Teologia da Evangelização (179)

        

5.1. Não negligenciar a manifestação profética  (Continuação)

Um nobre ceticismo cristão

Jesus Cristo exorta de forma severa seus ouvintes: “Eu vim em nome de meu Pai, e não me recebeis (lamba/nw); se outro vier em seu próprio nome, certamente, o recebereis (lamba/nw). Como podeis crer, vós os que aceitais (lamba/nw) glória uns dos outros e, contudo, não procurais a glória que vem do Deus único?”(Jo 5.43-44).

            Não há problema algum em acreditarmos no que nos dizem. Sem dúvida, de acordo com as implicações disso e do que teremos que fazer a partir daí, é necessário maior cautela. A questão levantada por Jesus é que os seus ouvintes não se preocupavam com a essência do que foi dito, as evidências e, a sua procedência, mas, se lhes era agradável aos olhos e ouvidos.

            O exame crítico é  costumeiramente desejável. Muitas vezes nos aprofundamos na compreensão de um conceito porque exercitamos, como foi mencionado, um justo ceticismo cristão. A partir dessa compreensão, podemos avaliar o quão importante foi-nos dito e, também, a loucura do que quiseram nos fazer passar por verdade.

Todavia, um problema comum a nós, é que tendemos a avaliar criticamente −  quando o fazemos −, apenas o que não apreciamos de imediato. O que nos soa agradável aos olhos e ouvidos, não carece de verificação. Confundimos exame crítico com má vontade e, interesse pelo que foi dito, com simplicidade acéfala.[1]

            Ouvidos e olhos vaidosos são péssimos conselheiros. Devemos permanecer alertas no uso adequado do que Deus nos confiou, conforme constata no livro de Jó:  “Porque o ouvido prova (!x;B’) (bahan) (examina, testa prova) as palavras, como o paladar, a comida” (Jó 34.3/Jo 12.11).

            No texto, Jesus Cristo recrimina seus ouvintes, porque eles apreciavam a momentânea, enganosa e transitória glória de homens, rejeitando a genuína e imarcescível glória que provém de Deus.  Em síntese, eles não amavam a Deus nem criam nas Escrituras (Jo 5.47).

            A palavra de Cristo não lhes parecia gloriosa porque não vinha com as cores e os sons que desejavam naquele momento. A mensagem de Cristo não era um novo evangelho, mas, um convite a um exame criterioso das Escrituras, onde encontrariam a vida eterna por meio dele, para quem toda ela apontava. Como nos chama atenção Hendriksen (1900-1982), o problema não foi falta de evidências, mas, falta de amor. (Jo 5.31-40).[2]

            No entanto, eles, ao longo da história seriam enganados. (At 5.36-37).[3] E assim continuará para aqueles que rejeitam o testemunho de Cristo, sendo seduzidos por satanás, o grande enganador. Satanás  como imitador de Deus,[4] procura realizar obras semelhantes às de Deus a fim de confundir os homens. Durante o tempo que lhe é permitido, tem sido bastante bem-sucedido (2Ts 2.8-10).[5]    

            Glória futura? Quem quer saber disso, quando estamos saudáveis e temos aparentemente tudo sob controle? Quando a nossa glória se limita a essa vida, o Reino celestial é mera utopia que empurramos para um lugar e tempo distantes do nosso agora, com seus afazeres tão urgentes. Por isso, inclusive, os judeus rejeitaram a mensagem do Senhor da Glória (Jo 1.11-12/1Co 2.8).

             Ele fez-se pobre por amor do seu povo: “Pois conheceis a graça de nosso Senhor (ku/rioj) Jesus Cristo, que, sendo rico (plou/sioj), se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos (ploute\w) (2Co 8.9).

Maringá, 20 de fevereiro de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]“Minha resposta a esta questão é que a doutrina de Deus não está sujeita ao juízo humano, senão que a tarefa do homem é simplesmente julgar, por meio do Espírito de Deus, se é sua Palavra que está sendo declarada, ou se, usando esta como pretexto, os homens estão erroneamente exibindo o que eles mesmos engendraram” (João Calvino, Exposição de 1 Coríntios,São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 14.29), p. 432).

[2] “A falta de amor sempre provoca cegueira. Não foi a falta de evidências, mas a falta de amor, que levou esses homens a rejeitarem a Cristo” (William Hendriksen, O Evangelho de João, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004, (Jo 5.44), p. 279).

[3]36 Porque, antes destes dias, se levantou Teudas, insinuando ser ele alguma coisa, ao qual se agregaram cerca de quatrocentos homens; mas ele foi morto, e todos quantos lhe prestavam obediência se dispersaram e deram em nada.  37 Depois desse, levantou-se Judas, o galileu, nos dias do recenseamento, e levou muitos consigo; também este pereceu, e todos quantos lhe obedeciam foram disperses” (At 5.36-37).

[4] “Não me passa despercebido que Satanás é em muitos aspectos um imitador de Deus, a fim de, mediante enganosa similaridade, melhor insinuar-se à mente dos símplices” (J. Calvino,  As Institutas, I.8.2). “Satanás pode imitar muitos dos dons do Espírito Santo” (D.M. Lloyd-Jones, Salvos desde a Eternidade,  São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2005 (Certeza Espiritual: v. 1), p. 92).

[5] “Ora, o aparecimento do iníquo é segundo a eficácia (e)ne/rgeia) de Satanás, com todo poder (du/namij), e sinais (shmei=on) e prodígios (te/raj) da mentira” (2Ts 2.9). Neste texto fica claro que Satanás se vale de todos os recursos a ele disponíveis, contudo, como não poderia ser diferente, amparado na “mentira”,  já que ele é seu pai (Jo 8.44).

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