Teologia da Evangelização (113)

3.4.2.2.3. Fidelidade, Perseguição, Crescimento e Consolo 

A Igreja no Novo Testamento logo enfrentou uma série de perseguições, geradas num primeiro momento, pelos judeus que incitavam as autoridades romanas. Para citar apenas algumas, temos a perpetrada contra Estevão, que morreu apedrejado (At 7.1-60); a de Herodes Agripa I, que prendeu a Pedro e decapitou Tiago (At 12.1-3); Paulo, o antigo perseguidor do Evangelho, foi aquele que mais sofreu perseguições (At 9.23-25,29; 14.2-7,19; 16.19-24; 17.4-9, 13-15; 21.30-32).

          Escrevendo aos coríntios, Paulo faz um resumo do que havia sofrido pelo evangelho de Cristo (2Co 11.23-33). Contudo, havia nele, uma visão constante que transpunha o sentimento de dor e angústia. Na prisão, escreveu aos filipenses:“Quero ainda, irmãos, cientificar-vos de que as cousas que me aconteceram têm antes contribuído para o progresso do evangelho”(Fp 1.12) e, diz mais: “Alegrai-vos sempre no Senhor, outra vez digo, alegrai-vos”(Fp 4.4). O Evangelho prosseguia em sua caminhada vitoriosa a despeito dos obstáculos erguidos contra ele.

          Paulo estava convencido, e demonstrava isto na prática, que Deus nos faz vencer os obstáculos que estão à nossa frente.

          A perseguição não se encerrou no primeiro século; a Igreja ao longo de toda a história tem sido alvo de ataques físicos, morais, intelectuais e espirituais; todavia, ao lado dessas afrontas, ela tem podido desfrutar da presença confortadora do Espírito Santo. O Espírito que habita em nós, nos conforta em todos os momentos, nos amparando quando parece que não temos onde ou em quem nos apoiar.

          “Assim, o Espírito Santo é o autor imediato de toda a verdade, de toda a santidade, de toda a consolação, de toda a autoridade e de toda a eficiência nos filhos de Deus, individualmente, e na Igreja, coletivamente”, aplica Hodge.[1] De fato, o Senhor Jesus não nos deixou órfãos. Ele, ele mesmo, está conosco aqui e agora e para sempre (Jo 14.16-18/At 9.31).

          Os registros históricos que temos a partir do segundo século informam-nos de que, apesar de perseguidos, os cristãos davam o seu testemunho, sendo muitas vezes martirizados – aliás, a palavra grega “mártir” significa “testemunha” –, vemos também que o seu comportamento era contagiante por meio de uma conduta diferente, que procurava se pautar pela Palavra de Deus.

          Aqui se torna oportuno transcrever parte de um documento anônimo, escrito ao que parece no final do 2° século, intitulado Carta a Diogneto,que consistia numa explicação do pensamento, conduta e fé cristã, dirigida a um pagão que, impressionado com o testemunho cristão, queria saber mais a respeito dessa religião.[2]

Os cristãos, de fato, não se distinguem dos outros homens, nem por sua terra, nem por língua ou costumes. Com efeito, não moram em cidades próprias, nem falam língua estranha, nem têm algum modo especial de viver. Sua doutrina não foi inventada por eles, graças ao talento e especulação de homens curiosos, nem professam, como outros, algum ensinamento humano. Pelo contrário, vivendo em cidades gregas e bárbaras, conforme a sorte de cada um, e adaptando-se aos costumes do lugar quanto à roupa, ao alimento e ao resto, testemunham um modo de vida social admirável e, sem dúvida, paradoxal. Vivem na sua pátria, mas como forasteiros; participam de tudo como cristãos e suportam tudo como estrangeiros. Toda pátria estrangeira é pátria deles, e cada pátria é estrangeira. Casam-se como todos e geram filhos, mas não abandonam os recém-nascidos. Põem a mesa em comum, mas não o leito; estão na carne, mas não vivem segundo a carne; moram na terra, mas têm sua cidadania no céu; obedecem às leis; amam a todos e são perseguidos por todos (…). Pelos judeus são combatidos como estrangeiros, pelos gregos são perseguidos, e aqueles que os odeiam não saberiam dizer o motivo do ódio.[3]

          O crescimento dos cristianismo pode ser explicado humanamente pelo fato de que eles criam no que pregavam; acreditavam na veracidade histórica de sua mensagem; criam no poder de Deus que os transformou.

          Por volta do ano 197 AD., Tertuliano (145-220) escrevendo aos romanos  defendendo os cristãos e mostrando a sua integridade, revela a expansão do cristianismo:

Nós somos de ontem, e já enchemos a terra de tudo o que lhes pertence – as cidades, as ilhas, as fortificações, os municípios, as povoações, os próprios acampamentos, as tribos, as empresas, o palácio, o senado, o fórum –. Deixamos para vocês apenas os templos e seus deuses.[4]

          Isso tudo em meio à forte perseguição, como escreveria à frente:  “Mas não servem para nada vossas crueldades mais refinadas. Elas são, antes, um atrativo para nossa seita. Nós nos tornamos mais numerosos, cada vez que vós nos ceifais: O sangue dos cristãos é semente”.[5]

Maringá, 09 de novembro de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Charles Hodge, Teologia Sistemática,São Paulo: Editora Hagnos, 2001, p. 396.

[2] Veja-se: Carta a Diogneto, I: In: Padres Apologistas,São Paulo: Paulus, 1995, p. 19.

[3] Carta a Diogneto, V.1-11,17: In: Padres Apologistas, p. 22-23.

[4]Tertulian, Apology, 37: In: Alexander Roberts; James Donaldson, eds. Ante-Nicene Fathers, 2. ed. Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 1995, v. 3, p. 45.

[5]Tertulian, Apology, 50: In: Alexander Roberts; James Donaldson, eds. Ante-Nicene Fathers, 2. ed. Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 1995, v. 3, p. 55.

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