O Ser, as pessoas e as coisas: ontologia, epistemologia e ética (13)

Nossa compreensão supostamente verdadeira e seus equívocos

     A nossa perspectiva da realidade não é objetiva. No entanto, tendemos a pensar que o conhecimento que temos é natural, no sentido de que todos percebem como percebemos, daí a impressão equivocada de que a nossa forma de ver, perceber e interpretar a realidade é mais óbvia e, portanto, comum e, possivelmente, julgamos poder conhecer as coisas como são.

Descobrimos a ilusão dessa percepção quando começamos a conversar com pessoas a respeito de temas que nos parecem óbvios. Não precisamos ir muito longe. Basta fazê-lo com nossos filhos. Já de início, para surpresa nossa, descobrimos que a nossa percepção estava equivocada ou, pelo menos, não única nem, necessariamente a mais completa.

            A nossa forma de conhecer é sempre mediata. Conhecemos através de intermediações.

            A nossa miopia proporciona uma imagem embaçada das coisas; a surdez, que é naturalmente progressiva com o passar dos anos, não nos permite identificar determinados sons, por isso podemos fazer uma audiometria para verificar isso.

            O nosso paladar apresenta gostos diferentes conforme o que ingerimos antes e, mesmo, conforme a intensidade de nossa fome. Já ouviram a declaração materna mais ou menos nesses termos?: “Não comeu porque não está com fome. Quando está, come até pedra”

            O aroma dos pratos amplamente apreciados pode nos causar enjoo se estivermos com problema de fígado.

Se estivermos com dormência em nossas mãos, certamente teremos dificuldade de identificar a aspereza ou textura do que tocamos.

 Por isso é que a conjugação de nossos órgãos dos sentidos nos proporciona uma capacidade maior de compreensão, ainda que limitada.

Por exemplo: É mais compreensível conversar com a pessoa diante de si do que simplesmente por telefone ou via e-mail.

            A nossa visão pode ser confirmada ou não conforme a possibilidade de tocar no objeto. A aparência pode ser contraposta ao aroma. Por isso podemos dizer: “Meu filho come com os olhos”; “a comida está feia, mas, está gostosa”; “o aroma não é agradável, porém, o sabor sim”.

            Devemos perceber também que, quando dirigimos, além de nossas mãos e pés para dar direcionamento ao veículo, lemos a realidade com os nossos olhos e nossos ouvidos. A visão é o principal meio nesse processo, porém, a audição nos auxilia em muito, especialmente no que concerne ao que está fora de nosso alcance visual. Alguns carros trazem um sensor que procura nos ajudar a dirigir acendendo uma luz quando há algum objeto estranho no “ponto cego”. Outros trazem ainda, sensores auditivos para reforçar a nossa visão do objeto; por isso, temos sensores dianteiro e traseiro em diversos carros.

            Desse modo, a nossa compreensão passa por diversas variáveis entre as quais apenas destaquei as sensoriais.

Pergunto: E as mediações das visões que temos ou que nos são dadas pelo meio em que vivemos?

Não posso seguir aqui essa linha de argumentação, porém, é oportuna a observação de Sowell

Seria bom poder dizer que poderíamos prescindir completamente de visões e lidar somente com a realidade. Porém essa pode ser a visão mais utópica entre todas. A realidade é muito complexa para ser compreendida por qualquer mente. Visões são como mapas que nos guiam através de um emaranhado de complexidades desconcertantes.[1]

O comprometimento cristão com a verdade

            Por isso, a verdade é sempre essencial. O Cristianismo não se sustenta amparado em aparências, circunstâncias e ambiguidades, antes, ele proclama a verdade e se dispõe a ser examinado à luz da verdade.

            Ou a sua mensagem é verdadeira, ou não há mensagem relevante a ser proclamada. O Cristianismo não perde tempo com conversação vazia e sem sentido. 

            Mohler resume:

Como sempre, verdade é a questão essencial. Onde uma noção clara da verdade está ausente, o cristianismo torna-se mais uma atitude do que um sistema de crenças. Contudo a crença sempre pressupõe uma verdade que pode e deve ser conhecida.[2]

            Sem a historicidade dos fatos narrados nas Escrituras, não há verdade no Cristianismo

            O propósito eterno de Deus nos fala do amor concreto de Deus que se manifesta de forma contundente na morte e ressurreição de Cristo.

            São Paulo, 29 de junho de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Thomas Sowell, Conflito de visões: origens ideológicas das lutas políticas, São Paulo, É Realizações, 2012, p. 17.

[2]Albert Mohler, O desaparecimento de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 11-12.

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