Uma oração intercessória pela Igreja (129)

                            8.5.1. Vocaciona e confere autoridade aos seus ministros

É somente pela vocação divina que os ministros da Igreja se tornam legalmente efetivados. Quem quer que se apresente sem ser convidado, seja qual for a erudição ou eloquência que o mesmo possua, esse não recebe autoridade alguma, porquanto não veio da parte de Deus. − João Calvino.[1]

Quando escolhemos os líderes de nossa igreja, estamos simplesmente reconhecendo o chamado e os dons do Senhor. − Timothy Keller.[2]

Seja qual for a autoridade que eu possa ter como pregador, não é resultado de qualquer decisão da minha parte. Foi a mão de Deus que me tomou, me tirou e me separou para esta obra. Sou o que sou pela graça de Deus; e a Ele dou toda a glória − D.M. Lloyd-Jones.[3]

           Retomo aqui um assunto já tratado de forma mais abreviada. Uma das formas pelas quais Deus se vale para cuidar de sua Igreja, é vocacionando e habilitando seus pastores para, por meio deles, alimentar e cuidar de seu rebanho.

            Deus como Sumo Pastor de suas ovelhas (Hb 13.20; 1Pe 2.25; 5.4), vocaciona e prepara seus pastores-auxiliares para a condução de seu povo. É o Espírito, em sua vocação, quem legitima a existência da presbíteros no Novo Testamento (At 20.28).

            Calvino comentando Is 48.16 − “Chegai-vos a mim e ouvi isto: não falei em segredo desde o princípio; desde o tempo em que isso vem acontecendo, tenho estado lá. Agora, o SENHOR Deus me enviou a mim e o seu Espírito” −, escreve:

À luz desta passagem, aprendemos também que os que não possuem esta diretriz do Espírito, muito embora se gabem de haver sido enviados por Deus, devem ser rejeitados; tais como aquelas catervas papais de lobos que se gloriam no título de pastores e professores, e impudentemente se gabam de sua missão, muito embora sejam totalmente opostos ao Espírito de Deus e à Sua doutrina. Em vão se gabam de haverem sido enviados ou autorizados por Deus, quando não se acham adornados com os dons do Espírito, os quais são necessários para a execução de tal ofício. Pretextar possuir a inspiração do Espírito, enquanto são inteiramente destituídos de fé, e não possuir sequer a mínima fagulha de doutrina é excessivamente nauseante. Suponhamos uma assembleia de bispos mitrados, cuja maioria seja notória por sua ignorância, e entre trezentos dos quais raramente se achará dez que possuam moderada participação nos rudimentos da piedade; que poderia ser mais néscio do que tal assembleia gabar-se de ser governada por “o Espírito”?[4]

        Da mesma forma, estudando Is 61.1 − “O Espírito do SENHOR Deus está sobre mim, porque o SENHOR me ungiu para pregar boas-novas aos quebrantados, enviou-me a curar os quebrantados de coração, a proclamar libertação aos cativos e a pôr em liberdade os algemados” −, comenta:

O Profeta não reivindica para si mesmo o direito e autoridade para ensinar, antes de mostrar que o Senhor “o enviou”. A autoridade se baseia em ele ter sido “ungido”, isto é, equipado por Deus com os dons necessários. Não devemos ouvi-lo, portanto, como um indivíduo particular, mas como um ministro público que veio do céu.[5]

            Portanto, a vocação ministerial é para o serviço, não para o domínio (1Pe 5.1-2). Lucas descreve de forma sucinta e reverente a vocação do Apóstolo Paulo e a comissão de Ananias:

15 Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este é para mim um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de Israel; 16 pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome. 17 Então, Ananias foi e, entrando na casa, impôs sobre ele as mãos, dizendo: Saulo, irmão, o Senhor me enviou, a saber, o próprio Jesus que te apareceu no caminho por onde vinhas, para que recuperes a vista e fiques cheio do Espírito Santo. (At 9.15-17).

            Mais tarde, Paulo pôde escrever a Timóteo: “Sou grato para com aquele que me fortaleceu, Cristo Jesus, nosso Senhor, que me considerou fiel, designando-me para o ministério” (1Tm 1.12).

            No seu chamado, Paulo reconhecia a autoridade apostólica conferida pelo Senhor para a edificação da Igreja: “Porque, se eu me gloriar um pouco mais a respeito da nossa autoridade, a qual o Senhor nos conferiu para edificação e não para destruição vossa, não me envergonharei” (2Co 10.8/2Co 13.10;1Co 5.1-5).

            Calvino acentuou a responsabilidade do presbítero. Entende que Deus se dignou em consagrar a si mesmo “as bocas e línguas dos homens, para que neles faça ressoar própria voz”.[6] Desse modo, os pastores não estão a seu próprio serviço, mas de Cristo; “são ministros de Cristo que servem à sua igreja”.[7] A igreja é a razão da existência desses ofícios (1Co 3.22; Ef 4.12). Eles buscam discípulos para Cristo, não seguidores para suas ideias e concepções pessoais.

            Calvino mais uma vez nos instrui:

A fé não admite glorificação senão exclusivamente em Cristo. Segue-se que aqueles que exaltam excessivamente a homens, os privam de sua genuína grandeza. Pois a coisa mais importante de todas é que eles são ministros da fé, ou seja: conquistam seguidores, sim, mas não para eles mesmos, e, sim, para Cristo.[8]

Maringá, 19 de agosto de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]João Calvino, O Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 1.31), p. 71.

[2] Timothy Keller, Igreja centrada, São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 409.

[3] D.M. Lloyd-Jones, O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 90.

[4] John Calvin, Commentary on the Book of the Prophet Isaiah,Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, (Calvin’s Commentaries), 1996,v. 8/3, p. 484-485.

[5]John Calvin, Commentary on the Book of the Prophet Isaiah,Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, (Calvin’s Commentaries), 1996,v. 8/4, p. 304.

[6]João Calvino, As Institutas, IV.1.5.

[7] Herman Bavinck, Dogmática Reformada − Espírito Santo, Igreja e nova criação, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 332.

[8]João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 3.5), p. 101-102.

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