A Pessoa e Obra do Espírito Santo (273)

6.4.5.3. É preservada por Cristo (Continuação)

                                      O livro de Salmos abre as suas portas dando o direcionamento de todo o livro: o caminho da obediência e o caminho da desobediência ilustrando algumas das consequências inerentes a cada escolha.

A orientação positiva é: “Bem-aventurado o homem que não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores” (Sl 1.1).

          Portanto, o homem bem-aventurado do Salmo 1, é aquele que se agrada em meditar na Palavra, dando atenção aos mandamentos de Deus a fim de poder cumpri-los, tornando-os o modelo de sua agenda de pensar e praticar.

Deus se dignou em preservar a verdade por meio da sua Igreja. Quando ela falha, neste propósito, ainda que a verdade não seja abalada em sua essência, ela se torna fragilizada em sua exposição e aceitação.

 A igreja enfrenta aqui dois perigos evidentes:

          a) A “barganha” com o mundo. Na pretensão de ser ouvida de forma impactante, negocia os seus valores por meio da assimilação dos valores seculares. Na adoção desta prática, perde totalmente a sua relevância como voz profética de Deus para a sua geração. Estou convencido que muitas vezes isso também ocorre devido à nossa vaidade que aprecia ser reverenciada pelo mundo como sendo portadores de  “mente aberta”, “contextualizada” ou “sensível aos problemas contemporâneos”.

          Consideramos tudo isso como um grande troféu que, na realidade, é apenas mais uma armadilha que mais cedo do que imaginamos, nos conduzirá à falta completa de uma mentalidade bíblica. O fascínio egoísta pode nos conduzir a uma miséria que enfraquece a proclamação efetiva do Evangelho de Cristo.

          O outro perigo ao qual estamos sujeitos, é:

          b) A “privatização” da fé: a minha religião e nada mais. Criamos aqui uma espécie de tribalismo religioso onde cultivamos a nossa fé intramuros e nada temos a ver com o que se passa “lá fora”, exceto, quem sabe, por meio da internet ou televisão. Neste caso, a palavra de ordem é a autopreservação. Queremos apenas preservar nossos valores, associando o progresso dos outros a uma maior semelhança conosco. No profeta Jonas, temos um tipo ideal desta compreensão equivocada.[1]

          Kuyper (1837-1920) nos alerta quanto a esse perigo de forma eloquente:

(…) Muito menos, devem os crentes se retirar para seus nichos eclesiásticos, e, satisfeitos com o simples ato de possuírem fé, deixar nas mãos dos descrentes a construção do templo da ciência, como se esta não lhes dissesse respeito. Os cristãos não podem agir assim porque o empreendimento científico não é um exercício do orgulho humano, mas, sim, um dever que o próprio Deus nos delegou.[2]

A igreja é chamada a atuar no mundo, tendo uma compreensão missionária de sua essência e existência. Esta compreensão programática engloba uma agenda que envolve uma mudança de perspectiva em nossa relação familiar, profissional, social, econômica, política e religiosa. A relevância da verdade sustentada pela igreja deve se manifestar em todas as esferas.

          A Igreja tem, portanto, a grande responsabilidade de estudar a Palavra, proclamá-la e vivenciá-la. Ela é o meio de demonstração desta verdade (Ef 3.8-11).[3] A nossa responsabilidade primeira é com a verdade de Deus.[4] Um desafio para a igreja, portanto, é pregar esta verdade com integridade, profundidade, firmeza e humildade.[5]

          A igreja basicamente preserva a verdade por meio do seu conhecimento, prática e ensino: devemos conhecer a Palavra a fim de poder usá-la corretamente.

A Igreja como sinal da presença de Deus

          Assim como no Antigo Testamento, o templo era o símbolo da presença de Deus no meio de Israel, a Igreja, constituída de todos os eleitos de Deus, deve refletir, na atualidade, a realidade da presença dele entre os homens.

          A Igreja é o testemunho da presença e da atuação de Deus entre os homens. A Igreja é o reflexo da presença de Deus.

          A Igreja diz ao mundo mediante a sua própria realidade histórica e testemunho, que ainda há esperança de salvação. A Igreja como luz do mundo e sal da terra, constitui-se numa bênção inestimável para toda a humanidade.[6]

A Igreja, portanto, é a presença de Jesus Cristo por meio de seu povo, em prol do mundo. Embora provisória, essa presença é real, humana e histórica. Cristo age por meio da Igreja realizando sua obra e confirmando sua vitória. Nesse sentido, não há salvação fora da Igreja, desde que esta se disponha a servir e glorificar Jesus Cristo.[7]

          Portanto, a igreja não foi constituída para barganhar com o mundo, antes para apresentar em sua vida e testemunho o Evangelho de Jesus Cristo e o seu poder transformador.

Maringá, 20 de agosto de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Veja-se: Tullian Tchividjian, Surpreendido pela graça, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 99-100.

[2] A. Kuyper, Sabedoria e prodígios: graça comum na ciência e na arte, Brasília, DF.: Monergismo, 2018, p. 93.

[3] 8 A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graça de pregar aos gentios o evangelho das insondáveis riquezas de Cristo 9 e manifestar qual seja a dispensação do mistério, desde os séculos, oculto em Deus, que criou todas as coisas, 10 para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida, agora, dos principados e potestades nos lugares celestiais, 11 segundo o eterno propósito que estabeleceu em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Ef 3.8-11).

[4]Ver: Wayne A. Mack; David Swavely, A Vida na Casa do Pai, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 17-24.

[5]Veja-se: Joshua Harris, Ortodoxia humilde: defendendo verdades bíblicas sem ferir as pessoas, São Paulo: Vida Nova, 2013, p. 21.

[6]Veja-se: R.B. Kuiper, El Cuerpo Glorioso de Cristo, Grand Rapids, Michigan: Subcomision Literatura Cristiana de la Iglesia Christiana Reformada, 1985, p. 242-247.

[7]Jacques de Senarclens, Herdeiros da Reforma, São Paulo: ASTE, 1970, p. 357.

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