Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (37)

5) Mansidão: o caminho da sabedoria em obediência à Palavra

 

Tiago nos diz que a evidência da verdadeira sabedoria é a mansidão com que ela é demonstrada: Quem entre vós é sábio e inteligente? Mostre em mansidão (prau=+thj) de sabedoria, mediante condigno proceder, as suas obras (Tg 3.13).

 

A mansidão deve permear as nossas atitudes. Ela deve reger o nosso comportamento e caracterizar as nossas relações, conforme Paulo instrui a Tito no sentido de ensinar qual deve ser o comportamento dos membros da Igreja em relação a todas as pessoas: Lembra-lhes que se sujeitem aos que governam, às autoridades; sejam obedientes, estejam prontos para toda boa obra, não difamem a ninguém; nem sejam altercadores, mas cordatos, dando provas de toda cortesia (prau+/thj), para com todos os homens” (Tt 3.1-2).

 

Paulo, aplicando a teologia que ensinara, exorta os efésios: Rogo-vos (parakale/w), pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis (peripate/w) de modo digno da vocação a que fostes chamados, 2 com toda a humildade e mansidão (prau+/thj), com longanimidade, suportando-vos uns aos outros em amor” (Ef 4.1-2).

 

O verbo “andar” está no aoristo ativo, indicando uma atitude que deve ser constante, contínua, envolvendo a ideia de movimento e progresso.

 

Em outro texto, Paulo reforça este conceito, mostrando que assim como a humildade, a mansidão não é algo acabado e completo, devemos persegui-la diariamente: Tu, porém, ó homem de Deus, foge destas coisas; antes, segue (diw/kw)[1] a justiça, a piedade, a fé, o amor, a constância, a mansidão (prau+pa/qeia) (1Tm 6.11). Como vimos, Calvino comenta: “Será inútil ensinar a mansidão, a menos que tenhamos iniciado com a humildade”.[2]

 

O início deste caminho de vida está no acolhimento da Palavra de Deus, que deve ser feito com mansidão: “… acolhei, com mansidão (prau=+thj), a palavra em vós implantada, a qual é poderosa para salvar a vossa alma (Tg 1.21).

 

Não há lugar para arrogância diante da Palavra. Ela nos mostra de forma absoluta os nossos pecados e a necessidade que temos de salvação em Jesus Cristo. Davi se constitui num bom exemplo de acolhimento da Palavra. Quando, devido aos seus pecados foi confrontado severa e justamente pelo profeta Natã, o salmista, de modo humilde e arrependido, disse: “Pequei contra o Senhor” (2Sm 12.13). Não há agressividade, nem desculpas. Ele pecou contra Deus e, por isso, confessou o seu pecado. O arrependimento e a consequente confissão, ainda que depois de cerca de um ano, foi antecedida por uma reflexão sincera e por uma decisão corajosa.

 

O modelo perfeito de mansidão nós o temos em Cristo Jesus, de quem devemos aprender como discípulo, completa e definitivamente, visto que em todo o seu ministério terreno deu-nos exemplo de mansidão sendo obediente ao Pai: “… aprendei (manqa/nw) de mim, porque sou manso (prau/+j) e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma” (Mt 11.29).[3]

 

O caminho da mansidão passa invariavelmente pelo crescimento espiritual, já que esta é uma virtude do Espírito. Portanto, esta virtude não é natural, devendo ser cultivada pela obediência à Palavra de Deus: “O fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão (prau+/thj), domínio próprio….(Gl 5.22-23).

 

A ideia de mansidão é também a de controle. Conforme formos crescendo espiritualmente, os nossos pensamentos, emoções, desejos e comportamento vão sendo controlados por Deus. Assim, vemos que o mesmo Moisés que matou um egípcio porque maltratava um judeu, é dito depois que ele se tornou o homem mais manso de toda a terra (Nm 12.3) (LXX: prau+/j).

 

A mansidão é uma virtude de grande valor diante de Deus, conforme diz Pedro: Não seja o adorno da esposa o que é exterior, como frisado de cabelos, adereços de ouro, aparato de vestuário; seja, porém, o homem interior do coração, unido ao incorruptível trajo de um espírito manso (prau/+j) e tranquilo, que é de grande valor diante de Deus” (1Pe 3.3-4).

 

 

São Paulo, 30 de abril de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Leia esta série completa aqui.

 


[1]Diw/kw é utilizada sistematicamente para aqueles que perseguiam a Jesus, os discípulos e a Igreja (Mt 5.10-12; Lc 21.12; Jo 5.16; 15.20). Lucas emprega este mesmo verbo para descrever a perseguição que Paulo efetuou contra a Igreja (At 22.4; 26.11; 1Co 15.9; Gl 1.13,23; Fp 3.6), sendo também a palavra utilizada por Jesus Cristo quando pergunta a Saulo do porquê de sua perseguição (At 9.4-5/At 22.7-8/At 26.14-15). Paulo diz que prosseguia para o alvo (Fp 3.12,14). O escritor de Hebreus diz que devemos perseguir a paz e a santificação (Hb 12.14). Pedro ensina o mesmo a respeito da paz (1Pe 3.11).

[2]João Calvino, Efésios, São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 4.1), p. 108.

[3] Do mesmo modo: 2Co 10.1: (“mansidão” = prau=+thj) e Mt 21.5: (“humilde” = prau=+j).

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