A riqueza da fecunda graça de Deus e a frutuosidade de uma fé obediente e perseverante (23)

6.4. Perdão dos pecados

 

A mensagem não é que Deus está disposto a perdoar o fato do Calvário, mas que Deus perdoa por meio do Calvário. É o que Deus fez no Calvário que produz o perdão para nós. O Calvário não é meramente uma proclamação ou um anúncio do amor de Deus e da Sua prontidão para perdoar; é Deus mediante o que Ele fez em Cristo e por meio dEle na cruz do Calvário, criando um meio pelo qual Ele pode reconciliar-nos consigo.-  D.M. Lloyd-Jones.[1]

 

O perdão que nos vem absolutamente gratuito, custou o precioso sangue de Cristo, o Cordeiro sem mácula. Pela fé em Cristo, mediante o nosso arrependimento, somos perdoados por Cristo Jesus.

Em Cafarnaum, quando quatro leais amigos de um paralítico providenciam um inusitado caminho para fazê-lo chegar até Jesus, registra Marcos: Vendo-lhes a fé, Jesus disse ao paralítico: Filho, os teus pecados estão perdoados” (Mc 2.5).

 

Pedro após relutar em atender ao chamado de Deus para pregar entre os gentios, vai à casa de Cornélio, conforme o instruíra o Senhor. Dando testemunho diante de toda sua casa a respeito do Senhor Jesus, diz:  “Dele todos os profetas dão testemunho de que, por meio de seu nome, todo aquele que nele crê recebe remissão de pecados” (At 10.43).

 

Analisemos agora, alguns aspectos concernentes ao perdão concedido por Deus.

 

Perdoar significa considerar o devedor como se não houvesse ofendido em nada; não lhe imputar nenhuma dívida. Após o perdão, o devedor deixou de ser um devedor, ou mesmo, um devedor perdoado, para ser apenas uma pessoa, sem maiores adjetivos. Tanto a ofensa como o perdão já não contam mais. Com o perdão de Deus o nosso relacionamento com Ele é restabelecido.

 

A petição, “perdoa-nos as nossas dívidas”, ensinada por Jesus Cristo por meio do Pai Nosso, significa que nós, admitindo o nosso pecado, pedimos a Deus que pela sua misericórdia não nos considere como de fato somos: devedores dignos de castigo.

 

O Antigo Testamento enfatiza que todo pecado exige expiação, e esta é feita por meio do derramamento de sangue (Lv 17.11/Hb 9.22). Não que o sacrifício tivesse em si mesmo poder para remir o pecador, mas ele adquire este valor porque foi este o método estabelecido por Deus para perdoar,[2] por meio do qual o homem, quando agia sinceramente, indicava o seu arrependimento e obediência ao caminho proposto por Deus.

 

O ritual sem um coração sincero de nada adiantava; daí as constantes admoestações de Deus quanto a uma prática apenas externa, destituída do sentimento correto (Vejam-se: Is 1.10-17; Am 5.21-22).

 

Os sacrifícios no Antigo Testamento apontam, especialmente a partir de Isaías, para a vinda do Messias, O Servo de Deus, que daria a Sua vida em resgate do seu povo. (Vejam-se: Is 40-42; 52.13-15; 53; 55).

 

O perdão é descrito sempre nas Escrituras como sendo uma iniciativa de Deus. Deus, em textos diferentes, diz:

 

Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim, e dos teus pecados não me lembro. (Is 43.25).

Desfaço as tuas transgressões como a névoa, e os teus pecados como a nuvem; torna-te para  mim, porque eu te remi. (Is 44.22).

Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a iniquidade, e te esqueces da transgressão do restante da tua herança? O Senhor não retém a sua ira para sempre, porque tem prazer na misericórdia. Tornará a ter compaixão de nós; pisará aos pés as nossas iniquidades, e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar. (Mq 7.18-19).

Perdoarei as suas iniquidades, e dos seus pecados jamais me lembrarei. (Jr 31.34) (Vejam-se: Is 55.7; Jr 5.1; 33.8; Ez 36.25).

 

O perdão é um favor de Deus, uma prerrogativa sua, não algo a que temos direito por nossos merecimentos. Daniel, diz: “Ao Senhor, nosso Deus, pertence a misericórdia e o perdão” (Dn 9.9/Sl 130.4).

 

     “Deus (…) é rico em perdoar” (Is 55.7). Portanto, “Bem-aventurado o homem a quem o SENHOR não atribui iniquidade e em cujo espírito não há dolo” (Sl 32.2).

 

Grider nos chama a atenção para o fato de que “nenhum livro de religião, a não ser a Bíblia, ensina que Deus perdoa completamente o pecado”.[3]

 

No Novo Testamento, Paulo estabelece um contraste entre a “graça” e as “obras”: “E, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é graça” (Rm 11.6). “Méritos humanos estão excluídos de todo o plano da salvação”.[4]

 

     A base de nosso perdão é a obra expiatória de Cristo, coroada com a sua ressurreição (Lc 24.46-47; Rm 4.25; 1Co 15.17; 2Co 5.15). O perdão de nossos pecados ampara-se no sacrifício remidor de Cristo.

O perdão para a todo e qualquer pecado nosso, custou a Cristo a sua oferta voluntária em nosso favor, envolvendo todos os seus sofrimentos e morte na cruz. Sem a obra de Cristo não haveria perdão para nós. [5] As Escrituras insistem neste ponto:

No qual (Jesus) temos a redenção pelo seu sangue, a remissão dos pecados segundo a riqueza da sua graça (Ef 1.7).

Antes sede uns para com os outros benignos, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Cristo vos perdoou (Ef 4.32).

Sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus (Rm 3.24).

 

O perdão concedido por Deus é em nome de Cristo (At 10.43/Cl 1.14/1 Jo 2.12). (Vejam-se também: Mt 26.28; Jo 1.29; At 5.31; 18.38).

 

Calvino de modo surpreendente afirma: “Deus se paga a Si mesmo por Sua misericórdia manifestada em Seu Filho, nosso Salvador Jesus Cristo, que uma vez por todas se ofereceu ao Pai para ser Ele próprio a satisfação que Lhe deveríamos prestar”.[6]

 

No próximo post continuarei desenvolvendo este argumento.

 

Curitiba, 6 de março de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Este post faz parte de uma série. Acesse aqui a série completa

 


[1] D.M. Lloyd-Jones, O supremo propósito de Deus: Exposição sobre Efésios 1.1-23, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 145.

[2] Eichrodt, seguindo Büchler diz que “A expiação não é uma forma imediata de remoção do pecado independentemente de seu perdão, senão um método de perdão” (Walter Eichrodt, Teologia del Antiguo Testamento, Madrid: Ediciones Cristiandad, 1975, v. 2, p. 440).

[3] J.K. Grider, Perdão: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1990, v. 3, p. 136. Esta declaração não entra em conflito com o fato de que os deuses dos povos do Antigo Testamento eram aplacados em sua ira e esta consciência de “perdão” era testemunhada pelos seus adoradores. (Cf. J. Scharbert, Perdão: In: Heinrich Fries, (direção de), Dicionário de Teologia, 2. ed. São Paulo: Loyola, 1987, v. 4, p. 229-230). Contudo, um exemplo explícito de um “deus” declarando o perdão absoluto parece ser estranho à literatura antiga, fora da Bíblia.

[4]William S. Plumer, Psalms, Carlisle: The Banner of Truth Trust, 1978, (Reprinted), (Sl 130.4), p. 1125.

[5] “A ilusão mais perigosa de todas é o farisaísmo. Essa é a verdadeira barreira a Jesus Cristo. Toda a rejeição da graça de Deus toma essa forma. Aqueles que recusam o perdão gratuito de Deus por meio de Cristo fazem assim porque acham que não precisam desse perdão. Eles não admitem que são pecadores. Eles negam que estejam desesperadamente perdidos” (Gene Edward Veith, Jr, De Todo o Teu Entendimento, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 79).

[6]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 3, (III.9), p. 129.

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