Uma oração intercessória pela Igreja (114)

        7.4.4.6. O poder de Deus em nossa santificação

Toda fé adulta teve outrora seu período de infância; nem ela é tão perfeita em alguém que não haja mais qualquer necessidade de progresso. Portanto, aqueles que já eram crentes, passam a crer ainda mais, enquanto fazem progresso diariamente rumo ao alvo. E, assim, aqueles que já alcançaram os primórdios da fé, que então se esforcem continuamente para obter progresso. – João Calvino.[1]

            Paulo ora para que Deus nos conceda discernimento para perceber o seu poder em nossa vida (Ef 1.18-19). Sem dúvida, uma das manifestações desse poder na vida do crente se concentra em nossa santificação.

            Deus não somente nos salva mediante a regeneração, fé e justificação, antes, opera poderosamente em nosso crescimento espiritual. O seu poder em nossa vida, não é episódico, fragmentado e assistemático mas, contínuo e eficaz.

O mesmo Deus que nos elegeu na eternidade, também nos chamou no tempo para si a fim de vivermos santamente. Deus é o Senhor dos fins e dos meios. Senhor do tempo, das circunstâncias e da eternidade. A sua obra é sempre completa conforme a sua própria determinação e graça reveladas em Cristo.

            Como temos insistido, é confortador saber que o nosso Deus é Trino. Ele cuida de nós, nos instruindo, protegendo, disciplinando, educando, guiando, aconselhando e capacitando a fim de que juntos: O Pai, o Filho e o Espírito Santo concluam em nós a grande e majestosa obra da salvação planejada na eternidade e executada no tempo, na história, na nossa história de vida até a sua consumação final, quando seremos perfeitamente santos conforme o propósito final de Deus.[2] 

            As Escrituras Sagradas nos ensinam que a eleição de Deus não é um ato isolado, sem um desenvolvimento posterior. Antes, demonstram que o Deus Trino está comprometido intensamente com a concretização desta eleição em santidade até a consumação de sua obra. Em outras palavras, Deus está ativamente interessando e graciosamente operante na promoção de nossa santificação.

            As Escrituras Sagradas nos ensinam que o Deus que nos chama à santidade está comprometido com a nossa santificação. A Santíssima Trindade opera eficazmente em nós para que sejamos santos. Por isso, fundamentados na Palavra de Deus, podemos dizer que o Deus Trino é o Autor de nossa santificação. Daí a oração de Paulo: “O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo”(1Ts 5.23).

            Creio também, que deve estar claro, que todos nós somos responsáveis por nossa santificação. Responsabilidade aqui não significa solidão ou isolamento, pelo contrário, aponta para o fato de que à luz do que Deus fez e faz, considerando os recursos que Ele nos concede, devemos estar comprometidos com o propósito de Deus em Cristo, de sermos santos, tendo a mente de Cristo.[3]

            Não podemos separar a obra da Trindade de forma arbitrária. Contudo, para uma visão melhor do assunto, mostraremos biblicamente, como as três pessoas da Trindade agem de forma poderosamente eficaz em prol de nossa santificação.[4]

          1) O Pai

            Jesus orou ao Pai para que santificasse os seus discípulos: Santifica-os (a(gia/zw) na verdade” (Jo 17.17). Do mesmo modo orou Paulo: “O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo”(1Ts 5.23). Ambas as orações ressaltam, além da confiança, o fato de que o Deus Pai é poderoso para nos santificar, o que de fato Ele faz.

            O Pai que nos escolheu em Cristo, continua operante, nos disciplinando para que participemos de sua santidade (Hb 12.5-11), propiciando todos os meios para que cresçamos em nossa fé, desenvolvendo a nossa salvação (Fp 2.13/Hb 13.20-21). Deus não somente tem um santo propósito para nós, mas, também, nos disponibiliza os recursos para tal. Aprendemos também que um dos principais recursos dos quais devemos nos valer, é a oração. Devemos orar, neste sentido, por nós mesmos, e pelo nosso próximo. A oração intercessória faz parte essencial da santificação da igreja.

           2) O Filho

             A santidade da igreja é algo tão importante, tão vital, que o Filho além de orar ao Pai para que nos santificasse, Ele mesmo se ofereceu por nós para que a nossa santidade fosse real. Sem a obra do Filho, a sua oração em nosso favor não teria eficácia. Sem a encarnação, quando o Filho abre mão da manifestação da glória de sua deidade, não haveria santificação. A santificação é o resultado da vinda de Jesus Cristo, sua morte e ressurreição. Por isso, nós somos santos e santificados em Cristo Jesus, aquele que foi morto e ressuscitou.[5] A santificação do Filho é em favor da Igreja (Jo 17.19). A Obra de Cristo é o fundamento de nossas orações e da santidade da Igreja. “A verdadeira santidade de todos os verdadeiros cristãos é fruto da morte e ressurreição de Cristo, pela qual o dom do Espírito Santo foi adquirido. Ele ofereceu-se a si mesmo por Sua Igreja para santificá-la”, exulta Henry (1662-1714).[6]

A Palavra de Deus demonstra que por meio da única e suficiente oferta de Cristo, fomos santificados: “Nessa vontade é que temos sido santificados, mediante a oferta do corpo de Jesus Cristo, uma vez por todas (…). Porque com uma única oferta aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados” (Hb 10.10,14). “…. Jesus, para santificar o povo, pelo seu próprio sangue, sofreu fora da porta” (Hb 13.12).

            Cristo se entregou a fim de que sejamos santos. Ele não se limitou a exigir isto de nós. Cristo se entregou para que este propósito fosse possível e, de fato, real. Entre a realidade terrível de nosso pecado e um alvo, que poderia ser etéreo, Cristo se entrega por nós para que a nossa realidade seja transformada, cumprindo assim, o seu propósito de santificação em nós. Jesus Cristo tornou-se também, para nós, o exemplo perfeito de santificação, o qual devemos perseguir (Hb 12.2/1Pe 2.21; 1Jo 2.6).[7]

            Em outro lugar, Paulo declara: “Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra”(Ef 5.25-26. Veja-se: Tt 2.14).

            Por isso, escrevendo à Igreja de Corinto o apóstolo pôde dizer: “À Igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em Cristo Jesus” (1Co 1.2).

          3) O Espírito Santo

           A Bíblia atribui mais especificamente a nossa santificação ao Espírito Santo. Ele nos regenera e renova (Jo 3.3,5; Tt 3.5), guiando-nos a fazer a vontade de Deus (Rm 8.14). Ele habita em nós, testificando que somos filhos do Deus Santo (Rm 8.16), capacitando-nos a desejar agradar a Deus por meio da nossa obediência.

            Paulo, falando aos coríntios, faz um rol de pecados que caracterizavam a vida de alguns daqueles irmãos antes de se converterem a Cristo. Depois conclui: “Tais fostes alguns de vós; mas vós vos lavastes, mas fostes santificados, mas fostes justificados, em o nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus” (1Co 6.11).

            Aqui temos a oportunidade de ver a relação entre a obra do Filho e a do Espírito. Somos santificados no nome de Cristo, pela operação do Espírito. O Espírito aplica nos eleitos de Deus os méritos redentores de Cristo. Ele é o Espírito da graça, o comunicador da sua graça, da graça de Deus, visto que Ele é Deus (Hb 10.29).

            Deus leva a efeito o objetivo de nossa eleição, de forma especial, por meio do Espírito: “Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé na verdade”(2Ts 2.13). Do mesmo modo escreve Pedro: “Eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para obediência….” (1Pe 1.2).

            Nesta operação, o Espírito tem como objetivo nos tornar santos conforme Ele o é, visto ser Ele “O Espírito de Santidade”(Rm 1.4); o Espírito Santo. “O Espírito Santo é o espírito da santidade e produz santidade dentro de nós”, comenta Grudem.[8]

Maringá, 31 de julho de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]João Calvino, O evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 2.11), p. 95.

[2] “É uma grande bênção ter um Deus que não é uma Pessoa senão três. Constitui uma Trindade abundante. Porque não só um Pai que nos ama e cuida de nós, senão também um Cristo que trouxe salvação e intercede por nós e um Espírito Santo que mora dentro de nós e aplica a salvação à nossa vida” (Edwin H. Palmer, El Espiritu Santo,Edinburgh: El Estandarte de la Verdad, (s.d.), Edición revisada, p. 14).

[3] John Murray (1898-1974) acentua: “A santificação envolve a concentração do pensamento, do interesse, do coração, mente, vontade e propósito, em direção à soberana vocação de Deus em Cristo Jesus e ao desempenho da totalidade de nosso ser no uso daqueles meios que Deus instituiu com o fim de atingir essa destinação” (John Murray, Redenção: Consumada e Aplicada,p. 166).

[4] Os próximos parágrafos deste capítulo foram extraídos, com ligeiras modificação, do meu livro, Efésios – O Deus Bendito, São Paulo: Cultura Cristã, 2010.

[5] “Eu e vocês só podemos ser santificados porque a encarnação é um fato; só podemos ser santificados porque o sofrimento e a morte, a ressurreição e a vida ressurreta do nosso Senhor foram, todos, fatos. Não devemos deixar fora nem um só passo; não somos santificados só pelo Senhor ressurreto, sua morte foi igualmente essencial, e assim o foi também a encarnação” (D.M. Lloyd-Jones, Santificados Mediante a Verdade, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, (Certeza Espiritual, v. 3), 2006, p. 47).

[6]Matthew Henry, Comentário Bíblico de Matthew Henry, 5. ed. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das assembleias de Deus, 2006, (Jo 17.17-19), p. 878.

[7]“Olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus” (Hb 12.2). “Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos” (1Pe 2.21). “Aquele que diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou” (1Jo 2.6).

[8]Wayne A. Grudem, Teologia Sistemática,São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 629.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *