Teologia da Evangelização (183)

5.2. A Pregação é responsabilidade e privilégio de todo o cristão (Continuação)

                            j) Integridade e dignidade

                               O evangelho exige um compromisso ético com a nossa mensagem. A grandeza transformadora e radiante do evangelho deve ser visível em nosso comportamento.

O evangelho é o poder de Deus que transforma o homem todo, bem como todas as suas relações. Daí a exortação paulina: “Vivei, acima de tudo, por modo digno (a)ci/wj) do evangelho de Cristo….” (Fp 1.27). (Ver: 1Ts 2.8-10/1Co 9.27).

                            k) Trabalho árduo e desinteresse financeiro

    Paulo pergunta aos coríntios: “Cometi eu, porventura, algum pecado pelo fato de viver humildemente, para que fôsseis vós exaltados, visto que gratuitamente (dwrea//n) [1] vos anunciei o evangelho de Deus?” (2Co 11.7).

            Anteriormente ele trouxera à memória dos tessalonicenses a lembrança do seu labor, de como se esforçara por pregar o evangelho sem depender financeiramente daqueles irmãos:

Embora pudéssemos, como enviados de Cristo, exigir de vós a nossa manutenção, todavia, nos tornamos carinhosos entre vós, qual ama que acaricia os próprios filhos; assim, querendo-vos muito, estávamos prontos a oferecer-vos não somente o evangelho de Deus, mas, igualmente, a própria vida; por isso que vos tornastes muito amados de nós. Porque, vos recordais, irmãos, do nosso labor (ko/poj) [2] e fadiga (mo/xqoj); [3]e de como, noite e dia labutando para não vivermos à custa de nenhum de vós, vos proclamamos o evangelho de Deus. (1Ts 2.7-9).[4]

            No entanto, Paulo não se esquecera das palavras de Jesus Cristo aos seus discípulos – “Não vos provereis de ouro, nem de prata, nem de cobre nos vossos cintos; nem de alforje para o caminho, nem de duas túnicas, nem de sandálias, nem de bordão; porque digno é o trabalhador do seu alimento” (Mt 10.9-10) -, por isso escreve: “Assim ordenou também o Senhor aos que pregam o evangelho que vivam do evangelho” (1Co 9.14).

            Na despedida dos presbíteros de Éfeso, relembra:

33De ninguém cobicei prata, nem ouro, nem vestes; 34vós mesmos sabeis que estas mãos serviram para o que me era necessário a mim e aos que estavam comigo. 35 Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando (kopia/w) assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus: Mais bem-aventurado é dar que receber. (At 20.33-35).

            O trabalho de Paulo era desinteressado no que se refere ao enriquecimento. A sua ambição era anunciar o evangelho de forma eficiente e completa. Ele não cobiçou de ninguém prata nem ouro. Contrastando com isso, diz que trabalhou arduamente.

          A densidade deste trabalho, ainda que ele não especifique o aspecto material do mesmo, é deduzida do texto pelas tentações produzidas pelos inimigos do evangelho, que criavam dificuldades para a pregação e, mesmo, expondo Paulo a todo tipo de males físicos, morais e espirituais, o que lhe causava grande dor: “Servindo ao Senhor com toda a humildade, lágrimas e provações que, pelas ciladas dos judeus, me sobrevieram” (At 20.19).

          Mas, ele não se intimidava:

20 jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa, 21 testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. 22 E, agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, 23 senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações. 24 Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus. (At 20.20-24).

Os judeus de modo especial não davam trégua a Paulo; estavam sempre tentando destruir o seu trabalho e preparando armadilhas para matá-lo (At 14.19-20; 20.3; 21.30-32; 23.12-15). No entanto, ele continuava fazendo o seu serviço sem esmorecer. Ele foi chamado por Deus. As igrejas espalhadas pelas cidades onde passou eram um atestado de sua vocação e fidelidade ao Senhor.

 Outro ponto que evidencia a integridade ética do apóstolo, era a intensidade do trabalho e o seu significativo amor para com o rebanho que o Senhor lhe confiara, e que, por vezes, lhe causava tristeza e apreensões por verificar determinados problemas na comunidade e antever dificuldades futuras:

29 Eu sei que, depois da minha partida, entre vós penetrarão lobos vorazes, que não pouparão o rebanho. 30 E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens falando coisas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles. 31 Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um.32 Agora, pois, encomendo-vos ao Senhor e à palavra da sua graça, que tem poder para vos edificar e dar herança entre todos os que são santificados. (At 20.29-32).[5]

            O escritor de Hebreus, indicando a respeitabilidade de seus presbíteros pelo trabalho que realizam, os instrui:

Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam (a)grupne/w) (= vigiar, permanecer alerta, estar acordado) por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros. (Hb 13.17).

O velar pela alma, indica a responsabilidade destes homens pela igreja, revelando o seu cuidado espiritual para com as ovelhas que, dentro do contexto, estavam sendo assoladas por doutrinas estranhas (Hb 13.7-9).[6]

Os ministros deverão prestar contas não simplesmente ao Conselho, à assembleia ou ao Presbitério por meio de seu relatório, mas, a Deus que os vocacionou.

Maringá, 04 de março de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] Tem também o sentido de “graciosamente”, “livremente”, “de graça”, “como presente”.

[2]Kopo/j tem o sentido de “aflição”, “dificuldade”, “trabalho”, “labuta”. Paulo é quem mais utiliza esta palavra para se referir ao seu ministério (2Co 6.4-5; 11.23,27). Paulo também relembra aos irmãos que quando teve de partir de Tessalônica devido a perseguição que se moveu contra ele, manteve-se preocupado com a Igreja. Assim, tendo enviado a Silas e Timóteo para verificar o estado da Igreja, aguardou-os num primeiro momento em Atenas: “Foi por isso que, já não me sendo possível continuar esperando, mandei indagar o estado da vossa fé, temendo que o Tentador vos provasse, e se tornasse inútil o nosso labor (ko/poj) (1Ts 3.5). Escrevendo aos Romanos, Paulo destaca algumas irmãs que se exauriam no trabalho de Deus: “Saudai a Maria que muito trabalhou (kopia/w) por vós” (Rm 16.6); “Saudai a Trifena e a Trifosa, as quais trabalhavam (kopia/w) no Senhor. Saudai a estimada Pérside que também muito trabalhou (kopia/w) no Senhor” (Rm 16.12).

            Ao Anjo da Igreja de Éfeso, o Senhor diz: “Conheço as tuas obras, tanto o teu labor (ko/poj) como a tua perseverança….” (Ap 2.2).

            Na visão do Apocalipse, João registra a palavra vinda do céu: “Escreve: Bem-aventurados os mortos que, desde agora, morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem das suas fadigas (ko/poj), pois as suas obras (e)/rgon) os acompanham” (Ap 14.13). Para um estudo mais completo da palavra no Novo Testamento, veja-se: Hermisten M.P. Costa, Introdução à Cosmovisão Reformada, Goiânia, GO.: Cruz, 2016.

[3] *2Co 11.7; 1Ts 2.9; 2Ts 3.8. A palavra refere-se às dores decorrentes de um trabalho árduo, levado quase à exaustão.

[4] Sobre o aspecto do trabalho árduo de Paulo, ver: 1Ts 2.9/2Ts 3.8; At 20.35; 1Co 4.12; 15.10.

[5] Rm 9.2; 2Co 2.4; Fp 3.18.

[6]7 Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram.  8 Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre.  9 Não vos deixeis envolver por doutrinas várias e estranhas, porquanto o que vale é estar o coração confirmado com graça e não com alimentos, pois nunca tiveram proveito os que com isto se preocuparam” (Hb 13.7-9).

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