Diáconos e Presbíteros: Servos de Deus no Corpo de Cristo (40)

 

Deus, descrevendo a insensibilidade espiritual de Judá, diz: “O meu povo está louco, já não me conhece; são filhos néscios, e não entendidos; são sábios para o mal, e não sabem fazer o bem” (Jr 4.22).

 

A sabedoria cristã é o oposto disso; ela se dispõe a ajudar, socorrer, edificar. O seu planejamento é para o bem, nunca para o mal.

 

Judá estava tão distante de Deus que desaprendera a fazer o bem, os seus pensamentos eram ligeiros, ágeis para o mal. No entanto, o desafio de Deus para nós é para que nos exercitemos na prática do que é justo. E quanto ao mal? Que sejamos puros quanto a ele, não tendo ideias para executá-lo. No entanto, quando nos desafiarem a fazer o bem, que sejamos argutos, prontos, tendo uma visão perspicaz e penetrante. Até para fazer o bem precisamos ter discernimento. Há, por exemplo, um tipo de assistencialismo que longe de ajudar, cria um espírito de dependência que não se configura como ajuda. Ser sábio para o bem não significa conceder tudo o que nos pede, mas, saber administrar com discernimento os recursos disponíveis, de forma criativa e fraterna visando uma contribuição individual e social. Assim, Deus será glorificado.

 

Portanto, devemos utilizar a inteligência que Deus nos deu, para edificar, construir, socorrer, nunca para destruir, lucrar desonestamente: isto seria esperteza, que nada tem a ver com o Cristianismo e a pureza que deve caracterizar os filhos de Deus.

 

Deus, por intermédio da Sua Palavra, nos dá sabedoria espiritual e discernimento para que possamos reconhecer nos seus testemunhos a Palavra de vida eterna, a fim de que vejamos com clareza os sinais dos tempos, sem nos deixar levar por falsas doutrinas engenhosamente criadas pelos homens, seguindo, assim, sabiamente o caminho de Deus.

 

Um exemplo prático desta sabedoria está na orientação de Paulo no que se refere, ainda que não exclusivamente, à evangelização. Devemos aproveitar as oportunidades, falando com graça e com o sal que Deus nos deu, fruto de nossa transformação espiritual e evidência de nosso discipulado,[1] para que não sejamos insípidos: 5Portai-vos (peripate/w) com sabedoria (sofi/a) para com os que são de fora; aproveitai as oportunidades (kairo/j). 6A vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal [com graça e integridade], para saberdes como deveis responder a cada um” (Cl 4.5-6).

 

A oração de Paulo é no sentido de que Deus, pelo Espírito, nos dê sabedoria, nos conduzindo à maturidade espiritual (1Co 2.6) para que entendamos a sua revelação em Jesus Cristo mediante o conhecimento intenso de sua Pessoa. Somente pela Sabedoria do Espírito (1Co 2.6-16),[2] tendo como padrão a cruz de Cristo, podemos avaliar toda a realidade, envolvendo a grandeza e a miséria, a sabedoria e a loucura, e, o que de fato é relevante.

 

A sabedoria do Espírito nos concede discernimento e um critério absoluto para enxergar todas as coisas. Dizendo de outro modo, Paulo roga a Deus para que os efésios fossem cheios do Espírito Santo.

 

A profundidade da sabedoria de Deus revelada na Criação e em seus atos (Rm 11.33-36) não é para ser alvo de especulações, antes, de contemplação adoradora e de nossa vivência na história como povo de Deus.

 

Sem o Espírito de sabedoria jamais entenderíamos as maravilhas do Evangelho que consistem no conhecimento não de uma doutrina, mas de uma Pessoa (Jo 17.3).[3]

 

Aqui nesta oração temos uma súplica retroalimentadora: pela sabedoria concedida por Deus podemos entender a revelação. Na compreensão progressiva desta revelação vamos adquirindo, por graça, maior sabedoria. O conhecimento de Deus não se esgota. Devemos prosseguir e nos desenvolver neste conhecimento.

 

Esta oração se torna concreta em nós na medida em que sinceramente desejamos a sabedoria do alto. A nossa súplica sincera por sabedoria (Tg 1.5)[4] deve vir acompanhada pela leitura e meditação da Escritura.

 

O Senhor nos dá compreensão, nos faz ter entendimento de toda a realidade. O real não é uma mera utopia, antes, é acessível e, portanto, conhecível. Se não tivéssemos acesso à realidade, seria, por exemplo, impossível escrever história e, da mesma forma, estudá-la. Qual seria o sentido disso além de um exame psicológico do historiador?[5]

 

Não vivemos num mundo de imagens, mas, de realidade, por mais desagradável que essa possa se configurar a nós em determinadas circunstâncias. No entanto, precisamos refletir a respeito. Não basta ler, é preciso refletir. O que me faz pensar que o caminho para a compreensão das coisas é um pensar intenso, humilde e submisso a Deus. Nem sempre as coisas se mostram a nós de forma clara e evidente. Precisamos pensar a respeito. O pensar e o repensar podem fazer parte de um processo cognitivo abençoador de considerar, compreender e viver de acordo com o propósito de Deus.

 

Esta sabedoria espiritual exige um laborioso processo de compreensão, entendimento e prática da verdade. Portanto, a nossa sabedoria consiste em nos submeter às Escrituras.

 

Martinho Lutero (1483-1546) constatou acertadamente: “Quão grande dano tem havido quando se tenta ser sábio e interessante sem ou acima da Escritura”.[6]

 

Paulo instrui à Igreja para que a Palavra de Cristo habite, se assenhoreie de nosso coração, nos dirigindo em nossa mútua instrução, com sabedoria, louvor e gratidão: Habite (e)noike/w),[7]  ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria (sofi/a), louvando a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração” (Cl 3.16).

 

Os efésios eram crentes operantes em Cristo. Paulo ora no sentido de seu contínuo crescimento pela graça. Crescer na graça não significa crescer simplesmente em uma esfera de nossa existência, mas, em todas elas. Crescer na graça significa crescer em maturidade tendo como modelo perfeito o próprio Cristo, cuja mente é o nosso padrão.

 

Maringá, 09 de agosto de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Confira esta série completa aqui


[1]“Bom é o sal; mas, se o sal vier a tornar-se insípido, como lhe restaurar o sabor? Tende sal em vós mesmos e paz uns com os outros” (Mc 9.50/Mt 5.13).

[2]6 Entretanto, expomos sabedoria entre os experimentados; não, porém, a sabedoria deste século, nem a dos poderosos desta época, que se reduzem a nada; 7 mas falamos a sabedoria de Deus em mistério, outrora oculta, a qual Deus preordenou desde a eternidade para a nossa glória; 8 sabedoria essa que nenhum dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivessem conhecido, jamais teriam crucificado o Senhor da glória; 9 mas, como está escrito: Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam. 10 Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus. 11 Porque qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito, que nele está? Assim, também as coisas de Deus, ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus. 12 Ora, nós não temos recebido o espírito do mundo, e sim o Espírito que vem de Deus, para que conheçamos o que por Deus nos foi dado gratuitamente. 13 Disto também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais. 14 Ora, o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. 15 Porém o homem espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por ninguém. 16 Pois quem conheceu a mente do Senhor, que o possa instruir? Nós, porém, temos a mente de Cristo” (1Co 2.6-16).

[3]“E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (Jo 17.3).

[4]Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida” (Tg 1.5).

[5] Sei que a narrativa histórica não é objetiva e que o historiador é fundamental no diálogo com os “fatos”. Para uma abordagem mais detalhada sobre o assunto, veja-se: Hermisten M. P. Costa, Introdução à metodologia das ciências teológicas, Goiânia, GO.: Editora Cruz, 2015, p. 155-208.

[6]Lutero, Apud Phillip J. Spener, Mudança para o Futuro: Pia Desideria, Curitiba, PR.; São Bernardo do Campo, SP.: Encontrão Editora; Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, 1996, p. 43.

[7] *Rm 7.17; 8.11; 2Co 6.16; Cl 3.16; 2Tm 1.5,14.

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