Teologia da Evangelização (48)

Anotações pontuais sobre a justificação pela graça

A doutrina da justificação pela fé como um dos pilares da Reforma,[1] estabelece o caminho bíblico entre sacerdotalismo (fé mais obras), a anomia (justificados na eternidade e, portanto, já salvos pela graça, estamos livres para fazer o que bem entendermos), o legalismo (salvos pela observância da lei) e o galacianismo (salvos pela graça vivemos pela lei).

          A visão Reformada aponta para o fato de nossa total incapacidade de nos salvar a nós mesmos. Ao mesmo tempo, enfatiza a livre graça de Deus que providencia a salvação para o seu povo. A salvação, portanto, está condicionada à fé em Cristo Jesus, recebendo os seus merecimentos, sendo transformados por Deus e, deste modo, declarados justos aos olhos de Deus.[2]

          A justificação descortina diante de nós o caminho da glorificação. O Deus que nos justifica é o mesmo que nos glorificará (Rm 8.30). “A justificação é coroada com a glorificação”.[3]

          Sem a compreensão adequada da doutrina da justificação pela fé, não há Evangelho a ser anunciado.[4] Só há Evangelho se de fato houver a Boa Nova da perfeita justiça de Cristo que é-nos imputada pela graça. O Evangelho tem como uma de suas principais características, o anúncio da justificação pela fé.[5]

          Para nós Reformados, a justificação é o ato que faz parte do início de um processo que se iniciou na eternidade (eleição) e se consumará na eternidade (glorificação).[6] A justificação no tempo é real porque foi estabelecida por Deus na eternidade.[7]

          Cristo, com o seu próprio sangue, reconciliou-nos com Deus, sendo assunto aos céus, como nosso eterno e perfeito Mediador.[8]

          Calvino faz um resumo magnífico de nosso privilégio em Cristo e, de nossa responsabilidade:

Assim, resta que, estando todos despidos de toda a ajuda das suas obras, são justificados pela fé somente. Pois bem, explicamos que essa justiça deve ser assim entendida: O pecador, tendo sido recebido à comunhão de Cristo, é reconciliado com Deus, por Sua graça; porquanto, tendo sido purificado por Seu sangue, obtém a remissão dos seus pecados; revestido então da justiça de Cristo, como da sua própria, pode subsistir diante do tribunal de Deus. Consumada a remissão dos pecados, as obras que se seguem não são avaliadas pelo que elas são, mas por um critério alheio a elas. Porque tudo o que é imperfeito é coberto pela perfeição de Cristo; tudo o que é impureza e mancha é lavado e purificado por Sua pureza, para não ser levado em conta. Depois que a culpa das transgressões é assim apagada e eliminada, o que impedia os homens de produzirem algo que agradasse a Deus, e, também, depois que os vícios e imperfeições que maculavam suas boas obras são soterrados, então sim as boas obras praticadas pelos crentes são consideradas justas, o que vale dizer, são imputadas para justiça.[9]

          Louvemos, portanto, ao Senhor:

O Grande Amor de Deus.[10]

1. A Deus demos glória, por seu grande amor,

  O Filho bendito por nós todos deu,

  E graça concede ao mais vil pecador,

  Abrindo-lhe a porta de entrada no céu.

Exultai! Exultai! Vinde todos louvar

A Jesus, Salvador, a Jesus, Redentor!

A Deus demos glória, porquanto do céu

Seu Filho bendito por nós todos deu!

2. Oh, graça real! Foi assim que Jesus,

  Morrendo, Seu sangue por nós derramou.

  Herança nos céus, com os santos em luz,

  Legou-nos Aquele que o preço pagou.

3. Tal prova de amor nos persuade a confiar

  Nos merecimentos do Filho de Deus!

  E quem, a Jesus, pela fé se entregar,

  Vai vê-lo na glória eterna dos céus.

     (F.J. Crosby – J. Jones)

Maringá, 21 de agosto de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] “A justificação foi a doutrina que acendeu a Reforma” (John F. MacArthur, Jr., Muito Antes de Lutero: Jesus e a Doutrina da Justificação: In: John F. MacArthur, Jr., et. al., A Marca da Vitalidade Espiritual da Igreja: Justificação pela Fé Somente,São Paulo: Editora Cultura Cristã, (2000), p. 15).

[2] “A visão reformada da justificação forense se fundamenta no princípio de que pela imputação da justiça de Cristo o pecador é agora feito formalmente, mas não materialmente, justo aos olhos de Deus” (R.C. Sproul, Justificação pela Fé Somente: a natureza forense da justificação: In: John F. MacArthur, Jr., et. al., A Marca da Vitalidade Espiritual da Igreja: Justificação pela Fé Somente,São Paulo: Editora Cultura Cristã, (2000), p. 33).

[3] Thomas Watson, A Fé Cristã, estudos baseados no breve catecismo de Westminster, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 265.

[4]“Um entendimento correto sobre a justificação pela fé constitui o fundamento do Evangelho” (John F. MacArthur, Jr., Muito Antes de Lutero: Jesus e a Doutrina da Justificação: In: John F. MacArthur, Jr., et. al., A Marca da Vitalidade Espiritual da Igreja: Justificação pela Fé Somente,São Paulo: Editora Cultura Cristã, (2000), p. 24).

[5]“As igrejas e denominações que se firmam em sola fide permanecem evangélicas. Aquelas dispostas a ceder nesse ponto inevitavelmente se rendem ao liberalismo, revertem ao sacerdotalismo ou adotam formas até piores de apostasia. O evangelicalismo histórico, portanto, sempre encarou a justificação pela fé como sendo uma doutrina central – se não aquela doutrina mais importante a ser bem compreendida. Não foge à verdade definir os evangélicos como sendo os que creem na justificação somente pela fé” (John F. MacArthur, Jr., Muito Antes de Lutero: Jesus e a Doutrina da Justificação: In: John F. MacArthur, Jr., et. al., A Marca da Vitalidade Espiritual da Igreja: Justificação pela Fé Somente, São Paulo: Editora Cultura Cristã, (2000), p. 11).

[6]Veja-se, conforme já citado: Confissão de Westminster,XI.4. “A justificação é o ponto de convergência de um vastíssimo princípio e de um vastíssimo fim. É o ponto em que se encontram duas eternidades: a do passado e a do futuro” (T. Austin Sparks, O Evangelho Segundo o Apóstolo Paulo, [s. cidade]: [s. editora], [s. data], p. 11).

[7] Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 219.

[8]Veja-se João Calvino, Exposição de Hebreus,(Hb 10.22), p. 268.

[9] João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2, (II.6), p. 246-247.

[10] Hino nº 42 do Hinário Novo Cântico, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1991.

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