Introdução ao Estudo dos Credos e Confissões (32) – A Igreja Presbiteriana do Brasil e os Símbolos de Fé (5)

 

Criação do “Seminário Primitivo”

Seminário Primitivo do Rio de Janeiro

No dia 14 de maio de 1867 foi organizado o Seminário do Rio de Janeiro, num sobrado no Campo de Sant’Anna, 49.[1]

O Seminário funcionava em um dos andares do edifício alugado pela Missão, que visava concentrar ali todo o trabalho Presbiteriano do Rio de Janeiro. O prédio dispunha de três andares; a parte térrea era uma fábrica de cerveja. [2] Os três andares alugados, eram assim distribuídos: no primeiro, funcionava a Igreja, com um auditório para mais de 400 pessoas. Atrás do salão de culto, funcionava numa sala o depósito de tratados evangélicos e, no salão dos fundos, a escola paroquial frequentada por mais de 70 alunos[3] dirigida pela organista da Igreja, D. Gervásia Neves, esposa de Sanctos Neves.

 

No segundo andar ficava o Seminário propriamente dito: alojamento e sala de aula. No terceiro, residia o poeta Sanctos Neves, chamado por Themudo Lessa, de “o cisne presbiteriano”[4] e, sua esposa.

 

Os professores do Seminário eram três: Rev. A.G. Simonton, que ensinava Teologia; Rev. Charles Wagner, pastor luterano (que desejava transferir-se para a nossa denominação com o apoio do Rev. Blackford),[5] lecionava Grego e História Eclesiástica e o Rev. F.J.C. Schneider, Ciências e Matemática.

 

Notamos aqui a ausência do estudo da língua hebraica. Mais tarde, no exame com vistas à Licenciatura os alunos desse Seminário serão dispensados do exame desta língua por não a terem podido estudar. Esta foi a coerente decisão do Presbitério do Rio de Janeiro.[6]

 

Os primeiros alunos do Seminário, que mais tarde viriam a ser peças fundamentais no Ministério nacional, foram:

 

1) Antonio Bandeira Trajano (1843-1921), português, naturalizado brasileiro, professou a sua fé e foi batizado na organização da Igreja Presbiteriana de São Paulo (5/3/1865). Foi um profícuo colportor de bíblias e literatura evangélica. Licenciado em 22/08/1870, designado para os campos das Igrejas de Brotas, Jacutinga e Rio Novo. Foi ordenado ao Ministério em 10/8/1875 na 11ª Reunião do Presbitério do Rio de Janeiro, realizada em Rio Claro.[7] Foi empossado como pastor da Igreja de Brotas em 03/10/1875.[8]

 

2) Modesto Perestrello Barros de Carvalhosa (1846-1917), português, professou a sua fé e foi batizado na Igreja Presbiteriana de São Paulo em 25/03/1866, sendo o celebrante o Rev. A.L. Blackford (1829-1900). Acompanhou diversas vezes o Rev. José Manoel da Conceição em suas viagens. Foi licenciado em 22/08/1870, designado para a Igreja de Lorena; ordenado em 20/07/1871.[9]

 

3) Miguel Gonçalves Torres: (1849-1892), português, professou a sua fé e foi batizado na mesma ocasião de Trajano, em 5/3/1865. Viajou por diversas cidades de Minas com o Rev. José Manoel da Conceição (1867). Durante o seu curso no Seminário sofreu bastante com a tuberculose que contraíra. Quando concluiu seus estudos ministeriais foi encaminhado pelo médico para Caldas, em Minas Gerais, onde o clima e a altitude ajudariam no tratamento de sua enfermidade. Creio que a sua licenciatura foi retardada devido à sua saúde, que era precária. Isso se torna ainda mais evidente pelo fato de Miguel Torres ter chegado a Caldas transportado numa liteira.[10]

A sua licenciatura ocorreu em 19/07/1871,[11] sendo designado para o campo de Caldas (chamada depois de Parreiras[12] e, novamente Caldas) e outras cidades de Minas. Ordenado ao Ministério juntamente com Trajano em 10/8/1875 na Reunião do Presbitério do Rio de Janeiro em Rio Claro.[13] Assumiu as Igrejas de Caldas, Machado e Borda da Mata.

 

4) Antonio Pedro de Cerqueira Leite (1845-1883), o único brasileiro da turma. Era natural de São João do Morro Azul,[14] interior de São Paulo. Recebeu também boa influência do então Pe. José Manoel da Conceição, visto que ainda na adolescência o tinha como seu professor de latim. Professou a sua fé e foi batizado em 30 de dezembro de 1866, na Igreja Presbiteriana de São Paulo. Simonton estava presente. 

 

Cerqueira Leite que fizera um intenso trabalho de colportagem, só ingressou no Seminário no dia 8/3/1868, quase um ano depois do início das aulas (14/05/1867). Nesse período ele não chegou a concluir o seu curso teológico, voltando em 1870 para Brotas.[15] Em 1872, persuadido pela Srª Chamberlain, voltou aos estudos em São Paulo, sendo primeiramente recebido como candidato ao Ministério pelo Presbitério do Rio de Janeiro, reunido em São Paulo (30/12/1872).

 

A manutenção do Seminário foi difícil. No ano de sua criação Simonton veio a falecer (09/12/1867). No Natal de 1867, o Rev. Blackford (aluno de W.S. Plumer (1802-1880) que também estudara em Princeton e, possivelmente foi aluno de C. Hodge)[16] vem de São Paulo para o Rio, a fim de substitui-lo. O Rev. Wagner foi para a Suíça, aonde viria a falecer. Permaneceu apenas Blackford e Schneider. Com a formatura em 1870, o Rev. Schneider vai para São Paulo e depois para a Bahia, a fim de “estabelecer uma missão na cidade da Bahia”. Lá chegou em 9/2/1871. As portas do Seminário se fecham. As tarefas eram gigantescas.

 

A capa de Simonton foi herdada por Blackford.[17] Mas, como dissera Simonton à sua irmã uns três dias antes de falecer: “Deus levantará outro para por no meu lugar. Ele fará Sua própria obra com Seus próprios instrumentos. (…) Devemos apenas nos recostar nos braços Eternos e estar sossegados”.[18]

 

O Senhor continuou cuidando da igreja levantando novos futuros ministros. Os candidatos ao Ministério passaram a estudar sob o sistema de tutela.

 

Cerqueira Leite, foi novamente recebido como candidato ao Ministério pelo Presbitério do Rio de Janeiro, reunido em São Paulo, na sessão de 30/12/1872. Estudou sob a tutela dos Revs. G.W. Chamberlain (1839-1902) e Emmanuel Vanorden (1839-1917).[19] Em 10/08/1873, Cerqueira Leite foi licenciado. Ordenado em 08/08/1876. Foi designado para o campo de Sorocaba, indo até Faxina (Itapeva), onde foi organizada igreja sob o seu pastorado em 04/05/1879.[20]

 

 

Maringá, 15 de janeiro de 2018.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

 


 

[1]O Campo de Sant’Anna foi renumerado. O edifício passou a ter o nº 39 e, também mudou de nome, passando a se chamar Praça da Acclamação e depois, até os nossos dias, Praça da República. (Vejam-se: Rev. Antonio Trajano, Esboço Histórico da Egreja Evangelica Presbyteriana: In: Álvaro Reis, ed. Almanak Historico do O Puritano, p. 16, 64; Júlio A. Ferreira, História da Igreja Presbiteriana do Brasil, v. 1, p. 85; J.A. Ferreira, Galeria Evangélica, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1952, p. 59; Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 111; Boanerges Ribeiro, Protestantismo e Cultura Brasileira, p. 258).

[2]Álvaro Reis, ed. Almanak Historico do O Puritano, p. 87.

[3]Cf. Rev. Antonio Trajano, Esboço Histórico da Egreja Evangelica Presbyteriana: In: Álvaro Reis, ed. Almanak Historico do O Puritano, p. 16.

[4]Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 118.

[5]Ver: Relatório de Blackford apresentado ao Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 18/08/1869. In: Coleção Carvalhosa Relatórios Pastorais, 1866-1875 (Fonte manuscrita) e Atas do Presbitério do Rio de Janeiro. (Original manuscrito).

[6] Atas do Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 20/08/1870.

[7]Atas do Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 10/08/1875.

[8] Livro de Atas da Igreja Evangélica Presbiteriana de Brotas, Livro I, Ata nº 79, p. 57. (Fonte manuscrita).

[9]Atas do Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 20/07/1871.

[10]Cf. Júlio A. Ferreira, História da Igreja Presbiteriana do Brasil, v. 1, p. 133.

[11]Atas do Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 19/07/1871.

[12]Cf. Júlio Andrade Ferreira, O Apóstolo de Caldas, Franca, SP.: Edição da Gráfica Renascença, (s.d.), p. 209.

[13]Torres e Trajano foram ordenados juntos. (Atas do Presbitério do Rio de Janeiro, Sessão de 10/08/1875).

[14]Ele foi para o Seminário proveniente de Brotas, todavia nasceu em São João de Morro Azul, comarca de Limeira, São Paulo. (Cf. Eduardo C. Pereira, Rev. Antonio Pedro de Cerqueira Leite: In: O Estandarte, 4 e 11/01/1912, p. 17).

[15]Cerqueira Leite já enfrentava problemas acadêmicos e sentimentais, acabou por não mais resistir ao Seminário em 1870. O episódio que culminou com a sua saída, é contado por Eduardo C. Pereira, no referido artigo d’O Estandarte: “Reunira-se um vasto auditório para ouvir os candidatos ao ministério. Antonio Pedro galga a tribuna. Prepara um esplêndido discurso, decora, e era natural que esperasse no auditório o bom efeito de seu esforço.

“Entretanto, em extremo nervoso, embarga-se-lhe a voz ao começar, fogem-lhe as idéias. Força lhe pedir desculpas e descer da tribuna. Firme, porém, no seu posto, passa a dirigir o canto de seus alunos.

“Terminada a reunião, desaparece, e, dias depois, surge em Brotas resolvido a abandonar os seus estudos” (O Estandarte, 4 e 11/01/1912, p. 25).

[16]Plumer estudou no Seminário de Princeton (1826) sendo licenciado em 1826 e ordenado em 1827. Ele foi professor no Seminário Western desde 1854/1855 até 1866, quando foi lecionar no Seminário Columbia. (Veja-se: Moses D. Hoge, William Swan Plumer: in: Philip Schaff, ed. A Religious Encyclopaedia: or Dictionary of Biblical, Historical, Doctrinal, and Practical Theology, Chicago: Funk Wagnalls, Publishers, 1887 (Revised Edition), v. 3, p. 1855-1856). A.A. Hodge  (1823-1886), também aluno de Princeton (1843) foi quem sucedeu a Plumer no Seminário Western. A.A. Hodge em 1877 foi lecionar no Seminário de Princeton como assistente de seu pai C. Hodge (Veja-se: Boanerges Ribeiro, Igreja Evangélica e República Brasileira (1889-1930), São Paulo: O Semeador, 1991, p. 202-203). (Ver em especial a sua obra: William S. Plumer, Psalms, Carlisle, Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1978 (Reprinted). Esta obra foi publicada originalmente em 1867.

[17]   Após a morte de Simonton, Blackford registrou no seu Diário:

“Sua  capa  caiu  sobre  os meus ombros e tenho de ocupar o seu  lugar.  Não  espero  fazer  o que ele fazia. Queira Deus conceder-me  a  graça  de  substituí-lo  para a glória do seu próprio nome” (Journal Record, São Paulo, 10/12/1867, Apud Carl  J. Hahn, História do Culto Protestante no Brasil, p.167).

[18]Joseph  M. Wilson, The Presbyterian Historical Almanack, 1868, v. 10, In: Coleção Boanerges Ribeiro, p. 6-7. (Coleção de textos transcritos de documentos americanos pelo Rev. Boanerges Ribeiro, assim denominada pelo Rev. Júlio Andrade Ferreira).

[19]Cf. Vicente T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 101; Boanerges Ribeiro, A Igreja Presbiteriana no Brasil, Da Autonomia ao Cisma, São Paulo:O Semeador, 1987, p. 211; Boanerges Ribeiro, Protestantismo e Cultura Brasileira, p. 262; O Estandarte, 4 e 11/01/1912, p. 26.

[20]Ele visitou a cidade de Faxina pela primeira vez em outubro de 1875 e, novamente em abril de 1877 (Cf. Álvaro Reis, ed. Almanak Historico do O Puritano, p. 66-67. A Igreja de Faxina foi organizada por ele em 4/5/1879 com três membros: José Rodrigues de Carvalho, Antonio Borges Paks e Agueda Maria da Conceição. (Veja-se: V. T. Lessa, Annaes da 1ª Egreja Presbyteriana de São Paulo, p. 169).

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