Teologia da Evangelização (69)

f. “Venha o Teu Reino”            

A Igreja anela pela concretização plena das virtudes eternas, das quais ela já tem a amostra (Rm 14.17; 15.13; 1Ts 1.6/Gl 5.22,23). É neste espírito que a Igreja ora: “Venha o Teu Reino”. Quem ora pela vinda do Reino, é porque já o conhece, já usufrui das suas riquezas, já provou da sua bem-aventurança (Rm 14.17).[1]

Somente um cidadão do Reino pode dizer de forma consciente: “Venha o teu Reino”. Por isso, ele ora para que o Reino já presente venha em toda a sua plenitude sobre todos. Como temos visto, o selo e o penhor não têm um fim em si mesmos, antes apontam para o nosso resgate definitivo (Ef 1.13-14).

O Evangelho, como “palavra da verdade”, modifica a nossa vida neste estado de existência e, também, tem implicações escatológicas. Pelo Evangelho ouvido e crido, temos a certeza da nossa salvação. É o Espírito Santo quem nos garante isso. Algo maravilhoso para nós é saber que temos um Deus que cuida de nós, que se compromete com a salvação de seu povo, nos garantindo e nos concedendo esta certeza.

          A consumação do Reino se dará quando Cristo voltar. Nós que temos as primícias do Espírito, – usufruímos, portanto, ainda que parcialmente, as delícias do Reino –, pelo Espírito, oramos de forma coerente e ardorosa: “Venha o Teu Reino”.[2] “Vem, Senhor Jesus”(Ap 22.17,20). Amém.

          Esta alegre certeza me faz lembrar um hino escrito em 1873:

    Altos Louvores

          Vem, ó Jesus, majestoso reinar;

          Teu povo te espera, não queiras tardar!

          Vem em poder, apressando esse dia,

          Pois tua vontade será feita aqui.

          Oh! Volta na glória, trazendo alegria!

          A Igreja suspira, ansiosa, por ti!

          Vem, ó Jesus, majestoso reinar;

          Teu povo te espera, não queiras tardar![3]

g. “Dia de Cristo”

A Obra de Deus iniciada na eternidade será consumada na eternidade:

29 Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos.  30 E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou. (Rm 8.29-30).

O Reino de Deus envolve a redenção cósmica, a consumação definitiva do propósito de Deus na história. A vinda do Reino será o shalom da igreja.[4]

          A nossa salvação se consumará totalmente no “Dia de Cristo”(Fp 1.6,10), quando os mortos ressuscitarão e os vivos serão transformados e, agora, com nossos corpos transformados, adequados à eternidade, estaremos para sempre com o Senhor (Rm 8.11; 1Co 15.20-23; 35-43; 50-58; Fp 3.21).

h. A Salvação eterna

A salvação é uma obra exclusiva de Deus (At 15.11; Rm 6.23; Ef 2.5,8; 2Tm 1.9; Tt 2.11).

          A nossa salvação é decorrente primeiramente da vontade Soberana de Deus (Mt 19.23-36; Hb 7.25; Tg 4.12). Deus age por meio da sua poderosa Palavra (Rm 1.16; 9.16-18; 10.17; 1Co 1.18), conduzindo-nos a Cristo (Jo 6.44,65), confessando-O como nosso Senhor (1Co 12.3). Deus mesmo concede-nos a certeza de que fomos salvos pelo poder da Sua Graça (Jo 10.27-29); confirmando (Rm 16.25-27),[5] selando (Ef 1.13; 4.30), edificando (At 20.32), santificando (2Ts 2.13) e preservando-nos (Jd 24,25) até à conclusão do Seu propósito em nós: A salvação eterna para a Glória de Deus (Fp 1.6; 2Ts 1.11,12; 1Pe 1.3,5; 2Pe 1.3).

Como igreja, seremos o troféu de Cristo por toda a eternidade. Somos o resultado de sua obra salvadora. Por isso, quando Ele vier, será glorificado em nós (Ef 1.5,6; 2.7/Jo 17.10; 2Ts 1,10,12). “Na eternidade, olharemos para nós mesmos e diremos: ‘Eis aqui a prova de que Deus é bondoso – Ele me salvou!’ Seremos os troféus na galeria dos troféus de Deus”, exulta Wells.[6]

Considerações pontuais

          Na prática ninguém evangeliza sem a convicção do soberano poder transformador de Deus. Se não fosse assim, não teria sentido orar pedindo que Deus aplique a sua Palavra, que transforme aquele coração, que lhe dê discernimento, etc. Assim fazemos, porque sabemos que em primeira e última instância, a salvação pertence a Deus.

          A certeza de que Deus é o Senhor da Salvação e, que a Ele pertence o poder para nos salvar conforme o seu decreto eterno[7] deve nortear e direcionar todo o nosso pensar e agir evangélico.[8] A salvação é uma prerrogativa única e exclusiva de Deus: Ele tem poder e total liberdade para salvar a quem quiser. A Palavra diz que a salvação pertence a Deus (Hb 2.10; 5.9; Tg 4.12; Ap 7.10; 19.1).[9] De fato, Deus é quem salva conforme o seu propósito gracioso revelado nas Escrituras Sagradas.

          Quando evangelizamos, estamos certos do poder soberano de Deus, que age nos eleitos, criando fé por meio da sua Palavra que nos concede vida. Contudo, como crerão e invocarão o nome do Senhor, se não conhecerem o Evangelho? (Rm 10.9-15).[10] A Soberania de Deus é uma determinante da evangelização!

          Packer, ressaltando a importância da convicção da Soberania de Deus no ministério evangélico, diz:

(A) fé fervorosa na soberania absoluta de Deus (…) não somente fortalece a evangelização, como sustenta o evangelista, criando uma esperança de êxito que, de outro modo, não poderia ser realidade; e igualmente nos ensina a ligar a pregação à oração, tornando-nos ousados e confiantes perante os homens, ao mesmo tempo que nos torna humildes e persistentes perante Deus.[11] (Vejam-se: Jo 15.5; 16.33; 1Co 15.57-58; Fp 4.13).

Maringá, 17 de setembro de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Esta é a experiência da Igreja: Ela é na presente era a manifestação do Reino: “A igreja é o centro vivo e ardente do reino, uma testemunha de sua presença e poder, e um precursor de sua vinda final” (Enrique Stob, Reflexiones Éticas: Ensayos sobre temas morales,Grand Rapids, Michigan: T.E.L.L., 1982, p. 68).

[2]“Nós estamos no Reino e, mesmo assim, aguardamos sua manifestação completa; nós compartilhamos de suas bênçãos, mas ainda aguardamos sua vitória total; nós agradecemos a Deus por ter-nos trazido para o Reino do Filho que Ele ama, e ainda assim continuamos a orar: ‘Venha o teu reino’.” (A.A. Hoekema, A Bíblia e o Futuro, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1989, p. 72).

[3] Quarta estrofe do Hino Altos Louvores, nº 46 no Hinário Novo Cântico. Letra de Sarah Poulton Kalley (1825-1907) (1873) e música de compositor inglês Charles Avison (1709-1770), considerado “o mais importante compositor inglês de concertos do século XVIII” (Stanley Sadie, ed. Dicionário Grove de Música: edição concisa, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994, p. 50).

[4] Cf. Cornelius Plantinga Jr., O Crente no Mundo de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 107.

[5]Calvino comentando o texto de Rm 16.25, diz que Paulo ensina aqui a perseverança final. “E para que descansem (os romanos) e se apoiem neste poder, indica que ele nos foi assegurado pelo evangelho. Por isso não só nos promete a graça presente, ou seja, atual, senão também nos dá a certeza de uma graça eterna. Pois Deus nos anuncia que não somente é nosso Pai agora, senão para sempre, e o que é mais ainda, sua adoção sobrepassa a morte porque nos conduz à herança eterna” (J. Calvino, La Epistola Del Apostol Pablo A Los Romanos,Grand Rapids, Michigan: Subcomision Literatura Cristiana de la Iglesia Cristiana Reformada, 1977, p. 393).

[6] Tom Wells, Fé: Dom de Deus,São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1985, p. 100. John MacArthur Jr. usa figura semelhante em seu instrutivo e desafiador livro: Chaves para o Crescimento Espiritual, 2. ed. São José dos Campos, SP.: FIEL, 1986, p. 47.

[7]Vejam-se: A.W. Pink, Deus é Soberano, p. 24, 49ss.; Idem., Os Atributos de Deus, p. 31-36; Loraine Boettner, La Predestinación, p. 26ss; 259; J. I. Packer, Evangelização e Soberania de Deus, 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1990, p. 11-15; Confissão de Westminster, (1647), IX.3; VI.4; VII.1.

[8]Veja-se: J.I. Packer, Evangelização e Soberania de Deus, p. 22-23.

[9]“Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as coisas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse, por meio de sofrimentos, o Autor da salvação deles (Hb 2.10). “E, tendo sido aperfeiçoado, tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem(Hb 5.9). “Um só é Legislador e Juiz, aquele que pode salvar e fazer perecer….” (Tg 4.12). “E clamavam em grande voz, dizendo: Ao nosso Deus, que se assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação (Ap 7.10). “Depois destas coisas, ouvi no céu uma como grande voz de numerosa multidão, dizendo: Aleluia! A salvação, e a glória, e o poder são do nosso Deus (Ap 19.1). (Destaques meus).

[10]“Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Porque com o coração se crê para justiça e com a boca se confessa a respeito da salvação. Porquanto a Escritura diz: Todo aquele que nele crê não será confundido. Pois não há distinção entre judeu e grego, uma vez que o mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam. Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Como, porém, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados? Como está escrito: Quão formosos são os pés dos que anunciam coisas boas!” (Rm 10.9-15).

[11]J.I. Packer, Evangelização e Soberania de Deus, 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1990, p. 84-85. Veja-se, também, Ibidem, p. 66-67; 74-75; J.I. Packer, Vocábulos de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 121). R.B. Kuiper, Evangelização Teocêntrica, p. 50-51. “Quando Paulo pregava o Evangelho, ele sabia que a verdade da eleição divina não era nenhum empecilho para o amplo alcance de sua mensagem. Em vez disso, ele via a graça soberana como uma garantia do seu bom êxito” (Steven J. Lawson, Fundamentos da Graça: 1.400 a.C. -100 d.C: longa linha de vultos piedosos,  São José dos Campos, SP.: Editora Fiel,  2012, v. 1, p. 671). À frente: “A verdade da eleição divina garante o bom êxito do avanço da igreja” (p. 674).

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