4.30/Fp 3.21), o fato, é que a nossa libertação é efetuada já, no presente (Ef 1.7; Cl 1.14). (Voltaremos a tratar deste ponto).

Maringá, 21 de março de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]C.H. Spurgeon,  Sermões no Ano do Avivamento, São Paulo, Publicações Evangélicas Selecionadas, 1994, p. 59-60.

[2] “Então, lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras; e lhes disse: Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia e que em seu nome se pregasse arrependimento para remissão de pecados a todas as nações, começando de Jerusalém” (Lc 24.45-47). “O qual foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação” (Rm 4.25). “E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados” (1Co 15.17). “E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou” (2Co 5.15).

[3] “Quando o Filho de Deus sofreu e morreu, Ele assim expiou os pecados de todos os que o aceitaram ou iriam aceitá-lo por meio de uma fé viva, ou seja, por todos os crentes de ambas as dispensações. Os méritos da cruz estendem-se tanto para trás como para adiante” (W. Hendriksen, Romanos, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, (Rm 3.25-26), p. 178).

[4] D. Martyn Lloyd-Jones, Estudos no Sermão do Monte, São Paulo: FIEL., 1984, p. 359. “Ninguém pode dizer, nem por um momento, que pessoas como Davi, Abraão, Isaque e Jacó não foram perdoadas. Mas não o foram por causa daqueles sacrifícios que ofereceram. Eles foram perdoados porque olhavam para Cristo. Não percebiam isso claramente, mas criam no ensinamento e faziam essas ofertas pela fé. Criam na Palavra de Deus, que Ele um dia no porvir, proveria um sacrifício, e pela fé se mantiveram firmes nisso. Foi a fé em Cristo que os salvou, exatamente como é a fé em Cristo que salva agora” (D.M. Lloyd-Jones, A Cruz: A Justificação de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, (s.d.), p. 9-10).

[5] João Calvino, Exposição de Hebreus, São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 9.26), p. 245-246. “A razão pela qual Deus ordenara que se oferecessem vítimas como expressão de ações de graça foi, como é bem notório, para ensinar ao povo que seus louvores eram contaminados pelo pecado, e que necessitavam de ser santificados exteriormente. Por mais que proponhamos a nós mesmos louvar o nome de Deus, outra coisa não fazemos senão profaná-lo com nossos lábios impuros, não houvera Cristo se oferecido em sacrifício com o propósito de santificar a nós e às nossas atividades sagradas [Hb 10.7]. É através dele, como aprendemos do apóstolo, que nossos louvores são aceitos” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Edições Parakletos, 1999, v. 2, (Sl 66.15), p. 631).

[6] G. Aulén, A Fé Cristã, São Paulo: ASTE, 1965, p. 258.

[7]Vejam-se: Confissão de Westminster, (1647), VIII.1,5,8; Catecismo Maior de Westminster, Questões: 36, 37 e 59; J. Calvino, As Institutas, II.17.1ss.

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