A Pessoa e Obra do Espírito Santo (454)

6.4.13. Sobre a igreja e a glória de Deus

Paulo escreve ao efésios:

12 a fim de sermos para louvor da sua glória (do/ca), nós, os que de antemão esperamos em Cristo; 13 em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa; 14 o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória (do/ca). (Ef 1.12-14).

            Só conseguimos ver a glória de Deus – tão eloquentemente manifestada na Criação, na Palavra e plenamente em Jesus Cristo – pela iluminação do Espírito de Deus. Nós que tendemos a nos orgulhar de dispormos de uma visão tão clara a respeito de vários aspectos da realidade, do comportamento humano, das nossas atividades, as filigranas de determinadas artes, etc., quando nos deparamos com a glória de Deus, tão refulgentemente revelada, temos os nossos olhos completamente fechados para esta realidade.

            De fato, sem a graça de Deus a eloquente glória de Deus manifesta na Criação nada nos diz no que ela tem de mais glorioso: “Porque Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a luz, ele mesmo resplandeceu em nosso coração, para iluminação do conhecimento da glória (do/ca) de Deus, na face de Cristo” (2Co 4.6).

            A Escritura nos fala que a Criação aguarda a sua gloriosa libertação tendo como padrão da sua esperança os filhos de Deus:

19 A ardente expectativa da criação aguarda a revelação dos filhos de Deus. 20 Pois a criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a sujeitou, 21 na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória (do/ca) dos filhos de Deus. (Rm 8.19-21).

            Deste modo, podemos ver que a glória de Deus faz parte da sua essência – faz com que Deus seja o que é: o Senhor da Glória –, bem como de seus atos presentes até à consumação dos propósitos de Deus na história, quando toda a Criação alcançada pela obra de Cristo será redimida.

            Estudemos agora alguns aspectos concernentes à glória de Deus:

 6.4.13.1. A Igreja não é marqueteira da glória, antes ela sabe

a) Que a glória pertence a Deus; Ele é Pai e Senhor da Glória: Paulo se refere a Deus como Pai e Senhor da glória (Ef 1.17; 1Co 2.8).[1] A glória de Deus não é algo anexo ao Senhor. Ele não precisa de “visibilidade” para que a sua glória seja o que de fato é.

            A Igreja, portanto, não atribui glória a Deus antes, a reconhece e proclama com grande satisfação. A Igreja não precisa fazer estratégia de marketing para promover a glória de Deus. Ela anuncia com fidelidade que a glória pertence à natureza de Deus, daí a mesma ser manifestada em todos os seus atos.

            Deus não representa nenhum papel revelacional, antes, Ele é o que é em si mesmo e, portanto, em todo o seu relacionamento consigo mesmo e com as suas criaturas.

b) Jesus Cristo é o Senhor da Glória, o resplendor da Glória de Deus: A manifestação plena da glória de Deus conforme nos foi dada conhecer, está em Jesus Cristo. O Filho é “…. o resplendor da glória (do/ca) e a expressão exata do seu Ser….” (Hb 1.3/Jo 1.14; 1Pe 4.11). Ele também é o Senhor da glória: “Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor[2] da glória (do/ca), em acepção de pessoas” (Tg 2.1).

            Uma das expressões mais completas das “insondáveis riquezas de Cristo” é-nos manifestada no fato da encarnação do Verbo eterno de Deus. Por isso, é que o Evangelho é a Boa Nova da glória de Cristo e da glória de Deus: Jesus Cristo é Deus. Em Cristo resplandece a Majestade Divina: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória (do/ca), glória (do/ca) como do unigênito do Pai” (Jo 1.14). Somente Deus é glorioso.[3]

            O Evangelho nos enriquece. Jesus Cristo, o Senhor da glória, rico em sua glória eterna (1Co 2.8; Tg 2.1/Jo 17.1-5)[4] fez-se pobre por amor do seu povo a fim de que fôssemos enriquecidos na plenitude de sua graça:[5] “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico (plou/sioj), se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos (ploute\w) (2Co 8.9).

            Na realidade, a Sua humilhação (encarnação e morte) e exaltação (ressurreição, glorificação e ascensão) não afetaram em nada a essência da sua natureza Divina.

            Owen (1616-1683) comenta:

Quando Ele tomou sobre Si a forma de um servo em nossa natureza, Ele se tornou aquilo que nunca havia sido antes, mas não deixou de ser aquilo que sempre tinha sido em Sua natureza divina.[6] Ele, que é Deus, não pode deixar de ser Deus. A glória da Sua natureza divina estava velada, de forma que aqueles que O viram não acreditaram que Ele era Deus. Suas mentes não podiam entender algo que eles nunca haviam conhecido antes, que uma e a mesma pessoa pudesse ser Deus e homem ao mesmo tempo. Todavia, aqueles que creem sabem que Ele, que é Deus, humilhou-se ao assumir a nossa natureza, a fim de salvar a Igreja para a eterna glória de Deus.[7]

            Por isso, não podemos pensar na insondável riqueza da glória de Deus sem termos nossos olhos voltados para a encarnação do Verbo; a perfeição única e inexplicável de Jesus Cristo, o Filho eterno de Deus que se encarnou para morrer pelo seu povo, nos restaurando à comunhão com Deus.

            Paulo fala de Cristo como o rico e glorioso mistério que agora foi revelado aos gentios pelo Evangelho: “O mistério que estivera oculto dos séculos e das gerações; agora, todavia, se manifestou aos seus santos; aos quais Deus quis dar a conhecer qual seja a riqueza (plou=toj) da glória deste mistério entre os gentios, isto é, Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl 1.26-27).

  c) O Espírito Santo de Deus é Glorioso: O que deve nos confortar em meio às tribulações resultantes da nossa fidelidade a Deus, é saber que sobre nós repousa o Espírito de Deus; o Espírito da glória: “Se, pelo nome de Cristo, sois injuriados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa o Espírito da glória (do/ca)[8] e de Deus” (1Pe 4.14).

d) Deus é rico em sua Glória: A glória de Deus permeia todos os seus atos. Deus é glorioso em si mesmo e naquilo que faz. Ele sempre age em harmonia com sua própria natureza. É por isso que Paulo nos diz que até em nossa manutenção e preservação vemos a riqueza da glória de Deus: “Para que, segundo a riqueza da sua glória (do/ca), vos conceda que sejais fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior” (Ef 3.16).

            Desta forma, a riqueza de sua glória é-nos revelada em seus atos, percebidos somente pelos eleitos, quer judeus, quer gentios: “Aos quais (santos) Deus quis dar a conhecer qual seja a riqueza da glória (do/ca) deste mistério entre os gentios, isto é, Cristo em vós, a esperança da glória (do/ca) (Cl 1.27).

Maringá, 07 de abril de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa



[1]“Para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória (do/ca), vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele” (Ef 1.17). “Sabedoria essa que nenhum dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivessem conhecido, jamais teriam crucificado o Senhor da glória (do/ca)(1Co 2.8). (2Co 3.18; Tt 2.13).

[2] A expressão Senhor não ocorre no original. Daí que uma tradução mais literal seria: “Jesus Cristo, de glória” ou “Jesus Cristo, a glória” (Ver 1Co 2.8)

[3]“Não há glória real senão em Deus” (João Calvino, As Pastorais,São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 1.17), p. 46). “Os filósofos pagãos não condenam toda ambição por glória. Entre os cristãos, porém, quem quer que seja ávido por glória é com justa razão acusado de ser possuidor de fútil e louca ambição, porquanto se divorcia da genuína glória. Para nós só a glória de Deus é legítima. Fora de Deus só há mera vaidade” (João Calvino, Gálatas, São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 5.26), p. 173). “Todas as glórias dos homens e dos anjos, colocadas em seu devido lugar, abrem caminho à glória de Cristo, para que somente ela venha a brilhar acima de todos eles incomparavelmente e sem impedimento algum” (João Calvino, Efésios, (Ef 1.21), p. 47).

[4]“Sabedoria essa que nenhum dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivessem conhecido, jamais teriam crucificado o Senhor da glória” (1Co 2.8). Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas” (Tg 2.1). “Tendo Jesus falado estas coisas, levantou os olhos ao céu e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti, assim como lhe conferiste autoridade sobre toda a carne, a fim de que ele conceda a vida eterna a todos os que lhe deste. E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste para fazer; e, agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo” (Jo 17.1-5).

[5] “A encarnação – e o entendimento de seu propósito, a crucificação – é o clímax da graça condescendente de Deus” (William Hendriksen, O Evangelho de João, São Paulo: Cultura Cristã, 2004, (Jo 1.14), p. 117).

[6] Ver também: William Hendriksen, O Evangelho de João, São Paulo: Cultura Cristã, 2004, (Jo 1.14), p. 118.

[7] John Owen, A Glória de Cristo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1989, p. 30. Veja-se: Wayne A. Grudem, Teologia Sistemática, São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 465.

[8] Aqui há uma variante textual. Em alguns documentos aparece doca/zw.

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