A Pessoa e Obra do Espírito Santo (227)

7. “Sede santos!”: vocação à santidade e a responsabilidade do crente  (Continuação)

A santificação envolve necessariamente a nossa participação. Devemos procurar, por meio da Palavra, ser guiado pelo Espírito Santo (Gl 5.16; Rm 8.6-16) em todas as esferas de nossa vida: pensar, sentir, falar e realizar.[1] Deus opera poderosamente em nós o querer e o realizar (Fp 2.12-13). Este é o nosso ponto neste tópico: Enquanto a regeneração e a justificação são obras exclusivas de Deus (monergética), a santificação envolve a participação ativa do homem (sinergética).

          A Palavra de Deus estabelece uma relação intrínseca entre a nossa responsabilidade de santificação e a nossa eleição.

Paulo saúda a Igreja de Corinto demonstrando a posição e a responsabilidade da Igreja: “À Igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em Cristo Jesus, chamados para ser santos, com todos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso” (1Co 1.2).

Aos romanos, escreve: “A todos os amados de Deus, que estais em Roma, chamados para serdes santos”(Rm 1.7).

          Instruindo os tessalonicenses, Paulo outra vez nos chama a atenção para nossa responsabilidade, mostrando que a eleição para a salvação se efetua na história em santificação: “Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé na verdade”(2Ts 2.13).

          Portanto, devemos usar de todos os meios que Deus nos fornece para o nosso aperfeiçoamento. Por isso, as insistentes recomendações bíblicas para que cresçamos, desenvolvamos a nossa fé. Eis alguns exemplos:

          Aos filipenses que, mesmo sendo uma igreja exemplar em muitos aspectos, tinha algumas rusgas internas, Paulo, após considerar o exemplo de Cristo e a necessidade de segui-lo, instrui: “Desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.12b-13).

          À jovem e perseguida igreja de Tessalônica, roga e exorta:

Finalmente, irmãos, nós vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus que, como de nós recebestes, quanto à maneira por que deveis viver e agradar a Deus, e efetivamente estais fazendo, continueis, progredindo cada vez mais. (1Ts 4.1).

Contudo vos exortamos, irmãos, a progredirdes cada vez mais. (1Ts 4.10).

          Às igrejas perseguidas, Pedro as exorta a desejar intensamente, por graça, crescer espiritualmente: “Desejai ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que por ele vos seja dado crescimento para a salvação” (1Pe 2.2). “Antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pe 3.18).

          Como podemos perceber, estes textos nos falam da importância da nossa atividade em nossa santificação: Deus nos oferece todos os recursos para o nosso crescimento, dá-nos uma nova disposição e requer o uso consciente, responsável e submisso do que Ele nos tem oferecido (Vejam-se: Rm 12.1-3; Gl 5.13-16, 25,26; Hb 12.14; 1Pe 1.13-15; 2Pe 1.3-11).[2]

          Packer (1926-2020) resume: “A palavra [santo] implica tanto devoção quanto assimilação. Devoção no sentido de viver uma vida de serviço a Deus; assimilação, no sentido de imitação, conformidade e serviço da forma como próprio Deus serve”.[3]

          É o Espírito quem nos conduz à conformidade da imagem de Cristo, que é o nosso modelo por excelência, a meta definitiva de todo povo de Deus. “Aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos”(Rm 8.29).

A Palavra é o alimento fundamental que Deus nos oferece para que possamos crescer em nossa fé, permanecendo firmes contra todas as ciladas do maligno, bem como em todas as perseguições.

          Jesus, explicando a Parábola do Semeador, faz uma aplicação: “A que caiu na boa terra são os que, tendo ouvido de bom e reto coração, retêm a palavra; estes frutificam com perseverança”(Lc 8.15).

          Aqui aprendemos que a Palavra de Deus produz frutos de forma perseverante. A vida cristã é produtiva espiritualmente e, também, é resistente em sua fé. A Palavra de Deus foi escrita para nos ensinar a respeito de Deus e, para que, assim, conhecendo-o,  possamos descansar em suas promessas, perseverando em meio às tribulações: “Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a fim de que, pela paciência, e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança”(Rm 15.4).

          Se nós quisermos realmente perseverar firmes em nossa fé, precisamos fazer da Bíblia o nosso alimento cotidiano. Nela temos a palavra perseverante e consoladora de Deus, tendo, também, a resposta para todas as nossas necessidades.

          A nossa perseverança está essencialmente associada à prática da Palavra de Deus. No Apocalipse, o Anjo diz àqueles que suportaram intensa perseguição: “Aqui está a perseverança dos santos, os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus Cristo”(Ap 14.12). (Ver: Ap 13.10).

          Como vimos, Deus nos deu todas as coisas para o nosso crescimento espiritual, sendo, por isso mesmo, nossa responsabilidade nos esforçar, usando desses recursos, para fazer a sua vontade e não tornar vã a sua graça a nós manifesta (1Co 15.10; 2Co 6.1). “Deus nos tem munido com mais de uma espécie de auxílio, desde que não sejamos indolentes em fazer uso do que nos é oferecido”, exorta-nos Calvino.[4]

          Devemos, portanto, associar-nos à graça de Deus no aperfeiçoamento de nossa salvação. Conforme temos enfatizado, é nestes termos que Pedro escreve:

Visto como pelo seu divino poder nos têm sido doadas todas as cousas que conduzem à piedade, pelo conhecimento completo daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude, pelas quais nos têm sido doadas as suas preciosas e mui grandes promessas, para que por elas vos torneis coparticipantes da natureza divina, livrando-vos da corrupção das paixões que há no mundo, por isso mesmo, vós, reunindo toda a vossa diligência (Spoudh/ = “esforço”, “entusiasmo”, “zelo”, “pressa”),[5] associai com a vossa fé a virtude; com a virtude, o conhecimento; com o conhecimento, o domínio próprio; com o domínio próprio, a perseverança; com a perseverança, a piedade; com a piedade, a fraternidade; com a fraternidade, o amor. Porque estas cousas, existindo em vós e em vós aumentando, fazem com que não sejais nem inativos, nem infrutuosos no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo. (2Pe 1.3-8).

          Pedro, por considerar este ponto de extrema relevância, insiste em nossa responsabilidade de assim proceder, agindo com diligência: “Por isso, irmãos, procurai, com diligência (Spouda/zw = “ser zeloso”, “fazer todo o esforço possível”)[6]cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em tempo algum” (2Pe 1.10).

Portanto, podemos perceber que o segredo da vida cristã – a sua segurança -, não está na inatividade, mas, sim, em constante trabalho de desenvolvimento de nossa fé, sabendo que desta maneira jamais tropeçaremos de modo definitivo. Portanto, oração e trabalho obediente é o binômio abençoador e santificador do crente.

Maringá, 01 de julho de 2021. Rev. Hermisten Maia Pereira da Cost


[1] “A santidade precisa ser visível em nossa vida a sós com Deus, na intimidade de nosso lar, na competitividade de nosso trabalho, nas alegrias da amizade e no empenho de nosso culto no dia do Senhor” (Joel R. Beeke; Mark Jones, orgs. Teologia Puritana: Doutrina para a vida, São Paulo: Vida Nova, 2016, p. 755).

[2] “A santificação envolve a concentração do pensamento, do interesse, do coração, mente, vontade e propósito, em direção à soberana vocação de Deus em Cristo Jesus e ao desempenho da totalidade de nosso ser no uso daqueles meios que Deus instituiu com o fim de atingir essa destinação” (John Murray, Redenção: Consumada e Aplicada, São Paulo: Cultura Cristã, 1993, p. 166). Do mesmo modo assevera Packer: “A santidade envolve tanto a fé como o esforço pessoal, de nada adiantando o esforço sem a fé, ou fé sem esforço” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus, São Paulo: Fiel, 1994, p. 163).

[3]J.I. Packer, O que é santidade e por que ela é importante?: In: Bruce H. Wilkinson, ed. ger. Vitória  sobre a Tentação,2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1999, p. 31.

[4]J. Calvino, Efésios, São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 6.11), 188.

[5] Spoudh/ ocorre nos seguintes textos do NT: *Mc 6.25; Lc 1.39; Rm 12.8,11; 2Co 7.11,12; 8.7,8,16; Hb 6.11; 2Pe 1.5; Jd 3.

[6] Spouda/zw ocorre nos seguintes textos do NT: *Gl 2.10; Ef 4.3; 1Ts 2.17; 2Tm 2.15; 4.9, 21; Tt 3.12; Hb 4.11; 2Pe 1.10,15; 3.14.

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